(Foto: Mark Thompson/Getty Images/Red Bull Content)

Ricciardo: o fim melancólico de uma das grandes promessas da F1

Com o anúncio da substituição de Daniel Ricciardo por Liam Lawson na RB, tudo indica que a carreira do australiano na F1 está chegando ao fim. É uma despedida com ares melancólicos pela falta de desempenho e resultados nos últimos anos.

E a linguagem corporal e tom de voz do piloto nas entrevistas durante sua última corrida, em Singapura, já deixavam a entender que ele vivia seus momentos derradeiros como piloto da F1.

O último feito de Ricciardo, que queira ou não fica para os livros de história, foi a volta mais rápida no GP de Singapura, graças a uma troca pneus a quatro giros do final.

A manobra acabou levantando questionamentos sobre a relação entre time principal e satélite da Red Bull, pois ajudou a tirar o ponto extra de Lando Norris, perseguidor de Max Verstappen no campeonato. Isso só mostra um pouco ao que acabou sendo reduzido Ricciardo, que terminou a prova em 18º.

No período em que competiu na RB, Ricciardo teve como companheiro de equipe Yuki Tsunoda. Em 2023, eles competiram juntos em sete etapas do Mundial, e o australiano foi superado por quatro a três em tomadas de tempo. Considerando apenas as provas em que o australiano competiu, a pontuação no campeonato ficou em 14×6 para Tsunoda.

Em 2024, em 18 provas juntos, o japonês largou na frente em 12 e possui 22 pontos contra 12 de Ricciardo. O que mostra que em geral, houve um domínio de um dos lados da garagem durante a parceria.

Esses números só pioraram um cenário que já não era dos melhores. O australiano chegou à equipe, a princípio, como terceiro piloto da Red Bull, após ser demitido da McLaren por falta de desempenho um ano antes do encerramento de seu contrato.

Últimos momentos de Ricciardo na RB não foram fáceis
Últimos momentos de Ricciardo na RB não foram fáceis (Fotos Daniel Kolodin / Red Bull Content)

Ele entrou na vaga da RB como uma espécie de chance para mostrar que poderia um dia retornar ao time principal da empresa. Só que acabou ocupando espaço de uma promessa do programa de pilotos do time que vinha pedindo passagem, Lawson.

Aos 35 anos, Ricciardo seguiu longe do que precisava para justificar sua manutenção na RB, equipe que tem como propósito básico a maturação de novos talentos ligados à Red Bull.

Sendo assim, ele perde seu lugar na F1 deixando um sentimento de que não cumpriu as expectativas que foram criadas ao seu em torno nos primeiros momentos de sua oscilante carreira.

A revelação Ricciardo

Ricciardo é filho de um italiano com uma australiana de família originária da Itália. Ele nasceu na cidade de Perth, sudoeste da Austrália, em julho de 1989.

Após competições no kart e algumas categorias de fórmulas em seu país natal e na Ásia, ele começou sua carreira na Europa em 2007. No ano seguinte, terminou em segundo na F-Renault Europeia (atrás de Valtteri Bottas) e como campeão da F-Renault Ocidental.

Foi neste momento em que ele foi recrutado para o programa de formação da Red Bull, que naquele momento começava a demonstrar seus primeiros frutos com a revelação de Sebastian Vettel na F1.

Com apoio da empresa de energéticos, ele se sagrou campeão com sobras da F3 Britânica, que em 2009 ainda era considerada um passo importante para a maioria dos pilotos da base da F1.

Nos dois anos seguintes, ele competiu na F-Renault 3.5, que na época era uma concorrente da GP2 (atual F2) e que chegou até atrair mais atenção do que a categoria da escada oficial da F1. Ricciardo foi vice em 2010 (atrás de Mikhail Aleshin) e quinto em 11, mesmo sem participar de duas rodadas duplas do campeonato.

Neste meio tempo, a Red Bull também já começou a prepará-lo para o próximo passo de sua carreira. Assim, além de já colocá-lo em seus carros de F1 em testes, conseguiu ainda em 2011 a chance de promovê-lo para o Mundial através da pequena HRT, time que se arrastava no final do grid.

