Jacques Villeneuve: de campeão da Indy e F1 a piloto nômade
Jacques Villeneuve é um cara que passou por quase tudo no automobilismo. Não só falando em termos de diferentes carros, mas também de fase e imagem, passando de estrela ascendente e grande campeão da F1, até um rejeitado que saiu perambulando pelo mundo. Muitas vezes é até difícil se lembrar de primeira o que ele já fez de grandioso em sua extensa vida no automobilismo.
Campeão da Indy, incluindo uma vitória nas 500 Milhas de Indianápolis, em 1995, ele chegou à F1 em 96 pela melhor equipe da época, a Williams, e foi vice em sua temporada de estreia e levou o título na segunda. A partir deste momento, entrou em uma espiral sem fim que o levou a se tornar um personagem meio “B”, se valendo do que fez no passado para passear pelas mais diversas categorias do mundo.
Para se ter ideia, desde sua vitória no mundial, há 18 anos, a única vitória do canadense, em qualquer categoria de relativa importância, foi na etapa da Le Mans Series (embrião do atual Mundial de Endurance) de Spa-Francorchamps, pela Peugeot, em 2008.
Seus outros dois momentos de destaque foram o segundo lugar nas 24 Horas de Le Mans, também pela montadora francesa, e um terceiro lugar na Nationwide Series (atual Xfinity), segunda divisão da Nascar, em Road America (Elkhart Lake).
Alguns vão dizer que é natural de todo o esportista entrar em uma descendente em algum momento da carreira, devido à idade e outras questões. Mas é importante dizer que Villeneuve tem hoje apenas 44 anos. Ou seja, quando ele deixou a F1, já sem lugar para correr por não conseguir uma vaga, tinha 36. Seu último brilho na categoria foi aos 31.
Por essa e por outras é que, apesar de todos os títulos importantes conquistados, a imagem de Villeneuve para a maioria é de um sortudo que um dia sentou no melhor carro do mundo. Coincidentemente, seu pai, Gilles, nunca venceu nada importante (tem seis triunfos na F1 e nenhum título no currículo) e é sempre lembrado – muitas vezes de forma exagerada – como um dos grandes da história.
Jacques realmente passou longe de ser um piloto brilhante. Provavelmente, se tivesse que fazer o caminho normal para chegar à F1 e crescer dentro da categoria, não teria sido campeão mundial. Com exceção de um terceiro lugar no GP de Macau de F3 em 1992, nunca teve resultados importantes em categorias de acesso. Mesmo nos Estados Unidos, não passou de um terceiro na F-Atlantic.
Mesmo assim, ele teve alguns momentos marcantes e bem interessantes. Alguns pilotos considerados muito bons nunca conquistaram títulos como profissionais por não saber aproveitar as poucas oportunidades verdadeiras que tiveram. Entre 1994 e 97, durante quatro temporadas, Villeneuve soube fazer isso.
O desempenho na Atlantic em muitas provas, com um estilo bastante arrojado, fez a equipe Forsythe-Green promovê-lo à Indy em 94. Em sua primeira temporada lá, ganhou uma corrida e terminou em segundo nas 500 Milhas de Indianápolis. Nada mau para um estreante.
No ano seguinte, mais experiente, levou o título da categoria, que na época era uma concorrente forte da F1. Logo atrás dele no campeonato ficaram Al Unser Jr, Bobby Rahal e Michael Andretti, três dos quatro campeões das temporadas anteriores. Novamente… nada mau.
Seu sucesso dentro da pista e seu sobrenome de peso chamaram a atenção da Williams para 96. E ele já chegou botando banca. Na estreia, fez a pole position e liderou quase a corrida inteira em Melbourne até que, a cinco voltas do final, teve de tirar o pé por conta de um vazamento de óleo em seu carro, deixando a vitória para o companheiro Damon Hill.
O inglês acabaria com o título daquela temporada, mas também dispensado do time. Assim, Villeneuve se tornaria o piloto número um para 97 da principal equipe da F1. Só que a Ferrari e Michael Schumacher já mostravam em seu segundo ano juntos que o entrosamento dos dois seria de bons frutos, e o alemão deu trabalho. Muito trabalho.
