Ron Tauranac: o projetista de Brabham e dos F3 de Piquet e Senna
No último 17 de julho, morreu, aos 95 anos, Ron Tauranac. Inglês radicado na Austrália (se mudou com a família aos 3 anos) que ficou bastante conhecido por ter fundado ao lado de Jack Brabham a Motor Racing Developments, empresa que fabricaria carros de corrida de várias categorias de monopostos, inclusive na F1.
Juntos, com Tauranac nas pranchetas e administração da empresa e Brabham chefiando a operação comercial e colocando seu talento ao volante (com um papel fundamental de desenvolvimento de pista), eles ganharam os títulos de construtores e pilotos de 1966 e 67 pela equipe Brabham. O próprio Brabham levou a taça no ano da primeira conquista, se tornando o primeiro e único campeão com o próprio time, enquanto Denny Hulme levou no segundo, superando o patrão.
src=”https://pagead2.googlesyndication.com/pagead/js/adsbygoogle.js”>A Brabham se tornaria quase que um sinônimo de inovação no automobilismo, mesmo depois da saída de Brabham e Tauranac do comando. O piloto vendeu ao sócio sua participação na companhia ao final de 1969, e este venderia tudo para Bernie Ecclestone em 1972. O empresário inglês manteria a tradição do time na área de engenharia, principalmente com Gordon Murray como projetista.
Só que história de Tauranac não iria parar por aí. Após sua saída da Brabham, de uma forma meio melancólica com Ecclestone simplesmente o demitindo após um tempo, ele trabalhou como consultor para alguns nomes ascendentes como Frank Williams e Guy Ligier. O engenheiro chegou a negociar com a Lotus, mas a conversa não avançou e depois ainda participou do projeto da Trojan para 1974.
Tudo meio que sempre trabalhando em casa. Não era muito o estilo dele. Então, Tauranac resolveu retomar as atividades de uma forma mais direta ao reviver um antigo nome do início de sua carreira: a Ralt.
A máquina de campeonatos de Tauranac
“A Ralt teve muito mais sucesso do que a Brabham como empresa. Mas como não corremos na F1, não tivemos a publicidade”, sentenciou Tauranac em uma entrevista à revista inglesa Motorsport, em 2014.
A Brabham, através de seu braço construtor Motor Racing Developments (MRD), fez carros campeões também na F2 (especialmente com o modelo BT18 equipado com motores da Honda), F3 e teve até mesmo algum sucesso com esportivos em provas de nível nacional na Inglaterra, com o BT17, apesar de Tauranac não ser muito fã do estilo.
A carreira de Tauranac como construtor começou quando ele ainda era muito jovem. Após o primeiro contato com carros de corrida na Austrália através de amigos, ele viu um MG à venda, mas não tinha dinheiro para comprar. “Se não tinha as £500, pensei então em construir um carro”. E assim nasceu sua primeira empreitada no automobilismo.
Tauranac já tinha alguma experiência em empresas de engenharia e com modelagem de metais. Ele e o irmão, Austin Lewis, começaram a montar alguns carros para competições de subida de montanha com motores de motos Norton de 500cc, usando a nomenclatura Ralt Special. A marca era uma fusão do nome deles (“R” de “Ron”, “al” de “Austin Lewis” e o “T” de “Tauranac”). Foi nesta época, em algumas destas provas, que ele conheceu Jack Brabham. Os dois nunca mais perderam contato até que o piloto convenceu Ron a ir para a Europa para ajudá-lo a construir carros de corrida.
Ao fim do projeto, Tauranac foi aos poucos, entre os serviços de consultoria para desenvolvimento de chassis, amadurecendo a ideia de retomar a Ralt, agora na Inglaterra e em alto nível. E o projeto começou a andar ainda em 1975.
No geral, ele manteve seu foco em categorias de base, principalmente na F3 Inglesa, no europeu de F2, F-Atlantic e até na F3000 Internacional nos anos 80. E o sucesso foi enorme. Com seus carros, Tauranac encheu sua garagem de troféus vendendo chassis extremamente competitivos paras equipes destas competições.
