Ferrari e Schumacher não conseguiram manter sequência de vitórias em 2005
(Foto: Ferrari)

A regra que acabou com o reinado da Ferrari e Schumacher na F1

De tempos em tempos, a F1 vive uma era de domínio de algum piloto ou equipe. Estamos em um período de vitórias e títulos consecutivos da Mercedes desde o começo do regulamento de motores híbridos. Antes disso, a Red Bull foi o time imbatível durante os anos em que a aerodinâmica de seus modelos fazia a diferença. E no começo dos anos 2000, a Ferrari tinha um reinado quase inabalável, liderada por Michael Schumacher.

Como já contamos em um outro artigo aqui no Projeto Motor, esses períodos de domínio de alguma equipe normalmente chegam ao fim por conta de alguma grande novidade técnica apresentada por uma rival ou uma mudança de regulamento que reconfigura de uma forma mais geral a F1.

E o que aconteceu no caso da Ferrari foi muito próximo desse segundo exemplo. A equipe italiana venceu os campeonatos de construtores de 1999 a 2004 e Schumacher conquistou uma sequência de títulos de 2000 a 2004, sendo que em duas oportunidades, em 2002 e 04, seu companheiro, Rubens Barrichello, ficou com o vice.

Quase todo ano, a FIA faz algum ajuste de regras. Isso chegou acontecer em 2003, quando um sistema de volta única na classificação e uma nova distribuição da pontuação que diminuía o valor da vitória foram introduzidos. A Ferrari até chegou a ser ameaçada com Schumacher levando o título apenas na última etapa, em Suzuka, por apenas dois pontos contra Kimi Raikkonen. Mas no ano seguinte, a equipe deu mais um grande salto de excelência com seu modelo F2004, voltando a nadar de braçada no campeonato.

Existem momentos em que a FIA sente a necessidade de dar uma chacoalhada mais forte na categoria. E com a teimosia da Ferrari em estar sempre à frente, 2005 foi um desses. E a consequência não foi só o fim da era Ferrari-Schumacher, mas uma temporada em que a escuderia italiana e o piloto alemão ficaram completamente fora da briga.

Mudanças de 2005 que feriram a Ferrari

Na época, a F1 ainda tinha duas fornecedoras de pneus: a Bridgestone e a Michelin. E a Ferrari tinha uma carta na manga nesta guerra. Entre os times grandes, ela era a única que utilizava os compostos da marca japonesa. Em 2004, além do time italiano, também eram calçados pelos Bridgestone a Jordan, Sauber e Minardi. Para o ano seguinte, nem o time suíço continuaria, já que ele também passaria a receber os pneus da Michelin.

Esse cenário permitia um trabalho da Bridgestone bastante específico para o carro da Ferrari. Os testes e todo o desenvolvimento eram focados nas necessidades e características dos modelos de Maranello. Enquanto isso, a Michelin se dividia entre os principais adversários, que na época eram McLaren, Williams, BAR e uma ascendente Renault.

Pneus Bridgestone acabaram sendo o ponto fraco da Ferrari em 2005 (Foto: Ferrari)

De olho nesta questão, a FIA achou que uma maneira de bagunçar um pouco a divisão de forças era mexer nos pneus. E a alteração foi grande. A entidade proibiu a partir de 2005 as trocas nos GPs. Ou seja, os pilotos teriam que utilizar o mesmo jogo de pneus na classificação e corrida inteira. A mudança seria permitida apenas em casos de furos ou um desgaste excessivo que poderia levar a algum risco da segurança. Apenas o composto com problema poderia ser trocado. Os outros três, permaneceriam os mesmos. E mesmo assim, a FIA iria depois investigar o pneu retirado para avaliar e se pronunciar sobre uma possível punição.

Claro que no caso de chuva, trocas também eram permitidas para os pneus apropriados para pista molhada, mas apenas depois que a direção de prova desse uma autorização geral, que apareceria ao mesmo tempo para as equipes no sistema de controle de corrida.

A Michelin já tinha nos anos anteriores uma pequena vantagem na duração de seu produto. Só que perdia para a Bridgestone em velocidade. A estrutura do pneu da marca japonesa também aguentava melhor forças laterais maiores, o que dava mais aderência mecânica em curvas de alta. Assim, esta mudança claramente visava equilibrar o pelotão dando alguma vantagem para os times que eram clientes da fornecedora francesa.

As estratégias de corrida com pit stops continuariam por conta do reabastecimento, com cada time escolhendo o momento de sua parada e andando com carro mais leve ou pesado quando achasse melhor. Isso também poderia ter uma influência nos pneus, já que andar com o tanque muito cheio poderia aumentar o desgaste dos compostos.

Outra mudança importante no regulamento foi na aerodinâmica. As asas dianteiras ficaram 5 cm mais altas enquanto as traseiras foram movidas 15 cm para frente. Com a perda da pressão nestes dois dispositivos, a maioria das equipes investiu na recuperação de parte da carga aerodinâmica através da parte central do difusor. A Ferrari, no entanto, tinha uma problema nesta área de seu carro por conta do desenho de seu trem de força (motor e transmissão), que limitava o design do difusor.

O time investiu consideravelmente nesta área com uma nova caixa de câmbio menor e mais leve, feita de titânio e fibra de carbono. A suspensão traseira da imponente F2004 também foi totalmente redesenhada para a F2005 para tentar melhorar a administração dos pneus, em um trabalho muito próximo com a Bridgestone.

