
O dramático acidente de Piquet na Indy 500 de 1992
Em maio de 1992, Nelson Piquet sofreu o acidente mais grave de sua carreira nas pistas. Pouco depois de deixar a F1, o tricampeão buscou se aventurar nas 500 Milhas de Indianápolis, mas o sonho terminou de forma cruel no muro da Curva 4.
A recuperação foi longa e sofrida, mas Piquet conseguiu transformar a dor em uma das maiores voltas por cima que o automobilismo já viu.
Quando chegou a Indianápolis, Piquet tinha deixado a F1 havia pouco tempo. Em 1991, o tricampeão se desentendeu com a Benetton, especialmente por sua insatisfação com a performance dos motores da Ford, e o fato de a equipe ter dispensado seu amigo Roberto Moreno para trazer Michael Schumacher.
Assim, a equipe se adiantou e contratou Martin Brundle para seu lugar em 92, e Piquet tentou buscar outros caminhos para continuar sua carreira na F1. Houve conversas e reuniões com Ferrari e Ligier, mas nada foi para frente.
Então, sem ainda fechar as portas de vez para a F1, Piquet se dedicou em 92 aos seus negócios no Brasil, e até a uma nova equipe que montou na F3000. Porém, a chance de competir em uma prova de alto nível surgiu quando o brasileiro quando foi contactado pelo bilionário John Menard Jr, dono da equipe Menard na Indy.
Na conversa, foi feito um convite para Piquet participar das 500 Milhas de Indianápolis em um de seus carros, o que aconteceria no mês de maio.
No começo dos anos 90, a Indy já era uma categoria consolidada, e contava em seu grid com pilotos de forte reputação no automobilismo. Mesmo assim, Piquet nunca havia mostrado interesse em competir nos Estados Unidos – pelo contrário, ele até tinha dito anteriormente que achava a categoria defasada, e que só correria lá “se estivesse precisando de dinheiro”.
Isso mudou com o convite da Menard, que era uma equipe que apenas competia nas 500 Milhas de Indianápolis. Intrigado com a proposta, Piquet pediu a opinião de Eddie Cheever, seu amigo e ex-colega de F1, e que também competia na Indy na época. Era o que faltava para o tricampeão embarcar no plano.
Piquet foi confirmado no carro de número #27, e teria como parceiro o veterano Gary Bettenhausen, que também serviu como um mentor para o brasileiro na adaptação aos circuitos ovais.
Piquet, mesmo sendo consagrado na F1, participou de todo o processo de iniciação para novatos em ovais, e sua adaptação vinha sendo positiva, com melhora constante de performance e se sentindo cada vez mais confortável.
A acidente de Piquet
Depois do início promissor, tudo mudou no sexto dia de treinos livres, dois dias antes do Pole Day. Às 15h35 pelo horário local, Piquet tinha a quarta melhor marca do dia, quando perdeu o controle de seu carro na Curva 4.
A sua Menard chegou a dar uma rodada completa até bater de frente no muro, a estimados 340 km/h, o que destruiu toda a porção dianteira do chassi. Na hora, já dava para saber que havia sido um acidente grave.
O carro ainda se arrastou por 9s até parar de vez, perto da entrada dos boxes. O brasileiro ficou consciente após a batida, mas se queixava muito de dores nas pernas. Ele só conseguiu ser retirado do carro cerca de 12 minutos depois da chegada do socorro médico, e foi levado ao Hospital Metodista de Indianápolis.
Lá, foi confirmado que Piquet teve uma concussão cerebral, mas que o quadro que mais gerava preocupação foram as fraturas múltiplas e expostas em ambas as pernas, o que até chegou a pulverizar alguns ossos.
Piquet passou por uma cirurgia, que durou cerca de 6h30 para reparar as lesões nos membros inferiores e para praticamente reconstruir o seu pé esquerdo, que chegou a ter risco de amputação. A operação foi tão longa que até houve tempo de o então presidente do Brasil, Fernando Collor de Mello, telefonar para os médicos para perguntar sobre o estado de Piquet.
Nos dias seguintes, vieram mais cirurgias plásticas e novos enxertos, além da garantia de que os ferimentos estavam limpos e sem infecções. E no meio de todo este drama, Piquet foi pai mais uma vez, já que sua filha Julia nasceu cerca de 12 horas depois do acidente.
Enquanto Piquet se recuperava, uma dúvida ficava na cabeça de quem estava em Indianápolis: o que havia provocado o acidente? Muitas hipóteses foram consideradas – como a de que Piquet perdeu parte de seu aerofólio traseiro antes do impacto, ou a possível interferência de um detrito que estava na pista, que o brasileiro passou por cima instantes antes de bater.
O que se viu na telemetria foi que Piquet tirou o pé do acelerador na tangência da curva, e logo depois seu carro escapou de traseira. Aliás, para se ter uma ideia, aquele foi um mês bastante acidentado e perigoso em Indianápolis.
Por exemplo, o tetracampeão da prova Rick Mears havia passado por um susto um dia antes de Piquet, enquanto que, no dia 15 de maio, o estreante filipino Jovy Marcelo morreu depois de bater forte na Curva 1.
Recuperação e a volta
Piquet só receberia alta do hospital no dia 1º de junho, quase quatro semanas após o acidente. Mas a recuperação ainda seria longa. Ele se dedicaria exclusivamente aos exercícios de fisioterapia, sendo que também teve de lutar contra a dependência dos medicamentos que tomava para a dor, o que chegou a lhe causar crises de abstinência.
Por muito tempo, Piquet precisou andar com o auxílio de muletas. O acidente deixou sequelas que ele teria de carregar para sempre – por exemplo, seus pés ficaram com tamanhos diferentes.
Mesmo assim, Piquet tentava manter o bom humor. Sobre o fato de ter perdido a ponta de um dedo do pé direito, disse que não seria grande problema, pois seria “uma unha a menos para cortar”. Ele também fez piada quando recebeu a visita de seu ex-parceiro de Benetton, Alessandro Nannini, cuja carreira na F1 foi encerrada depois de lesões na mão em um acidente de helicóptero.
No entanto, Piquet também recebeu apoio de seu desafeto Ayrton Senna, que lhe deixou uma mensagem dizendo que “no final, tudo estará bem”.
Inicialmente, Piquet afirmava que o acidente representou o fim de sua trajetória no automobilismo, já que ele não pretendia entrar de novo em um carro de corrida “nem para tirar fotos”. Mas isso mudou na medida em que o piloto foi se recuperando, e o sonho de competir no templo de Indianápolis continuou forte em sua mente.
Um ano mais tarde, Piquet voltou a se inscrever nas 500 Milhas pela equipe Menard. Ele foi o piloto do time mais bem classificado no grid para a prova, na 13ª posição entre os 33 que largaram.
Mas na corrida, ele teve que abandonar por uma quebra de motor. O resultado pouco importou, já que se tratava de um dos retornos mais impressionantes que o automobilismo já viu.
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