Murray Walker se tornou com o tempo um ícone das narrações da F1

Como Murray Walker se tornou a voz da F1 na Inglaterra

No último sábado (13/03), o mundo do automobilismo se despediu de Murray Walker, narrador icônico das transmissões no Reino Unido. Ele tinha 97 anos e a família não divulgou a causa da morte.

Para os brasileiros talvez seja difícil talvez entender o motivo de tantas homenagens a Walker, não só nos diversos veículos de comunicação, publicações de pilotos e dirigentes do esporte a motor nas redes sociais, e da própria F1, que o lembrou em seus painéis de led no circuito de Sakhir, no último final de semana. Mas é importante destacar que, assim como provavelmente Galvão Bueno se tornou pelas décadas a voz mais marcante das transmissões para o Brasil, Walker teve uma relação até maior para os britânicos. E considere ainda o peso da Inglaterra para a F1, como casa das principais equipes, administração e história.

Para se ter ideia, a primeira transmissão na BBC de Walker, no rádio, foi no GP da Grã-Bretanha de 1949, ainda no rádio, um ano antes da F1 sequer nascer como campeonato. Ele seguiu cobrindo diversos eventos como subidas de montanha, categorias locais, motociclismo e rallycross, até se tornar o narrador principal da BBC na F1 em tempo integral a partir de 1978.

Em 1980, ele passou a fazer uma curiosa dupla com o ex-piloto James Hunt. Os dois não poderiam ser mais diferentes. Enquanto Walker era extremamente polido, sempre evitando críticas pesadas e olhando na maioria das vezes para um lado mais positivo das coisas, Hunt era um playboy despojado, que xingava e fazia críticas duras no ar e não media palavras para apontar o dedo e fazer reclamações.

Era público que por muito tempo Walker se incomodou com a forma como Hunt resolvia assumir o microfone por diversos minutos, até mesmo saindo do lado apenas de comentarista e até narrando partes da corrida. Com o tempo, no entanto, os dois foram se ajustando e melhorando a sintonia, formando uma dupla de transmissão das mais icônicas, até a morte do ex-piloto por uma parada cardíaca, em 1993, ao 45 anos.

Walker seguiu comandando as transmissões da BBC e quando os direitos da F1 na Inglaterra mudaram para a ITV e Channel 4, ele foi junto. Ao seu lado, teve por um tempo os também ex-pilotos Jonathan Palmer e depois Martin Brundle, que permanece até hoje na cobertura da Sky Sports.

A aposentadoria veio em 2001, após o GP dos EUA, depois de 23 anos de F1 de maneira ininterrupta e 52 de microfone. Na ocasião, o proprietário do Autódromo de Indianápolis na época, Tony George, o presenteou com um tijolo do pavimento original da pista para marcar o momento.

Não foi, porém, o fim da carreira de Walker. Ele seguiu participando de programas e até algumas transmissões como convidado especial nos diferentes canais de televisão que possuíram os direitos de transmissão da F1 na Inglaterra ou que faziam alguma cobertura e programas de automobilismo.

A relação com o automobilismo

Walker nasceu em 10 de outubro de 1923 e era filho de Graham Walker, um motociclista que participava de diversas provas na Inglaterra e até mesmo no famoso TT da Ilha de Man. A relação de Murray com o esporte a motor então veio quase que por osmose.

Como o pai, ele começou sua carreira dentro da pista também correndo em motos. Ele chegou, inclusive, a ser contemporâneo de John Surtees, único campeão mundial de moto e de F1 da história, de quem se tornou um grande amigo.

Sem muito sucesso dentro das pistas, ele começou a se aventurar no mundo da publicidade, fazendo campanhas para algumas empresas como a fabricante de pneus Dunlop. Ele permaneceria no ramo por muitos anos, paralelamente ao seu trabalho de narrador, até quando passou a liderar as transmissões da BBC na F1 no final da década de 70.

O estilo de Walker e os Murraynismos

O primeiro trabalho de Walker como narrador foi transmitindo um evento de subida de montanha, algo muito popular na Europa na primeira metade do século XX e parte da segunda, em Shelsley Walsh, em 1948. No ano seguinte, ele fez um teste na BBC e ganhou a oportunidade de narrar o GP da Grã-Bretanha daquele ano na emissora de rádio do grupo. Ele seguiu a carreira no rádio e depois na televisão, principalmente com provas de motociclismo, até se tornar o titular na TV da BBC.  

Seu estilo era bastante particular. Para começar, ele era bastante empolgado, não importando muito o momento da corrida ou se ela realmente estava animada ou não. Tanto que ele permanecia praticamente toda a prova de pé e se mexendo, com o microfone nas mãos. E nos momentos de maior animação, sua voz mais aguda era uma marca.

Só que assim como acontece com Galvão Bueno no Brasil, o público não perdoava a suas muitas gafes durante as transmissões. E eram muitas. Coisas do tipo “Senna venceria três corridas consecutivas se tivesse vencido as duas anteriores” ou “Estamos na metade da corrida, então falta a outra metade pela frente”.

Mas ele sempre soube lidar bem com essas pisadas de bola, até com certo bem humor. O público apelidou estes momentos de Murraynismos. Em um deles, ele estava iniciando uma frase opinativa e percebeu o erro no meio do caminho, soltando a pérola “A não ser que eu esteja muito enganado… O que eu estou!”. A expressão ficou tão famosa, que Walker a utilizou para dar nome à sua autobiografia.

Essa combinação engraçada ficou bastante marcada em uma propaganda da Pizza Hut que Murray fez com Damon Hill, que descarta conhecimento da língua inglesa para compreender a comédia da situação.

https://www.youtube.com/watch?v=OGxVe3-Z5wo

A relação de Walker com Hill, inclusive, sempre foi muito próxima. Os dois se tornaram grandes amigos. E Murray não escondeu nenhum pouco essa amizade na vitória do inglês no GP do Japão de 1996, que lheu deu seu título mundial. “Eu tenho que parar porque tenho um nó na garganta”, disse Murray assim que Hill cruzou a linha de chegada em Suzuka.

De qualquer maneira, Walker se tornou pelos anos alguém bastante querido no paddock e um símbolo para a F1 fora das pistas. Por isso, ele tem um lugar especial na história do automobilismo. Claro que principalmente para os ingleses, mas nada impede que o resto do mundo possa admirar a sua bela carreira.

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