
Stefan GP: o sonho sérvio que surgiu dos restos da Toyota na F1
Se você é daqueles que já acompanham a F1 há mais tempo, já deve ter ouvido falar de vários planos ambiciosos para a criação de novas equipes para o Mundial. Um destes planos durou por um longo período, e até esteve perto de chegar lá: a Stefan GP.
A equipe sérvia queria ingressar no Mundial com um carro que era tido como promissor, e trazendo de volta da aposentadoria um antigo campeão do mundo. Mas entre planos fracassados e conflitos nos bastidores, a Stefan GP não chegou a sair do papel.
Toda a ideia gira em torno da figura de Zoran Stefanovic. Ex-piloto e empresário com base em Belgrado, na Sérvia, ele tinha um sonho de estabelecer uma equipe de seu país no cenário internacional da F1.
Na altura, a única presença da categoria no Leste Europeu era por meio do GP da Hungria, mas Stefanovic queria fincar sua bandeira com uma escuderia, e este objetivo foi perseguido por muito tempo.
Os primeiros planos começaram a ser desenhados em meados dos anos 90, inicialmente com a intenção de ingressar no Mundial em 1997. Mas ele ainda não havia conseguido acumular o orçamento necessário para a ideia avançar.
Meses mais tarde, com a falência da Mastercard Lola após apenas uma corrida, em história que já contamos por aqui, Stefanovic planejou adquirir os chassis do time, e usá-los como ponto de partida para criar o seu novo projeto a partir de 98.
Mas, ainda com finanças insuficientes, e ainda por cima com um carro que estava longe de ser minimamente competitivo, de novo o plano foi abortado, e ficou por um bom tempo adormecido.
A segunda tentativa da Stefan GP
Mais de uma década depois do primeiro projeto, uma nova possibilidade surgiu no horizonte. Em 2009, a F1 lançou um processo seletivo, na intenção de promover a entrada de três novas equipes a partir de 2010.
Stefanovic participou desta concorrência – no entanto, os times selecionados foram Campos Meta, Manor e USF1. O processo fez Stefanovic registrar uma queixa formal perante a Comissão Europeia.
O seu argumento era de que a FIA priorizou as equipes que tinham parceria com a Cosworth, uma fornecedora defendida por Max Mosley, e que retornaria ao grid justamente em 2010. Isso, na ótica de Stefanovic, feria as Leis de Competição da Comissão Europeia, mas foi algo que não foi para frente.
O projeto Stefan GP – Toyota
No entanto, ele continuou atento para caso uma nova janela de oportunidade surgisse. E isso aconteceu nos últimos meses do ano de 2009. No dia 4 de novembro, três dias após o término da temporada, a Toyota anunciou que deixaria a F1 em efeito imediato devido à crise econômica global.
Assim, o empresário sérvio comprou os equipamentos da equipe de F1 que pertenciam aos japoneses. Isso incluía o novo carro que já estava construído, o TF110, e o motor V8 da Toyota. A nova operação, batizada de Stefan GP, planejava competir na F1 já em 2010, contando com cerca de 180 funcionários próprios, além de outros membros da Toyota que dariam suporte técnico.
Entre os novos membros da Stefan GP estavam dois antigos funcionários da McLaren, que deixaram a equipe inglesa em episódios polêmicos: Mike Coughlan, afastado da F1 desde o escândalo de espionagem de 2007, e Dave Ryan, desempregado desde 2009 depois do escândalo da mentira.
O novo time contaria com uma base na Sérvia e outra na Alemanha, usando uma área do local onde a Toyota conduzia as suas operações. A estrutura já estava inteiramente montada, então a nova equipe dizia até ter a capacidade imediata para competir na pista. Em todos estes anos, nunca a Stefan GP esteve tão perto de realizar o sonho de chegar à F1.
Quanto aos pilotos, a Stefan fez algo incomum e revelou em seu site a identidade de 12 pilotos com quem havia iniciado conversas – e os nomes iam desde a lenda do rali, Sébastien Loeb, passando por Ralf Schumacher, e indo até o relativamente desconhecido Alexandros Margaritis.
Porém, quem mais ganhou força foram Kazuki Nakajima, piloto ligado à Toyota, e Jacques Villeneuve, campeão mundial de 97, e que estava afastado da categoria desde 2006. Já o favorito a ser o piloto reserva era o jovem Pastor Maldonado.
Mas, em meio a toda a empolgação, havia um problema básico. A Stefan GP tinha comprado apenas os equipamentos que pertenciam à Toyota, e isso não incluía a inscrição da fabricante japonesa no Mundial de 2010. Ou seja, a Stefan sequer tinha uma vaga confirmada no grid.
