Barrichello e Raikkonen no pódio do GP da Itália de 2009
(Foto: Ferrari)

Bagunça de números: Raikkonen iguala recorde de Barrichello na Rússia?

O recorde de participações na F1 deveria ser algo simples, né? O piloto que correu mais vezes na categoria e ponto final. Mas dependendo da interpretação sobre o que é “participar de um GP”, esse número pode variar. Se formos pelo entendimento mais simples possível, se largar no GP da Rússia do próximo domingo (27), Kimi Raikkonen vai igualar o recorde de número de corridas no Mundial, que hoje pertence a Rubens Barrichello.

O brasileiro largou em 322 GPs da F1 e está apenas um na frente do finlandês, hoje piloto da Alfa Romeo. Só que estes números podem ser contestados de diversas formas. Maluco, não? Mas é simplesmente uma questão de interpretação.

Tecnicamente, a forma mais usual levada em conta para estatística é a de largadas. Ou seja, o piloto só soma um GP na F1 para seu currículo no caso de começar uma corrida. Mas existe também o número de “participações”. Ou seja, quando um competidor se inscreve para uma etapa da F1, treina, mas não corre na prova mesmo. Isso acontece por diversos motivos. O mais simples são os casos de concorrentes que não conseguiram se classificar para o grid.

Mas existem também diversas outras situações que impedem um piloto de correr. Uma relativamente usual é quando ele sofre uma falha mecânica antes da largada. No GP da Bélgica de 2020, por exemplo, Carlos Sainz teve um problema antes de alinhar e nem foi ao grid. Estatisticamente, o espanhol não soma esta etapa para seu currículo, mesmo tendo participado de treinos e se classificado. O mesmo aconteceu com Nico Hulkenberg no GP da Grã-Bretanha deste ano, quando ele substituiria Sergio Pérez, mas nem foi ao grid quando não conseguiu fazer sua Racing Point pegar ainda no box.

Números de Raikkonen e Barrichello

Levando em conta casos além da simples largada, as estatísticas tanto de Raikkonen como de Barrichello podem mudar. E mais, dependendo da interpretação, podemos entrar em uma área cinzenta aqui que é difícil definir qual o número real de participação dos dois pilotos.

Como já citamos, Barrichello tem 322 largadas em seu currículo. Porém, esse número pode ser questionado. Ele participou de mais três finais de semana de GP em que não largou e teve ainda uma prova em que chegou a largar, mas teve sua participação na corrida anulada. Calma. Vamos explicar.

As corridas da carreira de Barrichello que ficam fora de sua estatística são o GP de San Marino de 1994, GP da Bélgica de 1998, GP da Espanha e da França de 2002. No primeiro, ele sofreu um forte acidente na primeira sessão classificatória (na época aconteciam duas), na sexta-feira, após andar nos dois treinos livres do evento. O brasileiro chegou a ser hospitalizado e não participou do restante do final de semana. Por isso, tecnicamente, ele nem se classificou para a corrida.

O GP da Bélgica de 1998 é o mais questionável de ficar fora da lista de corridas de Barrichello. O piloto, na verdade, largou. Só que naquela etapa aconteceu o famoso acidente que envolveu 13 carros logo na primeira volta, em que ele também ficou no meio. A corrida foi paralisada com bandeira vermelha para uma nova largada. Pelo regulamento da época, quando a prova sofria interrupção com menos de duas voltas, a largada era anulada e a corrida só passaria a valer a partir da segunda partida. Barrichello, com uma pequena lesão, não relargou e, por isso, ele não é considerado como um integrante daquela corrida.  

Mas é difícil entender como um piloto que inclusive se envolveu em um acidente na corrida não pode considerar esse GP em sua carreira, não? Por isso, esta é uma prova que poderia, dependendo da interpretação, elevar a estatística de Barrichello para 323 etapas facilmente.

Nas duas etapas de 2002 que ficam fora da contagem do brasileiro, ele sofreu problemas com sua Ferrari ainda no grid, antes de partir para a volta de aquecimento. Por isso, mesmo tendo participado de treinos e classificação, ele não largou para as provas.

