Pace herói em Interlagos e a primeira dobradinha do Brasil na F1

O dia 26 de janeiro de 1975 é de enorme importância histórica para o Brasil na F1. O país não só viu sua primeira dobradinha na categoria, protagonizada por José Carlos Pace e Emerson Fittipaldi, como o feito ainda aconteceu em casa, no GP do Brasil em Interlagos.

Pace conquistou naquele dia sua única vitória na F1, com uma Brabham, e foi carregado pela torcida de seu carro até o pódio. Fittipaldi, já bicampeão mundial, terminou a prova em segundo com sua McLaren e se mantinha na briga por mais um título.

Era apenas a terceira vez que a F1 corria no país e a segunda com prova oficial válida pelo campeonato. Após a vitória do argentino Carlos Reutemann em prova de exibição em 1973, Fittipaldi venceu o GP de 74, em seu primeiro ano pela McLaren e em que conquistaria seu segundo campeonato mundial.

O novo triunfo, agora com Moco (apelido de Pace) representava uma grande coroação do automobilismo brasileiro pela demonstração de força de Fittipaldi e a aparente consolidação de um novo piloto do país no Mundial.

Quem era Pace

Nascido em São Paulo em 1944, e filho de um imigrante italiano, José Carlos Pace era considerado por muitos no Brasil como um dos grandes talentos que surgidos no país entre os anos 60 e 70. Ele era um piloto determinado, versátil e rápido. Muito rápido. Seu talento bruto ao volante era o que mais impressionava.

O pai criou e ganhou dinheiro com uma tecelagem, negócio que esperava passar ao filho quando ele se formasse no ensino médio. Mas não parecia ser muito o objetivo do jovem, que desde muito cedo mostrou interesse por corridas de carros.

Seu começo no kart foi difícil muito por conta de sua altura. Com 1,80m, ele era grande e pesado, uma enorme desvantagem na categoria de base. Assim, logo que possível, ele fez sua transição para os carros, onde não demorou para conquistar o título Brasileiro de Marcas com um Renault Gordini ao lado de Luiz Pereira Bueno, outro grande talento brasileiro na época.

Pace foi contratado para fazer parte da lendária equipe Willys, um dos capítulos mais importantes da história do automobilismo brasileiro, com um time formado com alguns dos principais nomes do país hhhhgyhpara competirem com os carros da marca e de forma totalmente profissional (algo também muito novo na época).

Anúncio da equipe Willys. Pace é o segundo da direita para a esquerda

Isso tudo sem nenhum incentivo – moral ou financeiro – do pai empresário, que não suportava a ideia do filho correndo atrás de uma carreira como piloto em vez de trabalhar na companhia da família.

Mas com as oportunidades que foram surgindo por conta de seu talento, nem isso o fez parar. E assim como Fittipaldi, ele também se lançou em uma trajetória na Inglaterra em 1970, conquistando o título local de F3, algo que na época era considerado um passo decisivo para a entrada na F1.

No ano seguinte, sem dinheiro, ele quase chegou a parar, mas amigos empresários conseguiram um patrocínio que lhe garantiu pelo menos mais duas temporadas na Europa correndo para Frank Williams na F2.

Assim, em 1972, ele entrou na F1 pela primeira equipe de Frank Williams, que usava um chassi alugado da March e seria a semente do que viria a ser a forte Williams dos anos 80 e 90.

Como era de se esperar, os resultados eram difíceis pelas limitações do time e do carro, mas ainda assim Pace terminou na zona de pontuação em duas etapas, com um quinto lugar Nivelles como destaque.

Paralelamente aos fórmulas, o brasileiro também recebeu vários convites para correr de protótipos na IMSA e na Europa. Isso incluiu uma participação nas 24 Horas de Le Mans pela equipe oficial da Ferrari em 1973, quando conquistou um segundo lugar. O resultado é o melhor de um brasileiro na prova até hoje, igualado apenas por Lucas di Grassi em 2014 pela Audi.

Em 1974, ele começou a temporada pela Surtess, e seguiu enfrentando dificuldades com um carro limitado. Mesmo assim, teve um momento importante com  o quarto lugar no GP do Brasil. No meio da temporada, ele aceitou então o convite de Bernie Ecclestone para se transferir para a Brabham.

Imediatamente, ele passou a frequentar o pelotão dos dez primeiros do grid, terminando com um segundo lugar em Watkins Glen.

