Max Verstappen e Lewis Hamilton travaram luta pela vitória no Bahrein
(Foto: Bryn Lennon/Getty Images/Red Bull Content)

Por que Verstappen teve que devolver a posição para Hamilton no Bahrein

Lewis Hamilton e Max Verstappen travaram uma bela briga pela vitória do GP do Bahrein deste domingo, na abertura da temporada 2021 da F1. E um lance a quatro voltas do final marcou bastante o embate, quando o holandês fez a ultrapassagem sobre o rival, mas metros depois teve que devolver a posição.

Acontece que Verstappen ultrapassou o limite de pista na saída da curva quatro, onde realizou a manobra por fora contra Hamilton, e por isso teria ganhado vantagem ao usar espaço além do limite da pista. Na visão da direção de prova, ele poderia ser punido se não devolvesse a posição, o que ele fez rapidamente, apenas algumas curvas depois.

Não existe muita dúvida de que Verstappen ultrapassou o limite de pista e foi com o carro inteiro na área de escape para conseguir completar a ultrapassagem. O que muita gente levantou nas redes sociais, no entanto, é por que ele precisou devolver a posição se diversos outros pilotos, incluindo Hamilton, passaram várias vezes durante a prova além da faixa branca que delimita o traçado naquele ponto.

Então, por que Verstappen teve que devolver a posição?

A regra de limite de pista

O artigo 27.3 do Regulamento Desportivo da F1 avisa que “os pilotos devem fazer todo o esforço razoável para usar a pista a todo momento e não devem deixar a pista sem um motivo justificável”. O trecho ainda explica o que é pista: “será considerado que o piloto deixou a pista se nenhuma parte do carro seguir em contato com ela e, para não deixar dúvidas, qualquer linha branca que define o limite da pista é considerada parte da pista, mas as zebras, não”.

O artigo ainda tem mais um parágrafo, que é o mais polêmico aqui, pois deixa o poder de decidir uma possível punição nas mãos do diretor de provas e dos comissários por pura interpretação. “Se o carro deixar a pista, o piloto deve retornar, porém, apenas pode fazer isso quando for seguro e sem ganhar nenhuma vantagem duradoura. A critério absoluto do diretor de corrida, um piloto pode ter a oportunidade de devolver toda a vantagem que ele ganhou ao sair da pista.”

Reparem bem neste trecho duas questões: “vantagem DURADOURA” e “critério absoluto do diretor de corrida”. Voltaremos nestes pontos.

Só que existe um problema considerável para fazer o controle deste tipo de situação. Como verificar em todos os centímetros de pista se os pilotos estão ganhando ou não vantagem ao infringirem os limites de pista? Sem usar um sensor contínuo por toda a extensão do traçado, é praticamente impossível fazer esse monitoramento, considerando ainda que são 20 carros andando ao mesmo tempo.

Por isso, a cada GP, o diretor de prova aponta em suas “anotações pré-corrida”, que são publicadas toda quinta-feira antes das etapas e reforçadas oralmente nas reuniões com os pilotos, quais são os pontos que ele e os comissários ficarão mais de olho. Para fazer essa eleição, é verificado o trecho do circuito em que sair da pista pode resultar em um ganho de tempo.

Ultrapassar o limite nestes pontos, inclusive, resulta em tempos deletados nos treinos livres e classificação. Na corrida, o piloto pode perder uma volta mais rápida, dependendo da pista. E caso repita diversas vezes a manobra buscando ganhar vantagem, ele pode vir a ser advertido com a bandeira preta e branca e depois receber uma punição de tempo. Durante o GP do Bahrein, Lewis Hamilton, após uma reclamação da Red Bull, foi alertado de que estava na beira de receber uma bandeira preta e branca.

Se formos para as notações do diretor de provas da FIA, Michael Masi, da última quinta-feira, existe uma determinação específica para a curva quatro durante as corridas.

“a) o limite de pista na saída da curva quatro não será monitorado na questão de um tempo de volta, já que os limites definidos são grama artificial e cascalho colocado no local.

b) Em todos os casos durante a corrida, os pilotos serão lembrados das disposições do artigo 27.3 do Regulamento Desportivo”.

Resumindo, durante a prova, os pilotos não seriam punidos no caso de ganharam uma vantagem de tempo, apesar de nesses casos serem lembrados que não podem ficar passando ali a todo o momento. E aí tem a pegadinha de Masi, que lembra do regulamento desportivo que citamos antes. Lembra?

