Hamilton e Verstappen brigam pela vitória no GP da França de 2021
(Foto: Mark Sutton / LAT / Pirelli)

Erros e acertos: o jogo estratégico de Red Bull e Mercedes na França

O GP da França do último domingo (21) acabou sendo decidido por uma série de detalhes e decisões de Red Bull e Mercedes, além da capacidade de seus principais pilotos, Max Verstappen e Lewis Hamilton, de colocarem em prática suas estratégias com equipamento que tinham mãos em determinados momentos da prova.

Desta forma, a corrida em Paul Ricard se tornou uma disputa bastante acirrada e complexa, com a necessidade de decisões rápidas, precisas e de boa execução, sem muita margem para erros. Diante deste cenário, a Red Bull e Verstappen saíram vitoriosos, pois souberam jogar bem a partida de xadrez.

Além de uma leitura ágil e precisa da prova, a participação direta de Sergio Pérez foi importante também para colocar a Mercedes em uma posição de muita dúvida sobre o caminho a seguir. E, claro, é impossível não observar a continuidade da evolução do modelo RB16B-Honda e a escolha de acerto por parte da equipe austríaca, que deu uma vantagem enorme para os pilotos do time nas retas da França.

O conjunto da obra foi um pacote muito forte que colocou os dois pilotos no pódio e valeu não só ampliação da vantagem de Verstappen no campeonato para 12 pontos, como no de construtores para a Mercedes para 37 após sete etapas.

A primeira rodada de pits na França

Com o erro na largada de Verstappen, a corrida teve um primeiro trecho do GP da França com Hamilton liderando, seguido pelo holandês, Valtteri Bottas e Pérez, respectivamente.

Nas primeiras cinco voltas, Verstappen até parecia conseguir acompanhar o rival, mas, aos poucos, Hamilton foi se impondo e abrindo vantagem. Na 15ª volta, essa margem do inglês chegou a três segundos, o que parecia que o deixava em uma situação confortável para, em mais algumas voltas, fazer sua parada única de troca de pneus com tranquilidade.

Só que a situação era um pouco mais complexa do que talvez a Mercedes percebeu. No comunicado à imprensa no sábado depois da classificação, a Pirelli apontou que “com todos os 10 primeiros [do grid] escolhendo largar com o pneu médio, a estratégia de uma parada trocando [compostos] médios pelos duros é a mais lógica para eles”. A sugestão era de fazer o pit entre as voltas 18 e 25 com os médios para depois ir até o final com os duros.

Só que existiu um adendo importante nessa análise da Pirelli: “No entanto, existe uma pequena chance de que chova na manhã da corrida, e, mesmo que a chuva não persista até a corrida, o asfalto molhado de manhã pode afetar a estratégia.” E isso realmente aconteceu. A chuva lavou o asfalto, ainda mais com a prova da F3 acontecendo com o asfalto molhado.

Pilotos da F3 enfrentam pista molhada na manhã de domingo na França antes da F1
Pilotos da F3 enfrentam pista molhada na manhã de domingo na França antes da F1 (Foto: Dutch Photo Agency)

Combinado com uma temperatura mais baixa que nos dias anteriores de treinos, um vento mais forte, essa condição fez com que os carros escorregassem mais durante o primeiro trecho da corrida e desgastassem mais seus pneus. Charles Leclerc, da Ferrari, abriu a janela de paradas já na volta 14. Bottas, reclamando muito dos compostos, então, precisou parar na volta 17.

E essa parada do finlandês desencadeou uma sequência de decisões. Como Hamilton estava mais confortável que o companheiro com seus pneus (ele mesmo respondeu no rádio “o ritmo está bom” neste momento da prova), a Mercedes achou melhor seguir com o inglês por mais algumas voltas para tentar parar tarde e assim garantir que os compostos duros do segundo trecho chegassem até o final tranquilamente. Parte desta confiança de manter o inglês na pista se deu pelo fato que neste momento, a vantagem dele para Verstappen já estava em três segundos.

Só que para se defender de Bottas, a Red Bull não pestanejou e chamou Verstappen logo em seguida. O holandês fez uma volta de entrada no pit muito boa, em 1min58s099, mais de um segundo mais rápida que a de Bottas. Além disso, dentro do pit lane, o tempo total dele foi de 29s803 contra 30s572 do finlandês. Esse bom desempenho fez com que Verstappen conseguisse retornar à frente, mesmo parando uma volta depois.

A Mercedes, então, precisou reagir em relação à parada de Verstappen. Se seguisse o seu plano original de continuar na pista, a chance de Hamilton perder a liderança para o segundo trecho era muito alta. Por isso, o time, que a princípio resolveu não chamar o inglês logo depois de Bottas, mandou ele ir para o pit na volta 19, uma depois de Verstappen.

A volta de Hamilton de entrada para o box foi em 1min58s684, meio segundo pior que Verstappen. Dentro do pit lane, mesmo tendo uma parada mais rápida, o piloto da Mercedes perdeu 30s263. Ou seja, quase aquele meio segundo inteiro da volta de entrada no box. Somente isso não justifica a perda da liderança, já que Hamilton estava três segundos à frente antes da parada e voltou logo atrás de Verstappen, mas já contribuiu.

O problema foi que a Mercedes subestimou em Paul Ricard um pouco o poder do undercut [quando um piloto para uma volta antes para retornar com pneus mais novos e tomar a posição do rival à frente na estratégia], talvez imaginando que a primeira volta dos compostos duros não seria tão forte.

