(Foto: Florent Gooden / DPPI / Alfa Romeo)

Fatores que salvaram a vida de Zhou Guanyu no acidente em Silverstone

Zhou Guanyu protagonizou um dos acidentes mais assustadores de 2022. No GP da Grã-Bretanha, o piloto chinês capotou e foi parar no alambrado que protege a arquibancada, o que gerou momentos de tensão e de muita preocupação.

Porém, minutos depois foi confirmado que ninguém se feriu, e Zhou até retornou a Silverstone para acompanhar o final da corrida depois de ser liberado do hospital. Passado o susto, é o momento de examinar a dinâmica do ocorrido e entender em detalhes alguns pontos fundamentais do acidente. Quais fatores funcionaram corretamente para salvar a vida do piloto? E o que ainda precisa ser compreendido e aprimorado?

Tudo aconteceu nos metros iniciais da corrida em Silverstone. Zhou partia em nono, logo atrás de George Russell, da Mercedes, e duas posições à frente de Pierre Gasly, da AlphaTauri. Quando as luzes se apagaram, o chinês partiu melhor e já ganhava a posição de Russell, mas Gasly também entrou na disputa entre os dois e acabou espremido.

Assim, houve um toque entre Gasly e Russell, sendo que a Mercedes rodou e também colidiu com seu pneu dianteiro esquerdo no traseiro direito da Alfa Romeo. Isso fez o carro de Zhou decolar e virar de cabeça para baixo.

O santantônio

Esta parte do carro, situada onde também há uma entrada de ar, é a primeira a ser exigida em acidentes deste tipo, pois ela tem papel fundamental para proteger a cabeça do piloto.

No entanto, com o forte impacto no chão, mais o fato de ter se arrastado pelo asfalto, o santantonio do carro cedeu quase que por completo, e isso é um enorme ponto de alerta. Afinal, sem o santantonio, o capacete do piloto fica mais exposto em casos de capotagem, o que pode resultar tanto em lesões na cabeça como na coluna.

Foi o caso, por exemplo, do que aconteceu com Philippe Streiff em Jacarepaguá, em um caso que já detalhamos por aqui. A Alfa Romeo utiliza um projeto de lâmina única na entrada de ar por questões de aerodinâmica e de peso, em um design que foi usado pela primeira vez pela Mercedes em 2010.

Mas, de qualquer forma, para um carro ser aprovado para competir na F1, ele precisa passar por todos os testes obrigatórios de impacto, que exigem que a peça resista a uma força vertical de 105 kN, com 60 kN na lateral, e 70 kN na longitudinal. Foi o caso do modelo C42. Desta forma, boa parte da investigação da FIA vai focar nesta área, para entender o que aconteceu de e errado e o que pode ser aprimorado para o futuro.

Zhou Guanyu agradece halo

Sem o santantonio, o carro se apoiou basicamente no halo. O próprio Zhou afirmou que “a peça salvou a sua vida”, e ela de fato fez o seu trabalho como era suposto. As imagens mostraram que, durante todo o tempo em que o carro deslizava pelo asfalto, na decolagem e na queda entre o alambrado e a barreira de pneus, o capacete do piloto ficou o tempo inteiro protegido de um impacto direto.

O halo foi introduzido na F1 em 2018, e é uma estrutura feita de titânio que pesa cerca de 7 kg. De acordo com a própria F1, trata-se da peça mais resistente de todo o carro. Nos testes obrigatórios, ele precisa resistir a uma força vertical de 116 kN, o que é equivalente a aproximadamente 12 toneladas, ou seja, mais do que um ônibus parado em cima da peça.

Em 2022, ele já está em sua quarta atualização, ganhando ainda mais resistência, principalmente nos três pontos em que ele se conecta com o restante da estrutura do chassi.

O carro de Zhou se arrastou por mais de 100 metros no asfalto, o que até causou danos ao circuito, chegou à caixa de brita, e ali decolou de vez.

Caixa de brita e alambrado

Nas últimas décadas, a FIA vem implementando cada vez mais áreas de escape asfaltadas para competições do nível da F1, justamente para evitar uma eventual capotagem, e possibilitar que o piloto retome o controle mais facilmente em caso de escapada. Por outro lado, a brita ainda aparece em alguns pontos, especialmente em pistas que também recebem corridas de moto, como é o caso de Silverstone.

A presença da brita em pontos críticos, especialmente em locais de alta velocidade, também é algo que deve passar pela investigação do acidente. Depois de decolar por cima da barreira de

pneus, o carro de Zhou voou em direção às arquibancadas, mas foi contido pelo alambrado.

Este é um ponto discreto, mas fundamental na segurança dos circuitos, importante para segurar não só o carro em si, como também para evitar que detritos atinjam os torcedores.

Para 2022, a FIA homologou um novo tipo de alambrado para circuitos de Grau 1, ou seja, circuitos que estão aptos a receber GPs de F1. Uma nova tecnologia no entrelaçamento e aumento do diâmetro dos cabos de aço permite aumentar a distância entre os postes de sustentação de quatro para seis metros, e sem perder resistência.

O maior espaçamento entre os postes melhora a visibilidade que o público tem da pista, e também reduz a chance de haver um impacto do carro com um destes postes. Em outras categorias, a colisão direta com o poste trouxe consequências muito sérias, como foi o caso do acidente que matou Dan Wheldon, em 2011, e o que lesionou Robert Wickens em 2018, ambos na Indy.

No novo tipo de alambrado da F1, dois testes foram realizados. No primeiro, um carro de uma tonelada foi arremessado em direção à grade a 150 km/h. No segundo, uma bola de aço de 780 kg foi lançada a 62 km/h. Em ambos os casos, o alambrado cumpriu o seu papel como deveria.

Ensinamentos do acidente de Grosjean de 2020 ajudaram no de Zhou Guanyu

Por último, mas não menos importante, foi fundamental o fato de não ter havido um incêndio, uma vez que Zhou ficou preso em seu carro entre o alambrado e a barreira de pneus. O fogo esteve presente no aterrorizante acidente de Romain Grosjean no GP do Bahrein de 2020, que já detalhamos neste vídeo aqui do Projeto Motor:

Naquela ocasião, o tanque de combustível do carro se partiu, o que deu início a um enorme incêndio. Depois disso, a F1 implementou um reforço tanto na proteção do tanque quanto em sua construção em si, em kevlar.

Desta forma, os fiscais e médicos puderam realizar a extração do piloto com calma e segurança mesmo em um acidente acontecido no começo da corrida, quando o carro pode carregar até 110 kg de combustível.

Todos estes pontos mostram que até mesmo os pequenos avanços de segurança trabalham em conjunto para proteger não só o piloto dentro do carro, mas também fiscais de pista e público nas arquibancadas.

Por outro lado, qualquer acidente, incluindo os que terminam com todos os envolvidos ilesos, expõem vulnerabilidades e pontos que podem ser aprimorados ainda mais para o futuro.

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