Lewis Hamilton: de promessa do kart a recordista da F1
Não há muito tempo, tanto o recorde de 91 vitórias como o de sete títulos de Michael Schumacher pareciam inalcançáveis. Curiosamente, no mesmo ano em que o alemão se aposentava – pelo menos a primeira vez -, em 2006, um jovem talento que viria a ser quem quebraria essas marcas estava fazendo a transição das categorias de base para F1: Lewis Hamilton.
Neste domingo (15), o inglês venceu o GP da Turquia com uma grande atuação na pista molhada de Istambul e garantiu o seu sétimo título mundial, igualando Schumacher. O triunfo foi seu 94º na F1, o que já lhe deixa como líder isolado no quesito. Hamilton também já tem o recorde de pole positions (97), lugares no pódio (163), corridas na zona de pontuação (227) e corridas lideradas (161). Ou seja, um currículo e tanto.
Mas Hamilton não surgiu do nada. Desde seus tempos no kart, ainda criança, ele já era visto como uma grande promessa. E mesmo nesta época, ele também mostrava uma bela dose de ousadia dentro e fora das pistas. Aos 10 anos, em uma cerimônia de premiações do automobilismo britânico, ele abordou Ron Dennis, então chefe da McLaren, a princípio para pedir um autógrafo. Quando sentiu abertura do dirigente, ele emendou e pediu o número de telefone de Dennis dizendo que iria correr pela McLaren um dia.
De forma descontraída, Ron Dennis não só deu seu telefone como escreveu no papel para Hamilton ligar em nove anos para fazerem negócio. Mal sabia que não levaria tanto tempo para ele mesmo procurar o jovem piloto. Apenas três anos depois, em 1998, com Hamilton se tornando um dos grandes nomes do kart europeu, ele assinou contrato tanto com a McLaren como com a Mercedes para entrar no programa de formação das duas marcas.
A estreia no automobilismo aconteceria em 2002, na Fórmula Renault Britânica, em que Hamilton terminou em terceiro. E depois disso, foi só ladeira acima com o título da mesma categoria em 2003, da F3 Europeia e do Master de 2005 e da GP2, que na época ocupava o status da atual F2, de 2006.
Para 2007, a McLaren estava passando por uma grande reformulação. Juan Pablo Montoya tinha sido demitido durante a temporada anterior e Kimi Raikkonen resolveu deixar a equipe para se transferir para a Ferrari. O time apostou então na contratação de Fernando Alonso, campeão das duas temporadas anteriores, para ser o grande líder da organização, e colocou o novato Hamilton ao seu lado para um período de desenvolvimento e amadurecimento. Mas a história acabou não sendo bem assim…
A estreia meteórica de Hamilton na F1
O começo de Hamilton na F1 foi avassalador. Ele de cara mostrou uma incrível consistência com nove pódios consecutivos. Na quarta etapa, ele já era o líder do campeonato pela primeira vez e na sexta, conquistou sua primeira vitória, no GP do Canadá, em Montreal.
Com o passar do ano, a temperatura interna na McLaren esquentou, ainda mais com a explosão do Spygate. Equipe e Alonso racharam de vez, o que causou entreveros e começou a custar atenção do time. Isso deu oportunidade para Kimi Raikkonen se recuperar no segundo semestre e conseguir uma grande virada para se sagrar campeão da temporada pela Ferrari na corrida final, em Interlagos.
Hamilton cometeu também alguns vacilos, mostrando ainda certa imaturidade, como no GP da China em que ele atolou na caixa de brita da entrada dos boxes (situação lembrada por ele ao final do GP da Turquia como lição aprendida) e no erro numa freada na primeira volta do decisivo GP do Brasil, o que, seguido por uma falha no câmbio, o jogou para o final do pelotão e lhe deixou fora da faixa de pontos que ele precisava para vender o campeonato.
Mesmo derrotado na luta pelo título, o saldo da primeira temporada na F1 foi positivo para Hamilton. Ele conseguiu terminar com o vice-campeonato apenas um ponto atrás do campeão, Raikkonen, e empatado em pontos com o então bicampeão Alonso (à frente do critério de desempate).
Com tantas brigas e sem clima para permanecer, o espanhol sairia da equipe, de volta à Renault, e Hamilton se tornaria a prioridade número um dentro da McLaren.
O dramático primeiro título
Com o clima interno na McLaren apaziguado, Heikki Kovalainen como companheiro que não lhe colocava pressão, e uma temporada de experiência nas costas, Hamilton voltou a lutar pelo título em 2008. A briga foi com os dois pilotos da Ferrari, sendo que desta vez Felipe Massa foi o principal concorrente na fase final.
