Capacete de Elio de Angelis se tornou uma dos mais icônicos da F1 nos anos 80

A história de Elio de Angelis: um raro exemplo de elegância na F1

A asa traseira falha no “S” da Verrière e o Brabham capota por cima de uma barreira, repousando de cabeça para baixo com um piloto preso nas ferragens. Um incêndio se inicia e os fiscais de Paul Ricard, pobremente equipados, demoram dez minutos para chegar ao ponto. Custam, então, mais 30 minutos para a chegada de um helicóptero, que transporta o ás, com leves queimaduras nas costas e uma clavícula quebrada, para um hospital em Marselha.Não foi o suficiente. No dia 15 de maio de 1986, morria Elio de Angelis, asfixiado por inalar a fumaça resultante do incêndio no Brabham. Ele tinha apenas 28 anos.

O mundo da F1 ficou chocado. Músico, com um ar de Marlon Brando jovial, De Angelis era um piloto benquisto no paddock. Martin Brundle, contemporâneo do italiano, o descreve assim, em recente entrevista à publicação “Autosport”:

“Ele era muito bom no volante e parecia ainda melhor fora dele. Ele era jovem, tinha classe, era um verdadeiro cavalheiro e era tudo que você pensava que um piloto deveria ser. E estava sempre cercado por um interminável fluxo de mulheres absolutamente deslumbrantes.”

Os últimos meses de Elio não foram fáceis. No fim de 1985, descontente com a atenção dada pela Lotus a Ayrton Senna, transferiu-se para a Brabham. Mas justamente a partir do ano seguinte a equipe de Milton Keynes começou a desandar. O longo e inclinado BT55 gerava ótima pressão aerodinâmica, mas o motor BMW M12 – bastante rebaixado para melhorar o centro de gravidade do carro – e a transmissão sofriam graves problemas de confiabilidade.

Com isso, nos quatro primeiros GPs de 1986, De Angelis e Riccardo Patrese estiveram confinados na maior parte do tempo à zona da pasmaceira no grid. Patrese marcou um ponto em Ímola, enquanto Elio fez um oitavo em Jacarepaguá, três voltas atrás do vencedor e ex-Brabham Nelson Piquet. No restante dos páreos, o motor na maior parte das vezes os deixou na mão.

O Brabham então precisava ser aperfeiçoado e, um dia após o GP de Mônaco, a equipe se dirigiu a Paul Ricard. Na quinta-feira, 15, De Angelis sofreu o acidente e perdeu a vida. O mais irônico no episódio era que o italiano odiava testes.

De Angelis com a Brabham, no GP de Mônaco de 1986
De Angelis com a Brabham, no GP de Mônaco de 1986

A carreira de Elio de Angelis

Nascido em 26 de março de 1958, De Angelis era oriundo de uma rica família envolvida no ramo da construção civil em Roma. O pai Giulio dirigia lanchas de 30 pés, pilotava Ferraris e levava os filhos para assistir corridas.

Sendo o primogênito, De Angelis tinha mais privilégios. Entrou no kart aos 14 anos e não demorou em mostrar serviço, tendo sido vice-campeão mundial aos 17 e campeão europeu aos 18.

Em 1977, já maior de idade, avançou à F3 e, em sua terceira corrida com um monoposto, venceu no circuito de Mugello. Duas semanas depois, fechou o prestigiado GP de Mônaco de F3 em segundo, no que foi considerado um desempenho surpreendente. No fim da temporada, trocou o Chevron pelo Ralt e triunfou em Monza e Misano, conquistando o título da F3 Italiana em sua primeira tentativa.

No ano seguinte, De Angelis pulou para a F2, pilotando um Chevron para a equipe Everest. Os resultados, no entanto, foram decepcionantes e o italiano voltou à F3 no meio da temporada, com o objetivo de vencer em Mônaco. Meta conquistada, Elio ganhou a chance de experimentar um F1 para a Shadow em setembro daquele ano.

Para a temporada de 1979, De Angelis chegou a sondar um contrato com a Tyrrell para ser colega de Didier Pironi – seu antigo rival na F3 –, mas no fim das contas parou na Shadow, onde basicamente era um piloto pagante. Seu pai indiretamente asseverava os holerites dos funcionários e ele sentava a bota.

Mas, para um pay driver, De Angelis até que foi bem. Apesar de não ter se classificado em Monte Carlo, ele venceu seu colega mais experiente Jan Lammers na tábua de pontuação e terminou o campeonato com um ótimo quarto lugar em Watkins Glen.

O desempenho nos Estados Unidos chamou a atenção de Colin Chapman, que o contratou como piloto nº 2 da Lotus para 1980. No time de Hethel, mostrou-se competitivo logo no ano de estreia: amealhou um segundo lugar no Brasil (em seu segundo GP pelo time) e pontuou em Österreichring, Monza e Glen, encerrando o ano em sétimo e à frente do campeão mundial Mario Andretti.

Imagem do capacete de Elio de Angelis na Lotus preta se tornou um ícone
Imagem do capacete de Elio de Angelis na Lotus preta se tornou um ícone

A partir daí, De Angelis se tornou um dos pilotos mais respeitados no grid. Após um tenso duelo com Keke Rosberg, venceu sua primeira corrida em 1982, na Áustria. Dois anos depois, ele teve seu melhor ano na F1, encerrando a temporada em terceiro, atrás apenas das dominantes McLarens de Niki Lauda e Alain Prost. No total, foram 109 GPs disputados na história, com duas vitórias, três poles e nove pódios – quatro deles conquistados em 1984.

O talento de De Angelis era nato. Se o italiano tinha chances de ser campeão na F1, nunca saberemos a resposta. Muitos questionavam sua impaciência para testar os carros – o que é curioso, dada as circunstâncias de sua morte. Outros entendem que Elio nunca teve equipamento à altura para lutar pelo título.

Sempre haverão “ses”, mas fiquemos com as recordações de um piloto que, tanto fora quanto dentro da pista, exibiu uma elegância rara de se ver na F1. Nas palavras de Derek Warwick, seu substituto na Brabham:

“Ele era um cara adorável. A primeira vez que cruzei com ele foi em Kyalami, na greve dos pilotos. Todos fomos de ônibus até o hotel e alguns caras estavam nervosos, sob pressão dos chefes de equipe. Ele então simplesmente sentou-se no piano e tocou essa música clássica fabulosa e todos relaxaram. Foi impressionante. Nunca tinha visto nada parecido.”

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