Além disso tudo, durante as seis primeiras corridas do ano, foi utilizado um novo sistema de classificação em que as posições do grid eram definidas pela soma dos tempos de duas voltas dos pilotos. Uma feita no sábado à tarde e outra no domingo de manhã, algumas horas antes da corrida. Depois de diversas críticas, o sistema foi abandonado e revertido para o formato de volta única no sábado.

Nocaute logo no começo da temporada

Ainda na fase de pré-temporada, em que a Ferrari usou uma versão modificada da F2004, ficou claro que a escuderia estava em apuros. Tanto que o time correu para antecipar o lançamento de seu novo carro, que estava previsto apenas para a quinta etapa, na Espanha, para a terceira, no Bahrein.

Na abertura do campeonato, Schumacher largou em 19º por conta de uma punição por troca de motores. Rubens Barrichello ficou apenas com a 11ª posição do grid. O alemão bateu com Nick Heidfeld na volta 42 enquanto o brasileiro surpreendeu com uma boa recuperação para terminar em segundo, entre os dois carros da Renault.

Schumacher e a Ferrari tiveram que se contentar em só assistir à briga pelo título em 2005
Schumacher e a Ferrari tiveram que se contentar em só assistir à briga pelo título em 2005 (Foto: Ferrari)

O pódio de Barrichello em Melbourne, no entanto, foi um lapso de alegria que durou pouco. Na etapa seguinte, em Sepang, Schumacher terminou apenas em sétimo e o brasileiro abandonou. E no Bahrein, finalmente na estreia da F2005, Schumacher não terminou com um problema hidráulico e Barrichello cruzou a linha de chegada em nono, fora dos pontos (na época, apenas os oito primeiros pontuavam).

Em San Marino, quarto GP, a Ferrari até ensaiou uma reação. Em desvantagem no campeonato, a equipe se recusou a assinar um acordo de restrição de testes durante a temporada. O time praticamente não saiu da pista nas semanas anteriores e isso ajudou a acertar seu carro para a prova em Imola. Foram mais de 8.600 km entre os GPs do Bahrein e San Marino em sessões privadas  

Além disso, o domingo da corrida teve muitas nuvens e temperaturas médias ambiente e do asfalto um pouco mais baixas do que nas provas anteriores, diminuindo um pouco o problema de desgaste de pneus. Sendo assim, o time conseguiu atacar na prova. Barrichello largou em nono, mas abandonou na 18ª volta quando estava em oitavo com um problema elétrico.

Schumacher saiu apenas em 13º após um erro na classificação, mas fez uma recuperação impressionante, mostrando que a F2005 estava em boa forma naquele dia. Nas voltas finais, ele assumiu a segunda posição e partiu para cima do líder Fernando Alonso. Os dois protagonizaram uma bela briga e o espanhol conseguiu segurar a ponta para vencer.

Será que a Ferrari estava de volta? O tempo mostrou rapidamente que não. Um novo pódio aconteceu apenas três corridas depois, com o terceiro lugar de Barrichello em Nurburgring. Em Montreal, prova seguinte, pela primeira vez no ano o time conseguiu terminar com seus dois pilotos entre os três primeiros, com Schumacher em segundo e Barrichello em terceiro.

Nos Estados Unidos, veio a única vitória da temporada. Só que em uma situação bizarra. Os pneus da Michelin mostraram problemas para aguentarem as forças laterais na curva do oval que levava para a reta dos boxes. Vários estouros aconteceram nos treinos e depois de muita discussão sobre possíveis soluções, todas as equipes que usavam os compostos da fornecedora francesa tiveram que desistir da corrida. Assim, apenas os seis carros de Ferrari, Jordan e Minardi, que usavam Bridgestone, largaram para a prova. Você pode ver mais detalhes dos motivos desse vexame do vídeo abaixo do nosso canal no Youtube.

Ficou fácil para a Ferrari fazer a dobradinha, em uma briga bastante acirrada entre seus pilotos, que inclusive terminou com um Barrichello bastante frustrado por novas ordens de equipe. Essa dividida com a Ferrari em uma temporada em que o campeonato não estava mais em jogo motivou o brasileiro a romper seu contrato com o time e se transferir para a BAR.

Schumacher ainda conseguiria mais dois pódios naquele campeonato, na França e Hungria, e a Ferrari pararia por aí. Apenas nove resultados entre os três primeiros em 19 corridas. Apesar do desempenho ruim, o alemão ainda ficou com o terceiro lugar do campeonato de pilotos com 62 pontos contra 133 do campeão, Alonso. A Ferrari terminou em terceiro entre os construtores com 100 pontos enquanto a Renault levou o título com 191.

No ano seguinte, as trocas de pneus voltaram a ser permitidas, além da FIA impor mais um conjunto de mudanças, como a troca dos motores V10 de 3 litros pelos V8 de 2,4l. As caixas de câmbio também ganharam uma marcha obrigatória a mais, passando para sete velocidades.

Com as mudanças, a Ferrari voltou a ocupar um papel de protagonista, com Schumacher perdendo o título para Alonso apenas na etapa final do campeonato de2006, em Interlagos, e o construtores para a Renault por apenas três pontos.

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