Foi um ano de altos e baixos tanto para Hamilton como para a McLaren, mas a conquista do título parecia encaminhada ao final da penúltima etapa, na China, de onde o inglês saiu com sete pontos de vantagem para Massa, em uma época em que o vencedor marcava 10.
Só que por conta de uma chuva inesperada nas últimas cinco voltas da prova em Interlagos, a decisão se tornou uma das mais emocionantes e dramáticas da história da F1, com Hamilton conseguindo a ultrapassagem decisiva para conquistar os pontos que precisava apenas na última curva da prova final. Aos 23 anos e 9 meses, Hamilton se tornava o campeão mais jovem da história da F1, batendo Massa por apenas um ponto.
Altos e Baixos e seca de títulos
Nas temporadas seguintes, Hamilton continuou um dos principais pilotos da F1, com vitórias em todas os anos. Porém, um novo título, por diversos motivos, não veio. Em 2009, a McLaren demorou para tirar um bom desempenho do carro sob novo regulamento. Em 2010, o inglês cometeu erros capitais em Monza e Singapura e apesar de ter chegado na etapa final, em Abu Dhabi, com chances matemáticas, acabou vendo Vettel bater seu recorde de campeão mais jovem.
Em 11, Red Bull e Vettel conquistaram mais uma vez o título, agora de forma mais tranquila e dominante. E em 12, foi a vez da McLaren cometer uma série de erros nos pits e nas estratégias, que custaram a Hamilton uma chance melhor pelo campeonato.
Foi neste momento em que o Hamilton decidiu que era hora de uma mudança. Ele abordou a Red Bull para tentar cavar uma vaga para 2013, mas a equipe austríaca, nas palavras de seu chefe Christian Horner anos depois, sentiu que não poderia acomodar o inglês e Vettel dentro do mesmo time.
Assim, sobrou para Hamilton apostar na Mercedes, que tinha voltado com equipe própria na F1 em 2010 e tinha vencido apenas uma corrida até então, com Nico Rosberg, em 2012. E a mudança não poderia ter dado mais certo.
Domínio e rivalidade com Rosberg na Mercedes
Após uma temporada de transição em 13, em que a Mercedes venceu mais três corridas, duas com Rosberg e uma com Hamilton, a equipe alemã se tornou dominante na F1 a partir de 2014 com a introdução do novo regulamento de unidade de potência híbrida.
A briga pelo título nos três anos seguintes ficou limitada a Hamilton e Rosberg, que até então tinham um bom relacionamento, vindo de uma amizade desde os tempos de kart, mas que se enervaria com o tempo.
Em 2014 e 15, Hamilton subjugou o companheiro. Em 2016, no entanto, o alemão conseguiu dar o troco e ficar com o título, em uma temporada que contou com duas batidas entre eles, no GP da Espanha e da Áustria, e reclamações de Hamilton por conta de algumas quebras de motor em seu carro, especialmente quando liderava no GP da Malásia.
Rosberg então decidiu se aposentar dias depois da conquista e Hamilton deixaria de ter que lidar com o agora rival.
Hamilton dominante alcança novo nível
Em 2017, a F1 passou por uma alteração considerável de regulamento de chassi, esperando que alguma equipe pudesse voltar a desafiar a Mercedes. A Ferrari mostrou uma boa evolução e Sebastian Vettel até chegou a liderar o campeonato após um bom início de temporada. Mas Hamilton reagiu na segunda metade do ano e levou mais uma vez o título, aproveitando-se de alguns problemas de confiabilidade do carro do adversário.
Em 2018, a disputa parecia muito mais equilibrada, com a Ferrari mostrando um carro que andava mais próximo da Mercedes e em alguns momentos até melhor. Mais uma vez, Vettel começou melhor a temporada, mas a segunda metade do campeonato marcou provavelmente um dos melhores momentos da carreira de Hamilton ao mesmo tempo que o alemão teve um dos seus piores.
Em uma sequência incrível de grandes atuações do inglês como nos GPs da Alemanha, Itália e Singapura, combinada com erros cruciais do alemão, Hamilton conseguiu o seu pentacampeonato com duas corridas de antecipação, no México.
Em 2019 e agora em 20, a Mercedes voltou a dominar a F1 com certa margem, e Hamilton teve tranquilidade para bater seu companheiro, Valtteri Bottas, para levar mais dois títulos.
Ao responder após a vitória na Turquia se ele pensavam em parar, a resposta não poderia ter sido mais ameaçadora para os adversários: “Sinto que estou apenas começando. Parece esquisito. Sinto que estou fisicamente em ótima forma”, soltou. Mais recordes no horizonte?
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