Graham Hill levou a BRM ao título em 1962

BRM: do sonho patriótico pós-guerra ao título |Motores Independentes #4

Sim, a BRM foi mais do que uma fabricante de motores. Nasceu de uma ideia de organizar uma equipe de corridas 100% britânica no pós-guerra. Mas a empresa não foge da característica principal desta série de companhias que faziam propulsores batendo de frente com grandes marcas do setor automotivo e que sempre dominaram as competições do esporte, em especial, a F1.

Ainda na década de 30, Raymond Mays, um piloto já com alguns sucessos em subidas de montanha e outras provas, Peter Berthon, engenheiro com passagem pela Força Aérea Real, e Humphrey Cook, o cara da grana, fundaram a ERA (English Racing Automobiles). O objetivo era de tentar fabricar carros ingleses para competirem contra concorrentes de outros países, principalmente Itália e Alemanha, nos GPs europeus.

Eles ainda chamaram para a equipe técnica Reid Railton para projetar o chassi e usavam um motor Riley a metanol de seis cilindros modificado. Eles o deixaram com três configurações diferentes, sendo que a de 1.500 litro chegava aos 200 cavalos.

O R1A foi um carro de sucesso, com diversas vitórias pela Europa na segunda metade dos 30. Só que a II Guerra veio, paralisando por um tempo as corridas e operação da empresa. Ao fim das batalhas, a ERA retornou às pistas, porém, Mays e Berthon sentiram a necessidade e seguir para um outro projeto.

Assim, nasceu, em 1945, a BRM ou British Racing Motors. A ideia, mais uma vez, era a de apostar no prestígio nacional britânico na construção de carros para consolidar uma nova empresa que não só correria, mas que fabricaria seus próprios chassis e motores. O discurso colou com a indústria automobilística e de fornecedores, que resolveram ajudar na empreitada com a criação de um fundo para financiar a aventura

Uma fábrica foi montada na cidade inglesa de Bourne, próxima à casa da família de Mays, no mesmo galpão onde a ERA estava sediada antes da Guerra. O local tinha perto o aeródromo de Folkingham, que podia ser utilizado para testes. Diversos ex-funcionários da ERA, inclusive, voltaram à ativa na BRM. Entre eles, os projetistas Harry Mundy, de motores, e Eric Richter, de chassis.

Logo no primeiro modelo, o grupo mostrou sua ousadia. O regulamento dos GPs a partir de 1947 ainda limitava os motores da mesma forma como o pré-Guerra nas configurações de 4.5 litros aspirado ou 1.5 litro supercharged. A BRM escolheu partir para um projeto de um V16 1,5 supercharged. A Rolls-Royce, inglesa, claro, foi contratada para produzir um compressor centrífugo para o conjunto.

O BRM 15 demorou para chegar à pista, sendo acionado apenas em 49. O motor realmente era muito potente, só que ele despejava essa força muito rapidamente, antes do monoposto desenvolver uma boa velocidade final. Isso fazia com que o acelerador fosse muito sensível, o que, somado aos estreitos pneus da época, resultava nas rodas derrapando e patinando por não conseguirem transmitir toda força. Um monstro difícil de ser domado.

Reg Parnell ainda conseguiu vencer as duas primeiras corridas do modelo em 50, uma pela Fórmula Libre e outra em uma prova da F1 não válida pelo campeonato em Goodwood. No entanto, o sucesso parou por aí diante dos diversos problemas de dirigibilidade e confiabilidade do motor. O projeto logo se mostrou perdido para o time, ainda mais depois do anúncio da FIA de novas regras para 1954 em que os propulsores seriam limitados a 2.5 litros aspirado ou 750cc supercharged.

Paralelamente, muito por conta dos péssimos resultados e pela demora no desenvolvimento, diversos dos apoiadores iniciais saíram do fundo que financiava a equipe. Aos poucos, a BRM acabou indo para um novo dono, o empresário Alfred Owen, proprietário da companhia de engenharia Rubery Owen, que fabricava assessórios automotivos. Os carros e motores seguiram recebendo a nomenclatura “BRM”, mas passaram a ser inscritos pela equipe “Owen Racing Organisation”.

Com o fracasso do V16, muito por conta da alta complexidade do projeto, a equipe resolveu apostar em algo mais simples. O P25 foi idealizado por Tony Rudd, recém-chegado da Rolls, e Stewart Tresilian com um motor de quatro cilindros de 2.5 litros desenhado em proporção superquadrado, de curso de pistão bastante curto, o que aumenta a capacidade de giros na alta, mas diminui o torque e pancada na aceleração. Ou seja, a ideia era buscar algo totalmente diferente do V16.

