Chaparral 2J: o estranho protótipo que inspirou o uso do efeito solo na F1

Uma das soluções encontradas pela F1 para deixar as disputas de posições mais próximas é a de trazer de voltar o efeito solo à categoria. O conceito está banido da categoria desde 1983 por motivos de segurança, mas com os carros mais protegidos e produzidos com materiais mais resistentes de hoje, os dirigentes acreditam que novo movimento para ajudar o show dentro da pista.

A ideia é que com mais pressão aerodinâmica gerada pela parte de baixo do carro, no assoalho, uma diminuição grande na produzida pela parte de cima poderia ser feita e assim, os carros que andam atrás dos adversários sofreriam menos com turbulência.

De qualquer maneira, é uma volta ao final dos 70, quando a F1, após muitos estudos, conseguiu utilizar o artifício. BRM e March já tinham realizado alguns testes interessantes em seus carros neste sentido no começo da década, mas quem encontrou o caminho das pedras mesmo foi Colin Chapman, com seu Lotus 78.

O carro, projetado por Peter Wright, Tony Rudd (ambos ex-BRM) e Martin Ogilvie, revolucionou a categoria entre o final de 1977 e sua evolução, o Lotus 79, levou Mário Andretti ao título, com seu companheiro Ronnie Peterson como vice, e a equipe inglesa ao campeonato de construtores em 1978.

Mas a ideia utilizada por Chapman não surgiu ali. Ela veio na verdade de uma experiência do outro lado do Atlântico. Oito anos antes, Jim Hall desenvolveu o modelo 2J da Chaparral para competir na temporada de 1970 da Can-Am, na época, uma das principais categorias de esporte protótipos, levando o conceito quase a seu máximo.

Desenvolvimento do Chaparral 2J com efeito solo

Após extensos estudos de pressão aerodinâmica e dinâmica de fluidos, o americano percebeu que poderia ganhar muita aderência ao tirar o melhor proveito possível da passagem do ar por debaixo do carro, utilizando conceitos do Efeito Venturi. De forma bastante resumida, a explicação é que, em um sistema fechado, como um duto, quando ocorre um estreitamento, a velocidade do fluido que está passando aumenta, diminuindo a pressão dentro dele.

Pensando nisso, Hall construiu um carro utilizando saias laterais, integradas à suspensão para sempre manter a mesma distância do solo, que canalizavam o ar que passava por debaixo do carro. Na traseira, duas ventoinhas, alimentadas por um motor auxiliar de snowmobile de dois cilindros, puxavam este ar, que ganhava ainda mais velocidade, fazendo a pressão cair na região. Por outro lado, o ar que passava por cima, mais lento, fazia uma pressão maior para baixo, “grudando” o 2J no chão.

Chaparral 2J desenvolvido por Jim Hall para a Can-Am
Chaparral 2J desenvolvido por Jim Hall para a Can-Am aproveitando o máximo do efeito solo

A ideia de usar um motor auxiliar para as ventoinhas em vez de conectá-las ao propulsor principal era de manter o seu funcionamento sempre constante, independente da variação da rotação de quando o piloto está acelerando ou não.

Com este artifício, o “Carro Ventilador” conseguia proporcionar uma aderência aerodinâmica muito grande até mesmo nas curvas de baixa. Além disso, praticamente acabava com o problema de as rodas girarem em falso. Nas retas, o sistema não aumentava o arrasto aerodinâmico. Assim, o motor Chevrolet V8 de 4.6 litros tinha liberdade para despejar à vontade os seus 680 cavalos de potência.

Quando foi para a pista, o conceito se mostrou perfeito e o carro era muito mais rápido que qualquer adversário. O problema, no entanto, era a confiabilidade. O 2J sofria muitos problemas mecânicos e quebrava demais.

Banimento e legado

Muito por pressão de outras equipes, alegando que o Chaparral utilizava um dispositivo aerodinâmico móvel, algo já proibido na época, acabou fazendo com que o carro fosse considerado ilegal pela SCCA (entidade americana que regulamentava a categoria) logo em seguida. Pilotos concorrentes também reclamavam que as ventoinhas jogavam pequenas pedras do asfalto para trás, o que poderia ferir alguém.

De qualquer maneira, foi o início dos estudos do efeito solo de forma mais profunda no automobilismo internacional. Em 78, em resposta ao Lotus 78 e sua evolução, o 79, a Brabham correu e venceu o GP da Suécia com um carro que levava um ventilador na traseira, o BT46B, de Gordon Murray, claramente inspirado no 2J, mas que também foi banido pela FIA logo em seguida, também sob alegação de peça aerodinâmica em movimento e por questão de segurança, por conta das pequenas pedras de asfalto lançadas para trás.

Conhecido como “carro-ventilador”, o Brabham BT46B também teve sucesso ao otimizar o efeito solo, mas foi banido

Em 2020, o próprio Murray, através de sua empresa Murray Automotive, lançou um superestivo de rua, o T.50, que utiliza o mesmo sistema com ventilador para aumentar a pressão aerodinâmica no carro.

O efeito solo continuou a ser utilizado na F1 através das saias e o trabalho aerodinâmico no assoalho. Só que as velocidades nas curvas começaram a ficar tão acentuadas, que a FIA resolveu proibir a utilização do conceito na categoria em 1983.

A partir de 1994, após a morte de Ayrton Senna, tentando diminuir ainda mais a velocidade, evitar trabalhos, a FIA introduziu dois degraus na parte central do assoalho por todo seu comprimento, deixando a região mais baixa que o restante, evitando desenhos que acelerassem o ar. Além disso, impôs uma prancha de madeira na área do carro para garantir que as equipes não deixassem seus modelos mais baixos com algum outro tipo de movimento que não pudesse ser detectado por inspenções técnicas.

Com todas estas restrições, o uso do efeito solo acabou ficando praticamente inviável na categoria, porém, não impossível. Longe do potencial total, peças como asas dianteiras mais refinadas e com o bico alto e desenhos diferentes do difusor na traseira do carro (Brawn GP, lembram?) tentam aproveitar pelo menos um pouco das possibilidades baseadas neste conceito ao otimizar ao máximo o fluxo do ar na parte de baixo do carro.

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