O GP da Grã-Bretanha de 2003 ficou marcado por diversos motivos. A começar, Rubens Barrichello conquistou uma de suas vitórias mais categóricas na F1. O brasileiro precisou fazer várias ultrapassagens e remar após uma inusitada invasão de pista em plena corrida, em uma cena que correu o mundo inteiro.

Em uma situação parecida com a da primeira vitória de Barrichello, no GP da Alemanha de 2000, a prova precisou ser neutralizada com a entrada do carro de segurança por conta do invasor da pista. E isso bagunçou bastante a briga.

Mesmo assim, aquele parecia que seria mesmo o dia do brasileiro. Que largou da pole position e teve um dos melhores desempenhos de sua carreira na F1. E em um momento em que ele precisava muito de uma atuação deste nível.

Barrichello fazia uma temporada de altos e baixos em 2003. Houve momentos bastante competitivos, como a prova liderada no Brasil antes da pane seca. Mas teve também algumas dificuldades em provas distintas. Por exemplo, na França, corrida anterior à de Silverstone, Rubinho rodou sozinho na primeira volta, caiu para último e só conseguiu terminar em sétimo.

Isso o deixou no quinto lugar na tabela, 25 pontos atrás do parceiro de Ferrari, Michael Schumacher – lembrando que, na época, a vitória rendia somente 10 pontos. E o momento do campeonato não era dos mais favoráveis à Ferrari.

Quem vinha em alta naquela fase do ano era a Williams, equipada com os pneus Michelin, que havia vencido três das últimas quatro provas. A Ferrari ainda tentava reagir com os pneus Bridgestone para manter as rédeas da disputa. E foi neste contexto que a F1 chegou a Silverstone.

Da sexta difícil para pole surpreendente de Barrichello

Na época, a F1 tinha um formato diferente para os fins de semana em relação a hoje. Na sexta-feira, havia uma pré-classificação, onde os pilotos faziam apenas uma volta lançada e um de cada vez na pista. Esta sessão servia apenas para definir a ordem em que os pilotos iriam à pista para a classificação de fato, no sábado, também com uma volta lançada e um de cada vez na pista, mas desta vez já com o combustível da largada. O mais rápido da pré-classificação seria o último a andar na classificação, e vice-versa – ou seja, o mais lento da pré-classificação iria à pista primeiro no sábado.

E as coisas começaram mal para Barrichello na sexta. Em sua tentativa, ele escapou da pista no trecho final do circuito de Silverstone e ficou preso na caixa de brita, sem conseguir completar a volta. Assim, ele ficou em penúltimo na pré-classificação, à frente apenas da Minardi de Justin Wilson, que não andou. Ou seja, Barrichello seria o segundo a fazer volta rápida na classificação de sábado, quando a pista, teoricamente, não estaria em suas melhores condições.

Só que na hora em que valia, o brasileiro da Ferrari surpreendeu ao anotar 1min21s209, que era um tempo bastante competitivo. E ainda contou com uma dose de sorte. Com o passar da sessão, o vento em Silverstone ficou mais forte, e os pilotos enfrentaram muitos problemas de equilíbrio, de modo que nenhum deles conseguiu ameaçar o tempo de Barrichello.

Schumacher, que fechou a sessão, chegou a escapar da pista e ficou somente em quinto. Assim, a pole position ficou com Barrichello, à frente de Jarno Trulli, da Renault, e de Kimi Raikkonen, da McLaren.

Domingo de muita briga e a invasão de pista

A corrida foi muito movimentada desde os primeiros metros. Logo na largada, Barrichello foi superado por Trulli, já que a Renault era conhecida por seu eficiente controle de largada, e também por Raikkonen, o que jogou o brasileiro para terceiro. Mas o ritmo do piloto da Ferrari era muito forte, e ele fez uma bela ultrapassagem sobre o finlandês da McLaren na 11ª volta para subir para o segundo lugar. Quando começava a armar seu ataque a Trulli, a corrida de Silverstone teve seu momento mais surreal e perigoso, o que se tornaria uma cena marcante.