Na volta “a mais” que Hamilton andou antes da parada, ele virou a segunda parcial em 29s447 contra 29s066 de Verstappen (já perdeu 0s4 aqui). Depois ele seguiu para o pit enquanto o holandês fazia o melhor terceiro setor da prova em 42s856. Como não é possível pegar o terceiro trecho dessa volta de Hamilton porque ele foi para o pit, podemos pegar como referência o terceiro setor do inglês na volta anterior, de 44s226. Ou seja, se ele repetiu o desempenho, perdeu em torno de 1s4 apenas nesta parte final da pista.

Parciais dos quatro primeiros colocados nas voltas 18 e 19 (Reprodução/Cronometragem F1)

Resultado, com a volta com pneus novos de Verstappen enquanto Hamilton tinha um desempenho pior com os compostos desgastados, mais a diferença entre os dois no trecho de pit lane, o que inclui aproximação, desaceleração e reaceleração, a margem do inglês na ponta, que parecia que confortável, evaporou.

A decisão por dois pits e o fator Pérez

No segundo trecho da corrida, a Mercedes mostrou, como já aconteceu em outros momentos da temporada, que com pneus duros ela é muito forte. Hamilton e Bottas pareciam empurrar Verstappen, que aproveitava a velocidade de reta bem superior a dos rivais para não sofrer ataques, mesmo nas zonas de asa móvel.

O holandês logo notou que em algum momento, quando os pneus começassem a sofrer desgaste, ele poderia sofrer um ataque de Hamilton. A Red Bull começou a analisar o horizonte. Primeiro, pelo aumento de desgaste por conta da pista “lavada” pela chuva da manhã e o pit stop um pouco mais cedo que o programado, os pneus duros talvez não chegariam em uma condição tão boa ao final da prova.

Além disso, o time austríaco posicionou sua outra peça no tabuleiro. Enquanto os três primeiros pararam, Sergio Pérez seguiu na pista e alongou seu primeiro trecho de corrida, parando para a troca dos médios pelos compostos duros apenas na 24ª volta, que era quando a Mercedes imaginava originalmente parar Hamilton.

Desta forma, a equipe austríaca praticamente garantiu que teria o mexicano em melhores condições na segunda metade da corrida, mesmo tendo perdido um bom tempo na pista com os médios. O mais importante, no entanto, é que ele passava a ficar a menos de 19 segundos de Hamilton, sempre diminuindo a desvantagem por ter compostos mais novos. Isso foi fundamental para a tática da Red Bull porque praticamente bloqueava a chance de uma segunda parada de Hamilton. Voltar atrás de Pérez, significava ter que brigar com ele, levando em conta a velocidade de reta superior da Red Bull e um pneu, em um primeiro momento, não tão desgastado.

Na volta 32, Verstappen partiu para a sua segunda parada e colocou mais um jogo de pneus médios. Ele retornou 18 segundos atrás de Hamilton e rapidamente começou a diminuir a desvantagem. De cara, deixava de fazer sentido a Mercedes realizar um novo pit para o inglês neste momento, pois ele retornaria atrás do adversário, em condições de pneus parecidas, e sem muita chance de ultrapassagem por conta da velocidade de reta da Red Bull.

Por isso, o time alemão ficou praticamente sem escolha neste momento a não ser manter os dois pilotos na pista. Mesmo com as reclamações de Bottas, era importante ele permanecer também para servir como uma espécie de chicane para Verstappen. Na simulação da Mercedes, o holandês chegaria em Hamilton nas últimas três voltas. Se o finlandês conseguisse o retardar um pouco – o que passou longe de conseguir -, talvez o inglês teria uma chance de permanecer à frente.

Como vimos, não foi o que aconteceu e Verstappen conseguiu a ultrapassagem na penúltima volta, de uma forma em que Hamilton pouco poderia fazer para se defender. Bottas ainda perdeu a terceira posição para Pérez, mostrando que a Red Bull teve uma visão de prova, desde o começo, muito melhor que a Mercedes.

Mas afinal, o que a Mercedes poderia ter feito para vencer na França?

Um dia depois da corrida, as análises sobre o GP da França ainda voam. Afinal, é fácil ser “engenheiro de obra pronta”, certo? A princípio, é difícil não apontar como a Mercedes não viu que poderia tomar o undercut na primeira parada. Se Hamilton mantivesse a liderança naquele momento, a prova poderia apresentar outras opções, com a chance do inglês abrir mais vantagem na frente com os pneus duros, com os quais a Mercedes ainda se mostra mais forte.

Hamilton, segundo colocado, observa celebração de Verstappen no GP da França de 2021 (Foto: Drew Gibson / LAT / Red Bull Content)

No entanto, podemos apontar que o tempo perdido por Hamilton na entrada e saída de box pode ter sido essencial também na conta da Mercedes, que, convenhamos, já tinha ficado bem apertada.

No segundo trecho, o bom posicionamento de Pérez em quarto com pneus mais novos deixou as alternativas da Mercedes bem reduzidas. Pouco poderia ser feito com Hamilton. Talvez, a opção que poderia ter sido explorada era de parar Bottas perto da volta 30, antes de Verstappen, para tentar bloquear também a segunda parada do holandês e assim deixar ele e Hamilton no mano-a-mano com pneus duros.

Apesar de parecer uma maluquice, é bom destacar que Bottas realmente avisou próximo da metade da prova que ele acreditava que uma segunda parada poderia ser necessária. A equipe preferiu não ouvir o finlandês.

De novo: após a corrida, é sempre mais fácil visualizar essas opções. Mas o que fica do GP da França é que o campeonato está acirrado entre duas equipes diferentes como poucas vezes vimos na era híbrida. E os erros e acertos, por menores que sejam, podem pesar bastante no final da temporada.

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