Ricciardo foi formado como grande promessa da Red Bull
Ricciardo foi formado como grande promessa da Red Bull (Foto: Rudy Carezzevoli/Getty Images)

Ricciardo participou de 11 etapas pela equipe espanhola. Ele teve como companheiro o italiano Vitantonio Liuzzi, com a exceção do GP da Índia, em que teve seu parceiro foi o local Narain Karthikeyan. Ele superou seus rivais internos (bem mais experientes) em seis classificações, o que deixou uma boa impressão.

Assim, em 2012, quando a Red Bull renovou a formação da Toro Rosso (atual RB), ele e o francês Jean-Éric Vergne foram os escolhidos.

Crescimento na F1 e vitórias

A briga na Toro Rosso entre Ricciardo e Vergne foi sempre muito intensa e apertada. O australiano mostrou em geral um ritmo de classificação melhor, batendo o companheiro francês em tomadas de tempo por 15 a 5 em 2012 e 15 a 4 em 13.

Em corrida, Vergne se mostrava mais próximo. Ele ficou à frente de Ricciardo no campeonato de 2012 (16 pontos a 10), mas foi derrotado no ano seguinte (20 a 13).

Com esses resultados, diante da aposentadoria de Mark Webber ao final de 2013, a Red Bull escolheu Ricciardo para ser promovido ao seu time principal como companheiro do então tetracampeão Vettel.

A mudança aconteceu em um momento importante, pois a F1 passava por uma enorme alteração de seu regulamento, que além cortar boa parte da pressão aerodinâmica dos carros (ponto forte da Red Bull) ainda obrigava os times a utilizarem unidades de potência híbridas.

Desta forma, Ricciardo chegou ao seu primeiro time de ponta do Mundial no início de uma nova era. E a impressão inicial não poderia ser melhor. Ele venceu suas três primeiras corridas na F1 e foi o único piloto fora da dupla da Mercedes (dominadora da temporada) a subir no ponto mais alto do pódio.

Em suas vitórias, Ricciardo apresentou o shoey à F1, ao beber champanhe da vitória em sua sapatilha (Foto: Ricciardo foi formado como grande promessa da Red Bull)

O australiano terminou o campeonato na terceira posição (atrás apenas dos pilotos da Mercedes) com 238 pontos, 71 à frente de Vettel. Ele ainda largou na frente do alemão em 10 dos 19 GPs da temporada, o que configurou uma vitória total sobre o parceiro.

O resultado deu força para Ricciardo e o alçou como um piloto de potencial na categoria. Porém, ele logo entraria em uma fase de muitos altos e baixos combinados a decisões difíceis que marcariam sua carreira para sempre.

Oscilações e decisões difíceis de Ricciardo

Em 2015, Vettel deixou a Red Bull para se juntar à Ferrari. A Red Bull promoveu então o promissor Daniil Kvyat para ser companheiro de Ricciardo.

Em uma temporada bastante complicada para a Red Bull, o time terminou apenas na quarta posição no campeonato de construtores, atrás de Mercedes, Ferrari e Williams. Era o pior resultado do time em seis anos. Ricciardo superou Kvyat em classificações (11×8), mas acabou atrás na pontuação final (95×92).

Ricciardo voltou um pouco mais consistente em 2015, iniciando a temporada com três quartos lugares. Kvyat, no entanto, se envolveu em algumas confusões e acabou sacado do time após a quarta etapa. Para seu lugar, a Red Bull promoveu o jovem Max Verstappen, que vinha em forte ascensão na Toro Rosso.

A partir deste momento, o australiano experimentou uma briga bastante intensa com o holandês, nove anos mais novo. Verstappen já emplacou uma vitória em sua primeira corrida pelo time principal da empresa, mostrando que não vinha para brincadeira.

Mas Ricciardo reagiu bem à ameaça e fez uma temporada mais consistente. Ele conquistou a única pole da temporada que não ficou com os pilotos da Mercedes e também venceu uma corrida.

Além disse, subiu ao pódio oito vezes contra sete de Verstappen. No período em que correram juntos em 2016, ele bateu o companheiro por 11 a 6 em classificações e marcou 344 pontos contra 191.

Em 2017, Ricciardo voltou a bater o promissor companheiro no campeonato (200×168) principalmente pela maior consistência. Apesar de duas vitórias contra uma para Verstappen, o australiano subiu ao pódio em nove etapas contra quatro do holandês.

