Foto: BMW

A história do Williams FW26, o carro de bico inusitado da F1 em 2004

O carro da Williams para a temporada de 2004 ficou marcado na memória dos fãs devido ao desenho inusitado de seu bico. O modelo FW26 propôs uma alternativa diferente em sua porção dianteira, o que intrigou a F1 não apenas por sua estética, mas também sobre a sua possível eficácia – especialmente em uma categoria que já não via com tanta frequência soluções tão diferentes do convencional.

Mas como foi a sua história e o quão bem ele funcionou na prática?

Antes de detalharmos, vamos a um contexto geral. A Williams vinha embalada por um forte rendimento na temporada de 2003. A equipe, que na época ainda mantinha parceria técnica com a BMW, havia vencido quatro corridas no ano (duas com Juan Pablo Montoya e duas com Ralf Schumacher), e teve o colombiano como um forte candidato ao título.

No entanto, por mais que o cenário fosse promissor dentro da pista, fora dela o clima não era dos mais estáveis. Montoya já havia anunciado, ainda no fim de 2003, que iria para a McLaren em 2005, enquanto que a relação de Ralf Schumacher com a Williams também não estava das melhores. Ou seja, a Williams iniciou a campanha de 2004 tendo de, potencialmente, correr atrás de dois novos pilotos para 2005 (o que acabou de fato acontecendo).

Williams com planos ambiciosos

Mesmo assim, a Williams tinha planos ambiciosos para 2004, e isso foi visto durante o lançamento do FW26. O bico do modelo era bem diferente do convencional, com o nariz mais curto e largo, e duas aletas de suporte prolongadas, bastante distantes entre si. Isso até gerou o apelido de “bico de morsa”, ou “batmóvel” pelo público brasileiro.

A concepção do carro teve supervisão do diretor técnico, Patrick Head, e do designer chefe, Gavin Fisher. A ideia do bico em si veio da aerodinamicista chefe, Antonia Terzi, italiana que anteriormente havia trabalhado sob a batuta de Rory Byrne na Ferrari. Frank Williams deixou claro que seu objetivo com o FW26 era “roubar a coroa da Ferrari”, já que a equipe italiana havia vencido os quatro títulos anteriores com Michael Schumacher.

Mas por que o bico era desse jeito e quais resultados práticos a Williams esperava obter? Como explicou Patrick Head, a motivação era muito além da estética. Com o nariz mais curto, o objetivo era dar “mais liberdade ao fluxo de ar” – ou seja, mais ar poderia passar pelo carro, sobretudo na parte de baixo, o que em tese ajudaria a maximizar o funcionamento de todos os componentes aerodinâmicos. Além disso, a Williams esperava que o bico menor ajudaria a melhorar a relação entre arrasto nas retas e pressão aerodinâmica nas curvas, que sempre é um dilema na F1. 

Do começo promissor ao choque de realidade

Durante os testes de pré-temporada, o FW26 até que mostrou certa velocidade e pôde rodar mais de 16 mil km. Porém, o sinal de alerta foi dado quando a Ferrari começou a mostrar o jogo com a velocíssima F2004, que se apresentava muito acima dos demais. Outro assunto de destaque foi a surpreendente BAR, que encontrou muito ritmo ao trocar os pneus Bridgestone pelos Michelin. 

Foto: BMW

E, de fato, a realidade foi um duro balde de água fria. Quando a temporada começou, a Ferrari massacrou com Schumacher, emendou vitórias, e desde cedo deixava claro que um novo título para Maranello era mera questão de tempo. Já a Williams sofria até para se manter como a rival mais próxima, já que ela tinha concorrência de BAR e Renault na luta por posições do pódio.

Na fase inicial do campeonato, a Williams subiu no pódio apenas duas vezes, ambas com Montoya, em Sepang e Imola. Um outro ponto alto se deu no Canadá, quando Ralf Schumacher fez a pole e cruzou a linha de chegada em segundo, mas acabou desclassificado devido a uma irregularidade nos dutos de freio. O alemão, aliás, protagonizou um susto em Indianápolis, quando sofreu um acidente causado por um furo de pneu, o que lhe rendeu fraturas nas vértebras e obrigou a Williams a recorrer aos pilotos de testes, Marc Gené e Antonio Pizzonia. 

Chegou a hora de mudar

A partir do GP da Hungria, o FW26 passou a usar um bico mais convencional (Foto: BMW)

Pouco a pouco, a Williams entendeu a sua nova realidade e realizou mudanças internas. Sam Michael foi promovido ao cargo de diretor técnico, substituindo Patrick Head, e a equipe também inaugurou um novo túnel de vento. Mas uma outra mudança também se tornava inevitável: o desenho do bico do FW26. As corridas mostraram que, na prática, o design não rendeu as melhorias que eram esperadas em teoria. O carro se mostrou difícil de ajustar, sendo que o bico, para ser aprovado em todos os testes de impacto, precisou ser mais pesado do que o ideal, o que também afetou o equilíbrio do carro como um todo.

Então, no GP da Hungria, a 13ª etapa do campeonato, o FW26 passou a usar um bico mais convencional. Contudo, já era tarde demais para mudar muita coisa. Alguns pontos altos foram a participação de Montoya na pré-classificação de Monza, que foi àquela altura a volta mais rápida da história da F1 em velocidade média, e os pódios nas duas corridas finais do ano, incluindo uma vitória do mesmo Montoya em Interlagos. Ao fim de um ano cheio de expectativas, a Williams ficou apenas em quarto entre os construtores, sendo que Montoya e Ralf Schumacher foram, respectivamente, quinto e nono entre os pilotos. 

De uma forma geral, 2004 teve um significado para a Williams que foi muito além de seu carro com bico diferente. Com novas forças surgindo, como BAR e Renault, além das concorrentes habituais em Ferrari e McLaren, a Williams não tinha presença tão forte no pelotão da frente, o que deteriorou a sua relação com a BMW. Antonia Terzi, a aerodinamicista por trás do design marcante, deixou a Williams ao fim de 2004, e se afastou da F1 como um todo depois disso. A italiana faleceu em outubro de 2021, vítima de um acidente de carro.

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