Caímos então naquelas duas expressões que pedi para você guardar: “vantagem DURADOURA” e “critério absoluto do diretor de corrida”. O que pode ser considerado uma vantagem duradoura? Ganhar 0s1 no tempo de volta? Pouco provável. Ganhar uma posição na corrida? Sim, mais plausível.

On board de Verstappen na ultrapassagem sobre Hamilton. Holandês passa bastante do limite da pista
On board de Verstappen na ultrapassagem sobre Hamilton. Holandês passa bastante do limite da pista (Imagem: Reprodução/F1)

Verstappen não ganhou alguns décimos durante uma volta no meio da corrida. Ele tomou a ponta da prova ao ultrapassar Hamilton passando por fora do limite do traçado. E por isso ele logo foi alertado que deveria devolver a posição e nem reclamou sobre isso.

Outro lance, relativamente parecido durante a prova, teve uma decisão parecida por parte do piloto que tentava a ultrapassagem. Lando Norris, por fora, saiu da pista na tentativa em cima de Charles Leclerc. Após continuar forçando a posição, o inglês acabou cedendo. Depois da prova, ele explicou.

“Você poderia ir lá fora, mas sem ganhar nenhuma vantagem. Eu fui por fora de Charles. Foi uma luta justa. Ele me espremeu e isso é corrida. E eu fui para fora da pista e continuei acelerando depois. Ficamos lado a lado nas curvas cinco até sete. Mas você não pode ganhar vantagem. Fazendo isso, eu teria ganhado vantagem. Então, tive que desacelerar e deixar ele ficar com a posição.”

Norris sai do limite da pista em luta contra Leclerc. Inglês acabou desistindo da ultrpassagem (Imagem: Reprodução/F1)

O problema do regulamento

A questão principal aqui do regulamento é o fator interpretação. A regra não diz “não se pode ultrapassar passando por fora da pista” ou “se o piloto deixar o limite da pista em uma ultrapassagem, deve imediatamente devolver a posição”. Ela afirma simplesmente que se o piloto ganhar vantagem na ultrapassagem ao passar do limite da pista, ele pode ser punido.

Tudo, no final das contas, fica nas mãos de qual será a interpretação do diretor de provas e dos comissários responsáveis por julgar a manobra. Neste caso específico, ficou bastante claro que Verstappen não só ultrapassou o limite da pista como se não o fizesse, talvez não conseguiria completar a manobra.

O que irrita muitos dos fãs, porém, é o motivo da regra em alguns momentos ser acionada e em outros, não. O texto do regulamento – não só desse ponto como em vários outros artigos sobre temas importantes que podem gerar penalizações – deixa uma abertura enorme para a inconstância natural do juiz humano, que precisa avaliar caso a caso, em curvas e pistas diferentes, o que pode e não pode.

A dúvida de Verstappen

Nem no rádio ainda no carro ou nas entrevistas pós-corridas, Verstappen questionou a possível punição que ele tomaria por ter ultrapassado o limite de pista. Ele colocou uma dúvida, no entanto, na decisão da própria Red Bull de ter mandado ele devolver a posição imediatamente.

Ainda no rádio, após cruzar a linha de chegada, o piloto reclamou com a equipe: “Por que vocês não me deixaram seguir? Eu teria facilmente descontado os cinco segundos. Eu preferia perder assim do que um segundo lugar assim”, disparou. A resposta veio de Christian Horner, chefe da equipe: “Infelizmente, nós recebemos a instrução da direção de prova, Max.”

O que Verstappen queria era assumir a punição que provavelmente seria de cinco segundos, mas tentar abrir a diferença para Hamilton. Com três voltas e meia pela frente, mas pneus 11 giros mais novos e muito mais ritmo, como ficou demonstrado na sua aproximação antes, ele acreditava que poderia tentar descontar esse tempo.

Seria uma estratégia bastante ousada. Como analisou Pietro Fittipaldi depois da prova no pós-corrida do canal da F1 no Youtube, provavelmente a Red Bull considerou que ele ultrapassaria Hamilton de novo com alguma facilidade e não precisaria assumir o risco do cronômetro. São decisões assim, tomadas em milésimos de segundo, que podem definir uma corrida de F1.

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