Coisas sobre Imola que nem todo mundo lembra ou sabe
A F1 ficou 14 anos longe de Imola antes de voltar ao circuito italiano em 2020. A pista se tornou bastante tradicional na categoria entre os anos 80 e 2000, sendo inclusive palco de eventos marcantes para a história do Mundial. Só que com a entrada de cada vez mais GPs novos, a corrida, que já era a segunda na Itália apesar de receber o nome de GP de San Marino, perdeu espaço.
Provavelmente Imola nunca voltaria a receber a F1 ou pelo menos precisaria contar com algum problema de Monza. A crise do coronavírus de 2020, no entanto, abriu a possibilidade deste retorno, em uma situação em que a Itália recebe três GPs, com Mugello também entrando na programação.
Assim, esta tradicional pista, que para os mais jovens é algo muito longínquo e mesmo para os mais velhos talvez seja cercada de alguns mitos, tem a chance de se mostrar novamente para o mundo, inclusive em seu novo formato.
Para aproveitarmos esse retorno, resolvemos relembrar algumas histórias e fatos sobre Imola que são bastante interessantes e que nem todo mundo lembra ou até geram certa confusão.
Imola fica na Itália
Parece algo óbvio, mas vemos direto aqui no Projeto Motor comentários em nossos artigos, vídeos ou postagens nas redes sociais que fazemos sobre o circuito que mostram certa surpresa com a informação. O que mais gera confusão é o fato do evento em Imola ter ficado marcado na F1 sob o nome de GP de San Marino.
San Marino é uma pequena república independente de 61 km² encravada no meio da Itália. O país fica localizado 100 km ao sul de Imola. O circuito, cujo nome oficial é Autódromo Enzo e Dino Ferrari, é em território italiano, na região da Emília-Romanha, cuja principal cidade é Bolonha.
Esta parte da Itália é muito ligada ao setor automotivo e ao automobilismo em geral, com as sedes de empresas como Maserati, Lamborghini, Ducati e Ferrari. Por sinal, é um ótimo passeio para quem curte carros, já que todas essas companhias possuem museus próprios em suas bases que podem ser visitados.
A estreia de Imola no calendário da F1, inclusive, não foi sob o nome do GP de San Marino, mas como GP da Itália, em 1980, ano em que Monza precisou passar por uma ampla reforma para reforçar sua segurança e foi obrigado a abrir mão da prova. Foi a única vez que a corrida nacional italiana não foi realizada no autódromo da Lombardia.
Com o sucesso do evento, mas sem a possibilidade de voltar como GP da Itália, os proprietários de Imola entraram em acordo com o Automobile Club de San Marino que fez uma requisição na FIA para promover uma prova em Imola. Assim, nasceu o GP de San Marino.
Para 2020, precisando preencher seu calendário por conta dos cancelamentos decorrentes da pandemia, a F1 fez um acordo direto com os proprietários do circuito, que receberam apoio do governo da Emilia-Romanha para realizarem a corrida. Por isso, a corrida recebe o nome da região.
O circuito sofreu enormes mudanças com o tempo
Em sua primeira versão, entre 1953 e 72, Imola era um circuito bastante fluido e de alta velocidade, com nenhuma chicane. Com os anos, por conta de acidentes e da maior exigência por segurança, o traçado foi ganhando alguns pontos de freadas.
O primeiro deles foi a Variante Bassa, que em um primeiro momento contava com duas chicanes entre a Rivazza e a entrada da reta dos boxes. Depois, veio a Variante Alta, no setor intermediário. Isso tudo ainda nos anos 70, antes mesmo de receber a F1.
Com a chegada do Mundial, a Acque Minarale recebeu também uma chicane em 1981 e aí tivemos o desenho mais clássico de Imola por muitos anos. O primeiro setor da pista ainda tinha um ponto de alta velocidade, entre a reta dos boxes e a freada da Tosa, passando pela Tamburello e a Villeneuve, esta última que recebeu o nome após a morte do piloto canadense.
Depois dos acidentes fatais de Ayrton Senna e Roland Ratzenberger, além do forte acidente de Rubens Barrichello, em 1994, Imola passou por uma enorme reformulação e cortou praticamente todos seus pontos de alta. A Tamburello e a Villeneuve ganharam chicanes. A Variante Bassa e Acqua Minarele também ganharam novos desenhos.
O traçado permaneceu nesta nova configuração até a última prova da F1 no circuito, em 2006. E a verdade é que ultrapassagens em Imola se tornaram quase que impossíveis, levando em consideração ainda que a pista é relativamente estreita em comparação aos autódromos mais novos.
Dois anos depois, para tentar recuperar um pouco de suas antigas características e ao mesmo tempo manter seu novo padrão de segurança, Imola resolveu excluir a Variante Bassa. Desta forma, o circuito ganhou um enorme ponto de aceleração entre a Rivazza e a freada da Tamburello.
Em 2020, a F1 finalmente experimenta este novo desenho, com acionamento da asa móvel nas retas boxes para impulsionar as ultrapassagens neste ponto.
A verdadeira casa da Ferrari
Monza, claro, é a casa do GP da Itália e a Ferrari tem sempre o apoio de praticamente toda a torcida no local. Mas não só por ser na mesma região da sede da equipe, mas também por ter arquibancadas com a torcida muito mais próxima da pista, Imola se tornou com os anos o GP da Ferrari. Inclusive, o próprio nome oficial do circuito, Autódromo Enzo e Dino Ferrari, faz alusão à essa relação.
A vibração dos torcedores da escuderia sempre foi mais sentida no circuito e momentos marcantes para a equipe aconteceram por lá. Imola acabou criando com os anos um ambiente quase que de estádio de futebol pela Ferrari.