Kimi Raikkonen também tem três eventos que ele pode reclamar de não estarem em sua lista (não que ele ligue muito para isso). O primeiro deles, para nós do Projeto Motor, é o mais questionável, assim como o GP da Bélgica de 1998 para Barrichello. E coincidentemente também aconteceu em Spa.

Raikkonen largou para a corrida e completou as quatro primeiras voltas. Foi então que Luciano Burti sofreu um gravíssimo acidente na curva Blanchimont, batendo na barreira de pneus a cerca de 240 km/h. A corrida foi interrompida com bandeira vermelha e uma nova largada foi realizada algum tempo depois. Pelo regulamento da época, apesar das posições da segunda largada serem organizadas por como a corrida estava antes da interrupção, incrivelmente as primeiras voltas eram consideradas nulas pela FIA.

Raikkonen teve um problema na transmissão de sua Sauber e nem alinhou no grid para a segunda largada. Assim, como para a FIA o GP da Bélgica é considerado apenas a partir desta segunda partida, ele teoricamente não largou para a corrida. Mas se seguirmos a interpretação que poderia considerar a etapa de 98 em Spa para Barrichello, esta também poderia elevar a estatística de Kimi para 322, mantendo a desvantagem em apenas uma prova.

Os outros dois GPs que o finlandês perdeu também são casos de “não-largada”. O polêmico GP dos Estados Unidos de 2005, em que todos os carros com os pneus Michelin deixaram a prova ao final da volta de aquecimento por conta dos problemas de segurança dos compostos em Indianápolis é um deles. Raikkonen era da McLaren, que recebia o produto da marca francesa. Apenas seis carros com compostos da Bridgestone largaram de verdade.

A outra prova que Raikkonen ficou fora foi o GP da Malásia de 2017, em que a Ferrari do Homem de Gelo sofreu um problema na unidade de potência ainda no grid, e ele não partiu para a prova.

Resumo da bagunça

Colocando todos esses cenários da mesa, Barrichello tem 322 largadas oficiais e Raikkonen 321. Os dois têm pelo menos um caso que podem dizer que largaram para a prova, apesar do trecho que participaram da corrida ter sido anulado. Sendo assim, ambos poderiam subir para 323 e 322 GPs. Além disso, Barrichello tem mais três eventos no currículo, apesar de não ter participado da corrida em si em nenhum deles, e Raikkonen tem mais dois.  

Com tudo isso em mãos, podemos dizer com alguma segurança que sim, Raikkonen iguala o recorde de corridas de Barrichello na prova de Sochi de 2020, apesar de o número exato ficar sob necessidade de interpretação (322 ou 323 para cada). Caso resolva-se contar também a simples participação em treinos e classificação, o finlandês ainda precisaria de mais uma etapa para chegar no brasileiro.

O recorde de Barrichello, de qualquer maneira, será batido, já que Raikkonen (a não ser que tenha algum problema que o impeça de seguir pelo restante da temporada) deve chegar até o final do ano a pelo menos 328 GPs.

Depois dos dois, considerando apenas largadas oficiais, Fernando Alonso é o terceiro da estatística com 311 provas. Caso Raikkonen se aposente ao final desta temporada de 2020 (ele ainda não confirmou se continua e seu contrato com a Alfa Romeo chega ao fim), o espanhol tem tudo para se tornar o novo dono do recorde em breve, já que assinou um contrato de dois anos com a Renault, futura Alpine. Considerando que a F1 espera fazer entre 21 e 22 corridas em cada um dos próximos campeonatos, Alonso, se cumprir o acordo, deve chegar a pelo menos a 353 provas na carreira.

Dos pilotos que ainda estão no grid, Lewis Hamilton é o seguinte, na sétima posição geral, atrás ainda de Michael Schumacher, Jenson Button e Felipe Massa, com 259 largadas. Mas aí ainda é difícil saber se ele pode chegar ou não ao primeiro lugar, pois vai depender do tempo de Alonso e dele mesmo na F1 nos próximos anos. Tirando que ele está de olho em recordes potencialmente mais interessantes nas próximas semanas, de vitórias e títulos de Schumacher. Mas isso fica para outro texto.

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