GP do Brasil de 1975

A temporada de 1975 parecia começar bem para os brasileiros. Na etapa inicial, na Argentina, Pace largou no segundo lugar do grid e mantinha a posição, atrás do companheiro Reutemann, quando abandonou com problema no motor.

A vitória ficou com Emerson Fittipaldi, campeão do ano anterior e que fazia sua segunda temporada pela McLaren. Por isso, a expectativa era alta para o público brasileiro quando a F1 chegou em Interlagos para a segunda etapa do ano.

Só que existia uma grande – e surpreendente – ameaça: Jean-Pierre Jarier e sua Shadow. O francês já tinha feito a pole em Buenos Aires, mas não largou por um problema no carro. Nos primeiros treinos em São Paulo, ele sobrou no cronômetro. A confirmação do bom momento veio provou na classificação ao mais uma vez cravar a pole position com 0s8 de vantagem para o segundo colocado, Fittipaldi.

Na largada, Fittipaldi caiu para sétimo enquanto Pace subiu de sexto para terceiro. Na outra Brabham, Reutemann chegou a tomar a ponta de Jarier, mas o argentino sustentou a liderança por apenas quatro voltas até ser superado pelo francês.

Como era esperado, o piloto da Shadow logo abriu uma boa vantagem para a dupla da Brabham. Pace foi paciente até que conseguiu a ultrapassagem no companheiro de equipe na 14ª volta. Mas não parecia que conseguiria se aproximar do líder.

A oito voltas do final, a ordem era Jarier, Pace e Fittipaldi, que tinha se recuperado bem de sua largada ruim. Foi quando um problema da Shadow do francês fez Interlagos explodir em vibração. Com o abandono do francês por uma falha nos freios, os dois brasileiros passaram a liderar a corrida.

As voltas últimas voltas foram dramáticas para Pace que também começou a enfrentar sérios problemas com os freios. A diferença que chegou a ser de mais de 10s, começou a despencar.

Mesmo assim, ele conseguiu conduzir sua Brabham para a vitória, 5 segundos à frente do compatriota e amigo pessoal. Interlagos entrou em festa com o feito da dupla.

Pace celebra a vitória no GP do Brasil de 1975, em Interlagos
Pace celebra a vitória no GP do Brasil de 1975, em Interlagos

Pace depois da vitória em Interlagos

Com o resultado no Brasil, Fittipaldi e Pace lideravam o campeonato após as duas primeiras etapas. E assim eles se mantiveram até o final da quinta das 16 corridas da temporada.

Na sexta etapa, com uma vitória na Zolder combinada com os dois brasileiros fora da zona de pontuação, Niki Lauda assumiu a liderança da classificação geral para não mais perder até o final, conquistando o seu primeiro título mundial.

Fittipaldi ainda conseguiu terminar o ano com o vice-campeonato. No ano seguinte, ele deixaria a McLaren para se juntar ao irmão, Wilson Fittipaldi Jr, na equipe brasileira Copersucar Fittipaldi.

Pace teria em 1975 a melhor temporada de sua carreira na F1 ao terminar o campeonato em sexto com 24 pontos, mesmo que atrás de seu companheiro, Reutemann, terceiro, com 37.

No ano seguinte, ele teria um ano mais complicado com apenas sete pontos, mas à frente de Reutemann, que deixaria o time na fase final do campeonato para se transferir para a Ferrari.

Em 77, Pace começou a temporada mostrando que o conjunto Brabham-Alfa Romeo estaria mais equilibrado. Ele começou sua campanha com um segundo lugar na Argentina e se posicionando nas três corridas iniciais entre os seis primeiros do grid, incluindo uma primeira fila na África do Sul.

Foi então quando o brasileiro morreu em um acidente aéreo no dia 18 de março, quando voava em um monomotor vindo de uma fazenda em Araraquara, no interior de São Paulo, para a capital paulista.

Ao entrar em uma zona de muita chuva, o avião em que Pace e um amigo estavam caiu próximo à cidade de Mairiporã, a poucos quilômetros de São Paulo. O piloto deixou esposa e dois filhos pequenos.

Em 1985, foi aprovada homenagem e, que Interlagos passaria a se chamar oficialmente Autódromo José Carlos Pace. Em 2024, após conversas entre familiares, dirigentes da CBA e da prefeitura de São Paulo, os restos mortais do piloto foram transferidos para o local onde fica seu busto no circuito paulistano.

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