O sonho da Motori Moderni e a bizarrice da Life | Motores Independentes #3
Não é fácil competir na F1. Seja você um piloto, equipe ou um fabricante de motores. Se não existir um apoio financeiro por trás da empresa, então, a sobrevivência a médio ou longo prazo é quase impossível.
Muito dessa série sobre empreitadas independentes de fornecedores de propulsores fala sobre isso. Muitas vezes, apenas paixão e conhecimento técnico não é o suficiente para se dar bem na categoria.
Já citamos dois casos que tiveram até um relativo sucesso dentro de suas limitações, com Judd e Hart. Agora, vamos mostrar dois casos que, mesmo com engenheiros que traziam certo know-how no design de motores, a falta de dinheiro e organização, principalmente das equipes associadas, levaram os projetos a naufragarem rapidamente: Motori Moderni e Life.
Importante destacar que são situações bem diferentes, apesar de terem nascido de pessoas que trabalharam juntas no passado e a falta de resultados ter sido constante para ambas. De qualquer maneira, como sempre dizemos aqui no Projeto Motor, o que vale é contar a história.
Motori Moderni
O engenheiro Carlo Chiti era um ex-piloto italiano e empregado de longa data do departamento de competições da Alfa Romeo, com uma passagem pela Ferrari no final dos anos 50 pelo caminho.
Descontente com os caminhos da Alfa, ele deixou a empresa em 1984 e logo foi abordado por Giancarlo Minardi para liderar um novo projeto para a construção de um turbo para o seu time, que iria estrear na F1 no ano seguinte. Minardi convenceu seu parceiro Piero Mancini a financiar a empreitada e assim Chiti fundou a Motori Moderni, na cidade de Novara.
Em poucos meses, a nova companhia desenvolveu um V6 turbo de 1,5 litro que, segundo relatos da época, desenvolvia por volta de 720 cavalos, longe dos concorrentes Porsche, Renault, Honda e BMW, que ficavam entre os 900 e 1.000 cv.
A estreia aconteceu na terceira etapa de 1985, em Ímola, com uma participação sem brilho, em que Pierluigi Martini conquistou a 19ª posição do grid. Na corrida, porém, o turbo sofreu problemas e fez com que o italiano abandonasse na 14ª volta.
Durante a temporada, a falta de potência ficou evidente. A Minardi não marcou pontos, tendo como melhor resultado um oitavo lugar em Adelaide, mas ficando muito longe dos adversários. Somada à falta de força do equipamento, o modelo M185 do time sofria com sobrepeso, bem acima do mínimo exigido pela FIA. Em pistas de alta, como Silverstone, por exemplo, o conjunto sofria bastante, com Martini ficando a mais de 8 segundos do tempo da pole.
Mesmo conseguindo alguns cavalos a mais para 86, o motor continuou fraco para o nível da F1, e a Minardi seguiu sem pontos. Mancini resolveu entrar ao final da temporada com sua própria equipe, a AGS, também utilizando os V6 turbo de Chiti, sem sucesso.
O cenário também não mudou em 87, com os Minardi equipados com Motori Moderni turbo sofrendo até mesmo para bater os DFZ aspirados da Cosworth. Mais uma vez sem chegar aos pontos, o fim daquela temporada seria também o final da linha para a empresa na F1.
Chiti chegou a desenhar em 88 um propulsor aspirado flat de 12 cilindros para 89, quando os turbos seriam banidos da F1. O projeto foi vendido para a Subaru, que se uniu à equipe Coloni. Como já contamos aqui no Projeto Motor, o programa da montadora japonesa foi um completo desastre.
Life
O projeto da Life é uma das coisas mais bizarras e desastradas da história da F1, resultando em uma equipe que pode ser considerada uma das ou até mesmo a pior a entrar na categoria. Tudo começou quando o empresário italiano Ernesto Vita resolveu fundar sua escuderia no Mundial.
Ele comprou o carro da First Racing, time de Lamberto Leoni que entraria na F1 em 89, mas que na última hora perdeu seus patrocinadores e desistiu antes mesmo de iniciar sua operação para valer. O modelo tinha sido projetado pelo brasileiro Ricardo Divila, mas foi remodelado por Gianni Marelli para dar vida ao Life L190. Divila chegou a escrever na época à F1 dizendo que o monoposto não tinha condições de segurança e desempenho para competir no Mundial.
Vita se associou a Franco Rocchi, ex-projetista da Ferrari, que lhe vendeu a ideia de um motor de 12 cilindros em W. Isso mesmo. O propulsor tinha três bancadas de 4 cilindros em ângulos de 60°. Assim, ele era tão curto quanto um V8, porém, mais alto.
Rocchi, na verdade, já tinha trabalhado em algo parecido em seus tempos de Maranello, quando chegou a desenvolver um protótipo W3 de 500cc, que servia como estudo para um W18 de 3 litros, que nunca saiu do papel. Após deixar a Ferrari no começo dos anos 80, ele passou a se concentrar em desenhar seu W12 até encontrar alguém disposto a investir.
O conjunto estreou na temporada de 90. E como era de se esperar, com tantos remendos e ideias mirabolantes sem dinheiro para um desenvolvimento apropriado, foi um fracasso completo. Em 14 tentativas, o time não conseguiu se classificar em nenhuma oportunidade para o grid. Vita tentou vender seu motor W12 para alguma outra equipe para levantar algum dinheiro, sem sucesso.
O propulsor desenhado por Rocchi não tinha potência e era muito pesado. Um total fracasso. Para se ter ideia, em Silverstone, pista em que na época era de velocidade pura, o carro ficou a mais de 18 segundos da pole na classificação e a 6s7 do penúltimo colocado, a Coloni-Subaru citada acima na história da Motori Moderni.
Vita, no meio da temporada, saiu correndo e conseguiu comprar alguns V8 da Judd para tentar reverter a situação de sua equipe. O time continuou sem sucesso e ao final da fase europeia do campeonato, na Espanha, a Life fechou as portas, dando fim também ao projeto questionável do W12 de Rocchi.
Série Motores independentes:
1 – Judd: o V8 que reinou da F1 das equipes médias
2 – Hart: a pequena que quase surpreendeu os grandes
4 – BRM: do sonho patriótico pós-guerra ao título
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