Benetton de 1994 foi uma das grandes polêmicas da F1
(Reprodução)

Desclassificações e discussão na F1: relembre grandes trapaças técnicas

De tempos em tempos, surge uma desclassificação na F1 que escancara uma irregularidade em um carro que ninguém tinha notado antes. Algo nas entranhas da máquina. As trapaças técnicas surgem muitas vezes de uma interpretação forçada do regulamento ou de uma genial forma de burlar as letras dos artigos que regem os limites.

Muitos dizem que as maiores dessas artimanhas sequer foram descobertas, de tão bem feitas, e são segredos até hoje. Existem outras, no entanto, que geram discussões acaloradas no paddock e na imprensa. Lembra do amortecedor de massa da Renault em 2006? Não gerou uma desclassificação para a equipe, mas acabou sendo banido por ser considerado uma peça aerodinâmica móvel, algo proibido.

Já o Lotus 88 nem foi para a pista. O famoso chassi duplo de Colin Chapman logo chamou a atenção dos rivais, que protestaram e conseguiram fazer com que a FIA impedisse o time inglês de participar de qualquer sessão oficial com o revolucionário carro.

Neste artigo, no entanto, resolvemos lembrar de polêmicas que resultaram em desclassificações, sanções ou acusações nas cortes da FIA após serem descobertas. Algumas são motivo de dúvida até hoje. Tire suas conclusões, opine, e, caso achar relevante, cite outros casos. Vamos lá:

Brabham e Williams – tanques de água em meio à briga política da F1 (1982)

As desclassificações de Nelson Piquet e Keke Rosberg no GP do Brasil de 1982 é um caso daqueles que podem ser considerados bastante complicados, principalmente porque era uma “trapaça legal”. O maior problema ali, muito provavelmente, foi o fato de o regulamento da F1 ser muito mal escrito.

As equipes que utilizavam motores aspirados na época precisavam carregar mais lastro para chegar ao peso mínimo porque seus carros eram mais leves. Quatro delas (Brabham, Williams, Lotus e McLaren), então, tiveram uma ideia de correr com freios refrigerados à água, que exigiam tanques extras.

O carro largava com este reservatório cheio, mas a água rapidamente evaporava. Assim, o monoposto ficava em pouco tempo 55 kg mais leve e abaixo do peso durante a corrida. Antes da pesagem pós-corrida, no entanto, o regulamento permitia aos times reporem líquidos perdidos na prova (basicamente óleo e combustível). No caso destas escuderias, elas enchiam estes pequenos tanques com água novamente e voltavam ao peso mínimo.

Teoricamente, a ideia estava dentro do regulamento, porém, a FIA declarou que era um artifício que ia de encontro com o “espírito” das normas. Sendo assim, Piquet, da Brabham, e Rosberg, da Williams, perderam a primeira e segunda posições, respectivamente, do GP. Alain Prost, de Renault turbo, herdou a vitória.

A grande polêmica é que McLaren e Lotus também se beneficiaram do artifício, só que John Watson e Nigel Mansell mantiveram a segunda e terceira colocações, após a desclassificação dos dois primeiros. O ato fez com que o presidente da FIA, Jean-Marie Balestre, ficasse pela primeira vez sob suspeita de beneficiar Alain Prost pelo fato de ambos serem franceses. Acusações que voltariam a acontecer alguns anos mais tarde, em 89, na fatídica desclassificação de Ayrton Senna no GP do Japão.

Tyrrell – chumbo no tanque (1984)

Em 1984, a Tyrrell era a única equipe da F1 a correr com motor aspirado. Ela, então, teve uma ideia parecida com a que foi utilizada pelos rivais no GP do Brasil de 1982 para se beneficiar de sua posição.

Stefan Bellof foi um dos destaques do GP de Mônaco de 84 com a Tyrrell

O time usava um sistema no seu Ford Cosworth de injeção de água, que serve para diminuir a temperatura dos cilindros. Enquanto o reabastecimento era proibido durante a corrida, a equipe podia durante os pitstops completar o tanque de água que tinha esta serventia.

Só que a Tyrrell estava aproveitando este momento para colocar no tanque cerca de 60 Kg de chumbo junto com a água. Ou seja, o carro corria abaixo do peso, e no final da prova, na última parada de box, o time fazia a manobra para deixa-lo dentro do peso mínimo. A mistura era injetada em alta pressão, e as pequenas esferas do metal chegavam a cair pelo pitlane, chamando a atenção muitos.

O artifício foi denunciado apenas na oitava etapa do campeonato, quando Martin Brundle terminou em segundo em Detroit. Como os primeiros colocados eram obrigados a passar por uma vistoria pós-corrida, o esquema foi descoberto.