Mais uma vez, o desenvolvimento do modelo atrasou. A Owen, inclusive, entrou na F1 com modelos com um Maserati 250F enquanto seu próprio carro não ficava pronto. A estreia aconteceu em uma prova não válida pelo campeonato, em setembro de 1955. Mas os primeiros anos de desenvolvimento foram complicados, mais uma vez com quebras seguidas.

O carro até tinha um bom rendimento quando estava andando, só que o motor, por utilizar válvulas maiores por conta de sua proporção curso e diâmetro, enfrentava problemas com detritos no cilindro. O chassi também tinha um sistema nada confiável de sistema de freio com disco único. Para se ter ideia, a primeira corrida que o P25 terminou foi apenas em 58, com um quinto lugar de Harry Schell no GP de Mônaco.

Na mesma temporada, o piloto americano e Jean Behra ainda chegaram em segundo e terceiro, respectivamente, no GP da Holanda, fazendo a BRM subir ao pódio pela primeira vez. Enfim, a equipe conseguira resolver as falhas do carro, que mostrou seu potencial com seguidos bons resultados, deixando o time na quarta posição do campeonato de construtores inaugural da F1.

O bom momento continuou no ano seguinte, com Jo Bonnier conquistando a primeira vitória da organização, também no circuito holandês de Zandvoort. Só 59 foi o ano em que a Cooper introduziu na F1 o motor traseiro, o que lhe deu grande vantagem e a levou ao título de construtores e pilotos, com Jack Brabham.

A reação da BRM foi desenvolver rapidamente o P48 para a temporada de 60, um modelo que mantinha diversas características de seu antecessor, porém, projetado para ter um motor traseiro como o do rival. O projeto, porém, não foi bem-sucedido, mais uma vez por problemas de confiabilidade.

Diante do novo regulamento que passou a limitar os motores a 1.5 litro, o time resolveu abandonar seu próprio equipamento e correu em 61 com o P48/57, uma evolução do chassi anterior, utilizando o propulsor Coventry Climax, mesmo da Cooper, porém, sem bons resultados.

Sofrendo ameaças de Alfred Owen de ter suas operações encerradas, a BRM e seus engenheiros, agora sob chefia de Rudd, mergulharam no segundo semestre de 61 em um novo projeto.

O P57 foi certamente um dos modelos mais importantes da história da empresa e que a levou ao seu auge. O novo modelo passou a contar com um V8 de 1.5 litro projetado por Berthon e Aubrey Woods que, apesar de ter praticamente a mesma potência dos rivais, girava a 11 mil RPM. Com este carro, Graham Hill conquistou quatro vitórias em 62 e se sagrou campeão entre os pilotos, além de levar a BRM ao triunfo entre os construtores.

O conjunto era bom o bastante para manter a equipe entre as melhores da F1 nos anos seguintes, mesmo com a introdução de um novo modelo, o P261, que seguiu com bom rendimento. Hill e BRM ficaram com o vice-campeonato por três temporadas consecutivas, batidos pela Lotus-Climax, Ferrari e Lotus novamente.

Com a nova mudança no regulamento de motores para 66, em que o tamanho máximo dos propulsores cresceu novamente para 3 litros, a BRM voltou a perder espaço. O time recusou a proposta de Berthon de produzir um V12 e investiu em um novo projeto de Rudd de um H16, em que dois oito cilindros flat foram montados um ao lado do outro com o virabrequim no meio. O equipamento era forte, porém, extremamente pesado e com pouca confiabilidade.

Depois de tantos problemas, a empresa revolveu apostar em um V12 desenhado por Geoff Johnson. Apesar de muito trabalho de desenvolvimento e bons pilotos ao volante, o time seguiu durante toda a segunda metade da década de 60 apenas como mediano, principalmente diante do novo motor Ford Cosworth DFV, que passaria a dominar a F1.

A últimas vitórias aconteceram em 71 e 72, com o modelo P160, equipado com o V12 de 3 litros que, agora com um sistema de quatro válvulas por cilindro, chegava a desenvolver cerca de 450 cavalos a 10.500 RPM.

O restante da década de 70, porém, foi de declínio, especialmente depois de Owen se retirar da sociedade. O time desenvolveu novos chassis em casa, mas pouco conseguiu evoluir com seu motor, seguindo sempre na configuração de V12. A última prova da BRM foi o GP da África do Sul de 77, com um 15º lugar de Larry Perkins.

Série Motores independentes:
1 – Judd: o V8 que reinou da F1 das equipes médias

2 – Hart: a pequena que quase surpreendeu os grandes
3 – O sonho da Motori Moderni e a bizarrice da Life

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