Em três de agosto de 2018, Daniel Ricciardo surpreendeu muita gente ao anunciar que estava deixando a Red Bull, empresa que tinha patrocinado toda sua carreira da F3 até a F1 e pela qual ele tinha conquistado suas sete vitórias na F1 até então, para correr pela Renault a partir de 2019.

A troca acabou também se tornando um dos primeiros grandes dramas explorados pela popular série Drive to Survive (Dirigir para Vivier, em português) da Netflix. Na época, a produção não tinha acesso a Mercedes e Ferrari e, assim, a relação de Ricciardo com o companheiro Max Verstappen e a equipe Red Bull acabou se tornando um dos grandes focos.

Ricciardo estava enfrentando problemas em dividir a equipe com o holandês, uma estrela ascendente na F1, o que inclusive resultou em acidentes dentro da pista entre os dois. Vendo seu espaço diminuir dentro do time, ele resolveu apostar em deixar uma equipe que, se ainda não estava no ponto de hoje de dominância, ainda conseguia brigar por vitórias e pódios.

Do outro lado, estava a Renault, time que ainda não tinha emplacado um bom momento desde o retorno da montadora à F1 em 2016, mas que apostava em um projeto de longo prazo, focado principalmente na mudança de regulamento que estava prevista para 2021 (e que acabou acontecendo em 22 por conta da pandemia).

Aliás, outro interessante foco daquela primeira temporada de Drive to Survive foi o embate entre o chefe da Red Bull, Christian Horner, extramente descontente com os motores da montadora francesa, e o chefe da Renault, Cyril Abiteboul. O time austríaco, inclusive, resolveu deixar a parceria de longa data com os franceses e apostar na Honda a partir de 2019.

Em uma das cenas flagradas pela produção da série da Netflix, os dois dirigentes se provocaram pouco antes de uma entrevista coletiva alguns dias depois do anúncio de Ricciardo na Renault. Na época, a Red Bull já tinha anunciado que não permaneceria com a Renault, mas ainda não tinha acertado com outra fornecedora para 2019. Abiteboul então aproveitou para cutucar o rival.

“Ele precisa de um carro e de um motor”, disse o francês, dando risadas. Horner então retrucou reforçando as críticas ao motor da Renault: “Você tem dinheiro para gastar com o motor agora que está gastando tudo com piloto?”. E Cyril praticamente encerrou a conversa com “temos dinheiro suficiente”.

Só que a passagem de Ricciardo pela Renault acabou sendo bastante frustrante para o australiano. O time não se desenvolveu como esperado e ficou na quinta posição do campeonato de construtores tanto em 2019 quanto em 20, pior do que tinha feito em 18.

Assim, a parceria durou apenas os dois anos, com o piloto anunciando que estava partindo para a McLaren ainda no início da última temporada do contrato, em maio de 2020, algo que incomodou bastante Abiteboul.

Os melhores resultados dele pelo time, inclusive, foram depois do anúncio do divórcio, com os terceiros lugares nos GPs de Eifel e Emília Romanha. Os pódios fizeram Ricciardo vencer uma aposta de poder escolher o desenho de uma tatuagem em Abiteboul. Com a relação ainda abalada, demorou alguns meses, mas o francês cumpriu o combinado.

Tentativa de renascimento na McLaren foi fracasso de Ricciardo

Ricciardo apostou que a McLaren era a nova equipe em ascensão no grid, ainda mais com o novo acordo de motores com a Mercedes, e que poderia se tornar o líder de um novo momento do time na F1. A parceria não poderia ter dado mais errado.

O ponto alto acabou sendo a vitória de Ricciardo no GP da Itália, a primeira da McLaren em nove anos. Para melhorar aquele domingo do time, Lando Norris ainda completou a dobradinha em segundo. Mas para o australiano, o resultado foi um ponto fora da curva.

Enquanto Norris pontuou em 20 das 22 corridas da temporada de 2021, Ricciardo ficou oito etapas fora da zona de pontuação. No final do ano, o resultado foi de 160 a 115 para o inglês. Em classificações, Norris venceu por 14 a 8.

A princípio, falou-se muito em uma dificuldade de Ricciardo com as características do carro da McLaren que demandariam algum tempo para sua adaptação. Só que o começo da temporada de 2022 foi ainda pior e a distância para Norris até aumentou.

Após as 10 primeiras etapas, o placar era de 58 pontos a 13 para o inglês. Ricciardo tinha terminado apenas três etapas dentro da zona de pontuação contra sete do companheiro de equipe. Pouco depois disso, a McLaren anunciou que estava rompendo seu contrato com o Ricciardo para 2023 e assinando com o novato Oscar Piastri.