Na F3, venceram campeonatos com Ralts pilotos como Derek Warwick, Nelson Piquet, Chico Serra, Ayrton Senna e Maurício Gugelmin. Na F2, foram outros três títulos durante a década de 80, com motores Honda, revivendo a parceria dos tempos de Brabham na categoria. Isso sem contar campeonatos como construtor em séries menores.
Um de seus principais trunfos era seu árduo trabalho na questão aerodinâmica. O projetista sempre teve muito interesse, desde os anos 60, em aprimorar detalhes do carro, inclusive utilizando o túnel de vento sempre que tinha acesso e cada vez mais.
No meio do caminho, em 1977, Tauranac recebeu a encomenda do empresário Teddy Yip para projetar um carro de F1 para sua equipe, a Theodore. Assim, nasceu o TR1, modelo com diversos problemas, sem o desenvolvimento necessário, e em que sete tentativas conseguiu se classificar para apenas um GP da temporada de 78, com Keke Rosberg, mas abandonou com problema no motor Cosworth.
De qualquer maneira, a Ralt se tornou bastante rentável, vendendo cerca de 80 carros de corrida por ano. Só que na metade dos anos 80, concorrentes cresceram e novas empresas começaram a surgir com força no mercado. As categorias se tornaram cada vez mais restritas na aerodinâmica (algumas passaram a adotar a fórmula monomarca) e o interesse de Tauranac pelo negócio caiu. Quando ele recebeu uma proposta de compra pela March, em 1988, ele não pensou muito em passar sua companhia para frente.
E mesmo sob a administração dos novos donos, os chassis desenvolvidos por ele, que seguiram com o nome de Ralt, conquistaram mais títulos, incluindo uma sequência na F3 Inglesa com David Brabham (filho de Jack Brabham), Mika Hakkinen e o último campeonato com Rubens Barrichello, em 1991.
Consultorias pós-Ralt
Tauranac sempre foi visto como o típico workaholic. Alguns relatos o mostram até como um ser meio que antissocial. Ele falava pouco e gostava de fazer as coisas de seu jeito. Não era uma pessoa de jogar muita conversa fora. E o que ele gostava mesmo era de trabalhar com carros de corrida.
Depois da venda da Ralt, ele não podia simplesmente se afastar. Assim, ele reatou seus contatos com a Honda e projetou um monoposto para escola de pilotagem da montadora sediada em Suzuka, no Japão.
Em 1997, ele fez um breve – mas muito importante – retorno à F1 ao fazer um rápido trabalho de consultoria para a Arrows, a pedido do dono da equipe, Tom Walkinshaw. O time, que tinha o campeão da temporada anterior, Damon Hill, como um dos pilotos, estava com dificuldades em evoluir seu modelo A18. “Eu olhei e disse a eles o que fazer com a circulação de óleo. Consertei algumas coisas e Damon Hill deveria ter vencido a corrida seguinte [no GP da Hungria]”, contou Tauranac à Motorsport.
Naquela corrida, Hill liderou 62 das 77 voltas e perdeu a ponta na última volta para Jacques Villeneuve após uma falha na conexão do pedal do acelerador por conta da quebra de uma arruela. Mesmo assim, o inglês terminou em segundo e conquistou o único pódio da Arrows na temporada.
Em 2001, após a morte de sua esposa, Tauranac resolveu voltar para a Austrália após décadas morando na Europa. Ele chegou a prestar mais uma rápida consultoria para uma equipe da Supercars australiana [na época, a V8]. No ano seguinte, ele foi condecorado com a Ordem da Austrália pelas suas realizações, uma premiação real.
Ele seguiu morando no país onde cresceu, se afastando aos poucos do automobilismo, mas nunca perdendo o interesse em acompanhar o que existia de novo nas competições, sua grande paixão.
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