Um desses momentos, que sempre é lembrado como ícone da paixão do italiano pela Ferrari, foi a enorme festa dos espectadores com o acidente do local Riccardo Patrese, no GP de San Marino de 83, abrindo o caminho para a vitória do francês Patrick Tambay. Por quê? O italiano corria pela Brabham enquanto o rival era da Ferrari.
Com o tempo, a própria equipe incentivou essa relação, aproveitando a proximidade do circuito para realizar eventos e promoções com carros, pilotos e fãs.
Imola teve momentos marcantes além de 1994
O circuito se tornou, principalmente para o público brasileiro, sinônimo de tragédia, por conta da morte de Ayrton Senna e todos os acontecimentos daquele final de semana. Porém, Imola foi palco de diversos outros momentos importantes para a F1, dentro e fora da pista.
Embate entre Villeneuve e Pironi em 82
O GP de San Marino de 82 foi importante por questões tanto dentro quanto fora da pista. Por conta de uma briga entre Foca (Associação dos Construtores da F1) e a Fisa (então braço esportivo da FIA), diversas equipes boicotaram o GP.
Apenas 14 carros participaram da corrida. Neste cenário, as Renault até pareciam favoritas, porém, tanto Arnoux quanto Prost abandonaram com problemas. A briga pela vitória ficou exclusiva entre a dupla da Ferrari, Didier Pironi e Gilles Villeneuve. E foi brutal.
Os dois passaram quase que trinta voltas trocando ultrapassagens, até que veio a ordem via placa para que na última volta eles mantivessem suas posições, com Villeneuve à frente. Pironi, no entanto, ignorou o pedido dos boxes, ultrapassou o companheiro no giro final e levou a vitória.
O canadense não perdoou o parceiro, se mostrando bastante frustrado com a ação. Ele não teve, porém, a chance de uma resposta, já que morreu na corrida seguinte, em um acidente em Zolder, na Bélgica.
A loucura do combustível de 85
A corrida de Imola daquele ano foi marcante por dois grandes motivos. A começar, pela incrível batalha direta entre Senna, de Lotus, e Prost, de McLaren, por diversas voltas. O brasileiro fez um grande trabalho de defesa para segurar o francês, que tinha um carro superior, em um dos primeiros grandes momentos dos dois futuros rivais na pista.
Só que o que definiu a prova mesmo foram as últimas voltas. Prost começou a economizar combustível e ficou para trás, perdendo inclusive a segunda posição para Stefan Johansson, da Ferrari. Senna liderou até a volta 56 de 60, quando sofreu pane seca e abandonou.
Johansson chegou a assumir a ponta por alguns metros, mas também parou sem combustível. Prost voltou assim para a ponta. Atrás, Nelson Piquet, da Brabham, Martin Brundle, da Tyrrell, e Derek Warwick, da Renault, também ficaram pelo caminho com pane seca.
A prova se tornou mais uma questão de quem conseguiria levar o carro até a bandeira quadriculada. E Prost conseguiu, com Elio de Angelis, da Lotus, em segundo, e Thierry Boutsen, da Arrows, em terceiro. Prost e Boutsen não conseguiram retornar aos boxes e pararam seus carros pouco depois da linha de chegada.
Os três pilotos foram ao pódio, mas pouco depois, a McLaren do francês não passou na inspeção técnica por estar abaixo do peso mínimo e a vitória ficou com De Angelis.
A explosão da rivalidade entre Senna e Prost em 89
Depois de uma temporada com relacionamento controlado em 1988, a tensão na McLaren em 89 começou esquentar aos poucos entre Senna e Prost. A rivalidade entre eles explodiu mesmo no GP de San Marino daquele ano.
Como a McLaren tinha uma enorme vantagem técnica para os rivais, os dois companheiros fizeram um pacto de não ataque na primeira volta das corridas, quando os adversários ainda estavam muito próximos, para evitar divididas que colocassem vitórias da equipe em risco.
Senna saiu na pole e manteve a liderança, só que na quarta volta, Gerhard Berger sofreu um grave acidente da Tamburello, em que sua Ferrari chegou a pegar fogo. O piloto recebeu atendimento no local e depois foi levado para o hospital, e a prova precisou ser paralisada com bandeira vermelha.
Na relargada, Prost conseguiu tomar a liderança de Senna no pulo inicial. O brasileiro, no entanto, atacou de volta o francês e fez a ultrapassagem na freada para a Tosa, partindo para a vitória. Prost viu a manobra como uma quebra do acordo que eles tinham, enquanto Senna, em um primeiro momento, se defendeu afirmando que o combinado não valia para uma relargada.
Alguns dias depois, os dois pilotos estavam testando no pequeno circuito de Pembery, na Grã-Bretanha. Ron Dennis diz ter reunido os dois para um sermão. Senna teria admitido que errou e pedido desculpas, chorando segundo o dirigente inglês já contou em entrevistas. Porém, a relação dos dois pilotos seguiu esquentando até os famosos acontecimentos de Suzuka.
Alonso segura Schumacher em 2005
Quase que como uma passagem de bastão, Fernando Alonso fez uma incrível pilotagem para segurar Michael Schumacher no GP de San Marino de 2005 e conquistar a vitória. A Ferrari não estava bem naquela temporada, mas por questões de estratégia e casamento com a pista, o alemão estava no final da corrida com carro em melhores condições.
O ataque incisivo do heptacampeão contra o futuro bicampeão foi forte, porém, o espanhol mostrou naquele momento que seria realmente um dos grandes pilotos dos próximos anos ao conseguir segurar o rival.
No ano seguinte, curiosamente a situação se inverteria, com Schumacher tendo que segurar Alonso para vencer a prova em Imola, em sua última temporada antes da primeira aposentadoria. Dois grandes momentos de dois dos maiores pilotos da história da F1.
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