Ricciardo ficava sem vaga para a temporada seguinte e em uma situação bastante complicada para seguir na F1. Rumores de uma possível transferência para a Indy chegaram a surgir, mas ele insistia que ainda se via na categoria. Foi quando uma velha conhecida surgiu com uma proposta inusitada para ambos os lados.

O retorno de Ricciardo à família Red Bull

Sem chances de estar no grid da F1 em 2023, Ricciardo aceitou a proposta da Red Bull para ser piloto de testes da equipe. Era um retorno meio que inesperado principalmente pela forma como deixou o time, cinco anos antes, mas uma demonstração do respeito que dirigentes da empresa de energéticos ainda nutriam por ele.

A posição, que na F1 atual serve de pouco pela impossibilidade de treinos fora dos finais de semana de GPs, acabou se tornando apenas uma forma dele seguir de no paddock. Ricciardo participou de diversas ações de marketing e para as redes sociais da Red Bull, mas ficava por aí.

Paralelamente, na segunda equipe do grupo, a AlphaTauri, o novato do time, Nyck de Vries estava passando dificuldades. Muitas. O fato dele não ter vindo do programa de formação da Red Bull não contribuía para ele também, já que era visto mais como uma aposta para tapar um buraco na academia júnior por conta de uma entressafra de talentos do que um projeto de longo prazo.

Para piorar, a AlphaTauri também entrou em uma forte crise com resultados bastante ruins. O time até já anunciou grandes mudanças para 2024 com a troca do comando pela primeira vez desde que a Red Bull tinha assumido o time em 2005, época em que ela passou a se chamar Toro Rosso (Red Bull em italiano).

Com um novato que nunca fez parte dos planos e um Yuki Tsunoda que ainda gera dúvidas, o time se viu sem parâmetros para saber exatamente onde está e de onde parte para 2024. Sendo assim, após esperar dez corridas, resolveu-se então mexer nas coisas.

Nesta terça-feira (11), a Red Bull anunciou que Ricciardo volta ao grid da F1 pela AlphaTauri no lugar de De Vries. O australiano será a nova referência da equipe e do desempenho do próprio Tsunoda. Para 2024, o time tem à espera Liam Lawson, terceiro colocado da F2 em 2022 aos 20 anos e que no momento é o segundo colocado da Super Fórmula japonesa, ainda na briga pelo título. O segundo semestre será uma fase de grandes avaliações para a AlphaTauri.

E Ricciardo, assim, retorna à equipe júnior do grupo pela qual competiu entre 2011 e 13. A situação para um piloto de 34 anos parece mais uma prova do total fracasso de sua decisão de deixar a Red Bull em 2018.

Para sorte dele, porém, a empresa resolveu lhe dar uma segunda chance. Algo que poucos pilotos conseguem na carreira na F1 em qualquer time. Se esta oportunidade pode significar algo mais, como uma possível nova promoção ao time principal, é difícil saber. Resultados tanto dele quanto de Sergio Pérez neste segundo semestre devem falar alto.

Situação de Nyck de Vries

Campeão da F2 de 2019, em uma temporada de reconhecida entressafra de talentos na categoria, em que teve como vice Nicholas Latifi e terceiro Luca Ghiotto, Nyck de Vries, que também foi campeão da Fórmula E pela Mercedes em 2020, provavelmente não acreditava mais que teria uma chance na F1.

Sua estreia aconteceu mais por uma obra do acaso. Piloto de testes da Mercedes, ele substituiu um doente Alex Albon na Williams no GP da Itália de 2022. E ele foi bem, classificando o carro em oitavo, terminando a corrida em nono e marcando dois pontos no campeonato.

O desempenho empolgou alguns dirigentes com o piloto de 27 anos. E a chance veio de onde menos se esperava. Piloto da Mercedes, ele recebeu a proposta para se juntar ao grupo Red Bull na AlphaTauri, muito por conta da falta de opções no programa de jovens da empresa.

Só que os resultados não vieram. Muito pelas deficiências do carro, é verdade, mas também na comparação com Tsunoda, que foi amplamente dominado por Pierre Gasly nas duas temporadas anteriores. Ele perde por seis a quatro em classificações para o japonê e oito a dois em corrida. Além disso, se envolveu em diversos acidentes.

Considerando toda a situação, apesar de uma demissão no meio de uma temporada ser sempre uma situação bastante desagradável, o cenário para o holandês nunca foi confortável. Ele não teve total confiança dos dirigentes da Red Bull desde a época de sua contratação e era visto como uma total aposta.

Não cumprindo o mínimo exigido e com outras opções batendo à porta, é difícil argumentar com a decisão da Red Bull, que precisa priorizar seu plano de longo de prazo. Pelo menos, De Vries teve a chance que parecia que não teria mais na carreira. Agora, deve seguir sua trajetória em ouras pistas.