Mesmo assim, a parceria parecia apresentar problemas. Ricciardo se sentia desprestigiado em vários momentos pela equipe, que realmente considerava Verstappen uma grande estrela do futuro.

Um momento importante desta disputa interna aconteceu no GP do Azerbaijão de 2018. Os dois pilotos bateram em uma briga na reta principal e saíram acusando um ao outro. Ricciardo não gostou da forma como a Red Bull lidou com a situação.

Diante do cenário, ele resolveu aceitar uma proposta da Renault para se transferir à equipe da montadora francesa em 2019, mesmo que deixando por um momento de estar em um time que brigava por vitórias.

Ricciardo acreditou na ideia de se tornar protagonista de um grande projeto. Mas as coisas não andaram bem. Foram duas temporadas de pouca evolução e resultados. O australiano até conseguiu dois pódios inesperados, já na reta final do acordo, em 21.

Sem acreditar na evolução da Renault, ele resolveu aceitar uma nova proposta de transferência para a McLaren, que vinha se reestruturando para tentar voltar a ser uma equipe de ponta.

Na nova equipe, Ricciardo viveu seu último momento de glória, ao vencer o GP da Itália de 2021. Porém, o resultado foi uma grande exceção. Em dois anos na McLaren, o australiano foi totalmente dominado por Lando Norris.

Apesar de vitória em 2021, passagem de Ricciardo pela McLaren foi bastante difícil (Foto: Steven Tee/McLaren)

Na primeira temporada da parceria, ele marcou 115 pontos contra 160 do companheiro e o foi batido em classificações por 14 a 8. Em 2022, a diferença aumentou ainda mais, com 122 a 37 no campeonato e 19 a 3 em posições de grid.

Ricciardo ainda tinha contrato com a McLaren para mais uma temporada, mas a equipe decidiu encerrar o vínculo de forma antecipada, pagando inclusive uma multa. Para seu lugar, trouxe o novato Oscar Piastri, após uma intensa luta com a Alpine pelo contrato do jovem australiano.

A última dança de Ricciardo

Sem vaga no grid e resultados claudicantes (para se dizer o mínimo) nas temporadas anteriores, Ricciardo flertou com a aposentadoria ao final de 2022. Mas seu bom relacionamento com os chefes da Red Bull lhe abriu uma pequena porta que manteve a chama acesa.

Ricciardo aceitou o papel de piloto reserva do time, que mantinha Verstappen e Sergio Pérez como titulares. Mais do que qualquer coisa, o australiano ficou em uma posição de marketing, participando de muitas ações com patrocinadores e fãs.

Na metade da temporada, porém, o fraco desempenho do novato Nyck de Vries na RB (antiga Toro Rosso), time B do grupo, abriu a possibilidade para Ricciardo voltar a competir, mesmo longe da situação de ideal de ter um carro competitivo. Aos 33 anos, ele retornava ao time de formação da Red Bull.

Muitos acreditavam que a ideia era colocar um nome de peso na RB para pressionar Pérez, que também não vinha fazendo um bom trabalho na Red Bull. Só que as coisas, mais uma vez, não foram bem.

Em suas duas primeiras participações, Ricciardo até ficou no 1 a 1 com o companheiro Yuki Tsunoda em posições de grid. Mas o australiano machucou a mão em um treino no GP da Holanda, e acabou ficando fora por cinco etapas, substituído por Liam Lawson. O novato fez um bom trabalho considerando a falta de experiência, incluindo um resultado na zona de pontuação.

De qualquer forma, Ricciardo voltou, teve um grande momento no México, em que terminou na quarta posição. Mas no geral, a situação durante o período de 2023 e 24 em relação a Tsunoda foi de vantagem com alguma margem para o japonês.  

Como Ricciardo passou a ser considerado carta fora do baralho para o time principal do grupo, a Red Bull resolveu fazer a substituição do piloto por Lawson, pensando no futuro.

O piloto ainda não anunciou quais são seus planos, mas pelo menos para 2025, a chance de retornar ao grid da F1 parecem remotas. Caso essa seja uma despedida permanente, Ricciardo encerra uma carreira com oito vitórias, 32 pódios e três pole positions.

É inegável que são bons números na F1, mas que deixam uma sensação de a carreira do carismático e querido piloto australiano poderia ter sido melhor.

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