Os próprios sérvios diziam que o seu plano A era competir já em 2010, mas, se isso não acontecesse, o seu plano B era entrar só no ano seguinte, e usar 2010 para fazer vários testes em pista, já que o time não estaria sujeito às restrições de regulamento do Pacto de Concórdia.
Mas o empecilho para a Stefan GP competir em 2010 merece uma explicação mais detalhada. As 13 vagas disponíveis para o campeonato já estavam preenchidas, mas ainda havia muita incerteza pairando pelo ar.
Primeiro, a BMW havia saído de cena, e por um tempo ainda não se sabia se o time teria alguma continuidade na F1. Assim, sua vaga foi dada à novata Lotus, o que deixava a BMW, ou o time que surgiria a partir dela, numa espécie de banco de reservas.
Em novembro, quando a Toyota saiu da F1, Peter Sauber adquiriu de volta a sua antiga equipe, e ficou ele com a vaga que estava em aberto. Só que ainda havia sérias incertezas rondando duas das escuderias novatas, a Campos Meta e a USF1.
Então, a Stefan GP quis manter os seus planos funcionando em pleno vapor, justamente para provar para todos, principalmente para a FIA, que estava pronta para competir.
Entre as suas ações, estavam o anúncio de que enviaria um contêiner com seus equipamentos ao Bahrein para a primeira corrida do ano, e outro para a Malásia, para a terceira etapa. Este material seria suficiente para cobrir os quatro primeiros GPs de 2010,
Em sua base de competições, em Colônia, a Stefan GP ligou o seu carro pela primeira vez. O modelo S-01 estava montado, pintado inteiramente de vermelho, e usando o motor Stefan RG-01, nada mais do que o V8 da Toyota rebatizado,
Além disso, a equipe garantiu que realizaria testes em Portimão, em Portugal, no final de fevereiro. Mas havia uma questão: a Bridgestone, na época a fornecedora de pneus da F1, era contratualmente obrigada a ceder os seus compostos apenas aos participantes do Mundial, o que não incluía a Stefan GP.
A equipe sérvia, então, tentou obter pneus da GP2 com a Bridgestone, o que também não foi possível. Sem conseguir uma alternativa segura, o teste foi cancelado.
Mas os contratempos não abalavam a Stefan GP. Ela estava de olho nos problemas da USF1, que estava confirmada para o Mundial de 2010. Stefanovic chegou a ser abordado por Chad Hurley, co-fundador do YouTube e que estava envolvido com a USF1, a respeito de uma possível fusão entre as duas operações.
Mas, de acordo com o sérvio, as conversas fracassaram devido a “pessoas que sabotaram as negociações”, referindo-se a Ken Anderson e Peter Windsor, que lideravam a USF1. Aliás, Stefanovic dizia que os “sonhadores americanos teriam de se explicar” caso eles não conseguissem alinhar no grid, e impedissem que a Stefan tivesse uma chance.
E foi exatamente o que aconteceu. No dia 4 de março, apenas 10 dias antes do primeiro GP de 2010, a FIA confirmou a sua lista final de participantes para o Mundial sem a USF1, que havia falido, e nem com a Stefan GP.
A entidade considerou que não era possível arrumar um substituto para os americanos tão em cima da hora, e confirmou que abriria um novo processo seletivo para 2011. Foi uma ducha de água fria. Sem expectativas imediatas de competir, a Stefan encerrou a parceria técnica com a Toyota.
Nova tentativa e fim do sonho
Stefanovic não mostrava qualquer chance de desistir de seu sonho e anunciou não só que iria concorrer no novo processo seletivo para 2011, como também iria construir um complexo aos arredores de Belgrado, com uma uma pista com os padrões de F1, e nova sede da Stefan GP. A proposta era criar uma espécie de “Maranello sérvia”, reproduzindo o conceito estabelecido pela Ferrari.
Mas não deu muito certo. Em setembro de 2010, a reunião do Conselho Mundial da FIA revelou que houve vários interessados na 13ª vaga do grid, mas que nenhum dos candidatos atingiu os pré-requisitos para entrar na F1, então a seleção não iria avançar.
Foi o fim da maior oportunidade da Stefan de um dia se materializar. Stefanovic voltou a sondar a chance de criar uma equipe em meados dos anos 2010, na mesma época em que a Haas foi aceita para a temporada de 2016. No entanto, a Stefan GP nunca passou de um sonho, que acabou antes mesmo da chance de virar realidade.
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