A imagem do ano acabou sendo Schumacher, assim como tinha feito em 94, bater propositalmente em Villeneuve na etapa final, em Jerez, em uma tentativa desesperada de ficar com o título. Só que, ao contrário de Hill em 94, o canadense conseguiu se manter na pista e levou a taça.
É lógico que, pela diferença entre os modelos FW19 e a F310B, o campeonato deveria ter sido muito mais tranquilo. Mas também é sempre bom lembrar que o rival era Schumacher, o maior vencedor de títulos da história, e já um bicampeão.
O problema na carreira de Villeneuve foram as escolhas que ele fez depois. Em 1998, a Williams perdeu Adrian Newey para a McLaren e deixou de ser o grande time que era desde o começo da década, sem carro nem para brigar por vitórias. O canadense ainda subiu no pódio por duas vezes, mas sem qualquer brilho.
Ele foi convencido então por seu empresário, Craig Pollock, e um cheque bastante gordo, a se transferir em 99 para a recém fundada BAR. Teve por dois anos como companheiro o estreante Ricardo Zonta, a quem superou com tranquilidade, e depois dividiu o box com Olivier Panis, nome relativamente respeitado, e que também não conseguiu superá-lo. No entanto, sempre longe de lugares no pódio.
A temporada de 2003 pode ser considerada o momento em que a carreira de Villeneuve definitivamente começou a descambar de vez. Ele já vinha de cinco anos sem frequentar as primeiras posições do grid, e, mesmo assim, seguia exigindo tratamento de campeão. Com Pollock fora da BAR, ele deixou de ter tanta moral e seus resultados passaram a ser questionados. Ainda mais quando o jovem Jenson Button passou por cima dele. Acabou demitido antes da corrida final, no Japão.
A volta aconteceu apenas no final de 2004, para substituir Jarno Trulli na Renault. Em três corridas, não viu nem a cor do companheiro, Fernando Alonso, que ainda era um nome em ascensão.
Villeneuve ainda conseguiu um contrato de dois anos com a Sauber para as temporadas seguintes. Foi batido por Felipe Massa em 2005 e vinha sendo superado de longe por Nick Heidfeld em 2006 quando a BMW, que tinha comprado a equipe, resolveu demiti-lo no meio do campeonato para substituí-lo por Robert Kubica. E foi dessa forma, melancólica, que ele deixou a F1.
Desde então, passou a vagar pelas mais diferentes categorias, como Nascar, GTs, V8 e até mesmo a Stock Car brasileira, embora nunca com um contrato para competir uma temporada completa. Tornou-se um andarilho do automobilismo, experimentando as mais diversas opções que o esporte a motor oferece pelo mundo, sem se comprometer com nenhuma. Ainda tentou, em 2011, inscrever uma equipe com seu nome na F1, mas sem sucesso.
Em 2015, Villeneuve foi anunciado pela equipe Venturi da Fórmula E como piloto regular. Aos 44 anos, ele tentava escrever um novo capítulo de sua carreira para, quem sabe, tirá-la do marasmo que a definhou, e, no final do livro, deixar uma impressão mais próxima do grande campeão que foi no início de tudo. Não deu muito certo. A brincadeira durou apenas duas corridas, com dois resultados fora do top 10.
Ele voltou então a frequentar campeonatos de segundo e terceiro escalão (ou nem isso) como ARX, Porsche Escandinávia, GT Itália e Nascar Europeia, sempre como uma espécie de convidado especial.
De qualquer maneira o legado de Villeneuve é de um piloto que aproveitou bem seu auge, mas talvez em algum momento não soube entender suas limitações para tentar evoluir. Sua carreira na F1 acabou abreviada por decisões ruins, muito por conta do mau aconselhamento de seu empresário, Pollock, e da falta de paciência no relacionamento com as equipes, o que acelerou sua derrocada.
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