Na 12ª volta, um homem com trajes típicos irlandeses invadiu a pista na Reta do Hangar, trecho em que os carros se aproximavam dos 300 km/h. Ele também carregava consigo alguns cartazes com dizeres religiosos, e parecia querer mostrar a sua mensagem não só aos espectadores, mas também aos pilotos, o que resultou em um momento bastante perigoso. O invasor foi retirado da pista arrastado pelos fiscais, e a direção de prova colocou o safety car, o que virou a corrida de cabeça para baixo.

Todos os ponteiros, incluindo Trulli, Rubinho e Raikkonen, aproveitaram a ocasião para fazer pit stops, o que beneficiou aqueles que já haviam parado antes da confusão. Foi o caso de Cristiano da Matta, da Toyota, que herdou a primeira posição com essa loucura toda. O mineiro liderou a corrida por 17 voltas, o que marcou um dos pontos altos de sua temporada de estreia na F1. Enquanto isso, Barrichello caiu para oitavo e precisava remar para voltar ao pelotão da frente.

Mas o brasileiro estava em tarde inspirada. Com um ritmo forte, ele superou Ralf Schumacher, da Williams, na volta 17, e enfim superou Trulli na volta 26. Já outros pilotos que vinham à sua frente, como Da Matta, Olivier Panis e David Coulthard, estavam em estratégias diferentes. Quando todos estes fizeram suas paradas, Barrichello ficou atrás apenas de Raikkonen

Na volta 41, logo depois da segunda rodada de pit stops, Rubinho forçou o ritmo, colou no “Homem de Gelo” e fez novamente uma ultrapassagem para retornar ao primeiro lugar. Dali em diante era só questão de manter o ritmo para receber a bandeirada e conquistar uma impressionante vitória, repleta de contratempos.

Aquela era a sexta vitória de Rubinho na F1. Curiosamente, o primeiro triunfo do brasileiro, na Alemanha, em 2000, também teve a corrida afetada por uma invasão de pista. Juan Pablo Montoya também passou Raikkonen para terminar em segundo, e o finlandês da McLaren completou o pódio, em terceiro. Schumacher foi o quarto e viu sua vantagem na liderança do campeonato cair para apenas sete pontos.

Foi uma das vitórias mais celebradas de Barrichello, que viu a oportunidade como uma chance de calar os críticos, principalmente pelos incidentes nos quais ele havia se envolvido nos tempos recentes. Porém, o bom momento não foi mantido para a continuação do campeonato, já que ele abandonou as duas corridas seguintes e fechou o ano em quarto, vencendo mais uma vez na etapa final, no Japão.

Mas, inevitavelmente, um dos assuntos mais comentados daquela prova em Silverstone foi a invasão de pista. Bernie Ecclestone, na época diretor executivo da F1, fez duras críticas à segurança do circuito de Silverstone, o que era bastante delicado – afinal, a pista negociava com a F1 a sua permanência no calendário.

O invasor, posteriormente identificado como o ex-padre irlandês Cornelius Horan, foi levado à polícia em Northampton e foi acusado de invasão de propriedade. Ele foi preso sem direito a fiança e foi liberado depois de dois meses. Horan declarou que não invadiu a pista de forma premeditada, e sim que foi algo no calor do momento, quando foi conduzido “pela mão invisível de Deus” – então, justamente por isso, ele não podia se declarar arrependido. No entanto, reforçou que “não planejaria infringir a lei novamente”, o que acabou não acontecendo.

No ano seguinte, em 2004, Horan invadiu a maratona dos Jogos Olímpicos de Atenas e agarrou o líder da prova, o brasileiro Vanderlei Cordeiro de Lima, em uma cena que ficou mundialmente famosa.

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