Depois de muita discussão nos meses seguintes, sob alegação de lastro mal fixado e de que buracos ilegais teriam sido encontrados no assoalho do 012, a FIA resolveu desclassificar os carros da Tyrrell de forma retroativa de todas as provas de 84 e suspendê-la das últimas três que restavam, o que a deixou sem pontos no campeonato.

A punição acabou sendo bastante severa para o pecado da carismática equipe e muitos acreditam até hoje que a decisão foi política, com o intuito de afastar o único time da época que ainda insistia nos motores aspirados e que estava barrando novas mudanças no regulamento, já que unanimidade era necessária.

Benetton – retirada do filtro da válvula de reabastecimento em temporada polêmica da F1 (1994)

A temporada de 1994 da F1 foi polêmica e sempre gera muita discussão entre os fãs. O modelo B194 da Benetton certamente foi o centro das atenções quando Michael Schumacher arrebatou seis das primeiras sete corridas do ano.

Schumacher-Benetton-Ford-B194A suspeita inicial era de que a equipe estava utilizando um controle de tração disfarçado, já que o sistema tinha sido banido para aquele campeonato. Após o fatídico GP de San Marino, que terminou com as mortes de Ayrton Senna e Roland Ratzenberger, a FIA resolveu investigar a questão e pediu que Benetton, Ferrari e McLaren, dos três primeiros colocados da prova (Schumacher, Nicola Larini e Mika Hakkinen, respectivamente), entregassem cópias de seus sistemas de controle central dos carros. Os italianos logo enviaram seus dados enquanto os dois outros times foram multados pela entidade por tentarem bloquear o acesso dos comissários.

Depois de meses de análises, a FIA anunciou que encontrou um programa escondido dentro do sistema da Benetton que tinha o nome de “Controle de Largada”. Para acioná-lo, o piloto teria que entrar em uma linha em branco no menu do programa e acionar uma chave secreta. O sistema passaria a funcionar sem nenhum aviso na tela.

A Benetton alegou que o artifício, porém, não tinha sido utilizado em 94 e que era apenas um resquício do programa do carro de 93, que teria ficado escondido justamente para não ser acionado. Sem ter como provar o contrário, a FIA foi obrigada a desistir da acusação.

Só que pouco tempo depois, a Benetton se viu novamente sob uma forte investigação. Em um pit stop no GP da Alemanha, o carro de Jos Verstappen pegou fogo durante o reabastecimento.

A Intertechnique, fabricante do equipamento de abastecimento de todas as equipes da F1, partiu para uma averiguação do incidente e descobriu que a equipe tinha ilegalmente retirado um filtro do bocal da mangueira que injetava o combustível. Isso fazia com que as paradas da Benetton fossem cerca de 12% mais rápidas que a dos rivais.

A equipe se defendeu alegando que tinha feito um pedido para a Intertechnique para poder retirar a peça. A empresa negou que deu a autorização. A FIA decidiu que o time era culpado de tirar vantagem ao alterar o equipamento padrão sem autorização, porém, diante da alegação com provas da conversa com a fabricante, resolveu que não iria impor sanções já que não existia a intenção de trapacear.

BAR – peso mínimo (2005)

A BAR foi outra equipe da F1 que se viu envolta em uma discussão sobre a interpretação do regulamento sobre o peso mínimo do carro.

Após o GP de San Marino, os comissários da FIA identificaram que os carros da BAR, com os tanques de combustível drenados, pesavam 594,6 kg, abaixo dos 600 kg exigidos. A explicação do time foi de que os seus modelos não funcionavam com menos de 6 kg de combustível, que eram depositados em um segundo tanque. Em um primeiro momento, a resposta foi aceita.

A equipe BAR estava em ascensão na F1 quando foi pega. No final de 2005, foi vendida para a Honda (Foto: Honda)
A equipe BAR estava em ascensão na F1 quando foi pega. No final de 2005, foi vendida para a Honda (Foto: Honda)

Só que a própria FIA resolveu apelar da decisão de seus comissários, alegando que o reservatório extra era utilizado como uma espécie de lastro no momento da pesagem, e que o dispositivo abria uma forma de o time correr com o carro abaixo do peso em algum momento da corrida.

A BAR ainda tentou refutar a acusação em uma Audiência em Paris, mas os técnicos da FIA insistiram que a única maneira de ter certeza que a equipe nunca teria o carro abaixo do peso mínimo durante as provas era drenando todo o combustível, o que deixava o equipamento fora da especificação do regulamento.

A Corte de Apelação aceitou a acusação e não só desclassificou os pilotos do time do GP de San Marino como a escuderia ainda recebeu uma punição de duas etapas da F1.

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