(Foto: Simon Galloway/Formula E)

Longas retas do Anhembi impõem tática de ciclismo na Fórmula E

A Fórmula E é uma categoria que normalmente já tem como característica a forte exigência de economia de energia para um ataque forte mais ao final da prova. Goste ou não, este estilo de corrida casa com a ideia da promoção de um consumo mais sustentável de energia e desenvolvimento de tecnologias de mobilidade urbana elétricas.

Só que essa economia de energia não é apenas uma questão de segurar o ritmo, mas também de fugir da resistência do ar para gastar menos sua carga na bateria ficando atrás dos adversários.

A estratégia pode ser mais ou menos forte dependendo do estilo do circuito. E a pista de rua de São Paulo é uma das que mais potencializa esse cenário por conta das características do traçado montado no Parque Anhembi, na zona norte da capital paulista.

Com 2.933 metros de extensão, 11 curvas e três longas retas (uma delas passando pelo sambódromo paulistano), o vácuo tem um efeito maior nos carros. Isso concede uma oportunidade extra para os carros que estão atrás dos rivais salvem mais energia sem necessariamente precisarem economizar apenas no acelerador.

Assim, o estilo da corrida brasileira, também vista em outras pistas com longas retas como Portland, tem um efeito que causa bastante estranheza tanto no público quanto nos próprios pilotos que é o fato de ninguém querer andar na frente na primeira metade da prova. Ou seja, muito provavelmente, você vai ver na corrida deste sábado (16) os pilotos tentando entregar a liderança nas primeiras voltas.

Lucas di Grassi, da equipe Abt, explica que apesar da dinâmica da prova ficar um pouco estranha, o cenário pode aumentar a imprevisibilidade do resultado ao dar mais chances para os pacotes menos competitivos.

“Se você estiver seguindo um outro carro na corrida, você pode ganhar mais de um segundo em tempo de volta. E um segundo na Fórmula E é mais que a diferença entre o melhor carro e o pior”, explicou o piloto brasileiro.

“Seguindo o melhor carro na frente, o piloto atrás, mesmo com o pior carro, vai conseguir seguir o melhor na frente e provavelmente vai ter mais energia no final da corrida. Esse é o efeito desse vácuo. Claro que na média e com toda a dinâmica [de corrida], a história é diferente. Mas isso mostra o quão poderoso é o vácuo nesta categoria”, continuou o campeão de 2016.

Após o ePrix inaugural do Anhembi em 2023 apresentar 114 ultrapassagens por conta de toda essa questão, a Fórmula E resolveu potencializar ainda mais o cenário diminuindo a quantidade de energia disponível durante a prova em 1,5 Kw/h. Isso vai obrigar os pilotos seguirem ainda mais o vácuo, evitando posições à frente do pelotão.

Di Grassi afirmou que os pilotos brincam entre eles que a Fórmula E acaba impondo nestes cenários um estilo que parece uma prova de ciclismo, como a “Volta da França”, em que os atletas evitam estar na frente até o momento da arrancada final.

“Você tem o pelotão e precisa se posicionar nele para atacar no momento certo sabendo que vai ter energia suficiente. Mas se você esperar demais, pode ter energia, mas pode não conseguir ultrapassar”, afirmou.

Pelotão da Fórmula E cruza uma das longas retas do circuito de rua de Anhembi, em São Paulo (Foto: Sam Bloxham/Fórmula E)
Pelotão da Fórmula E cruza uma das longas retas do circuito de rua de Anhembi, em São Paulo (Foto: Sam Bloxham/Fórmula E)

Campeão de 2021, Stoffel Vandoorne sofreu na pele com a estratégia em São Paulo na última temporada quando foi um dos pilotos que liderou a prova por mais tempo, mas acabou perdendo ritmo em relação aos outros carros no final e terminou apenas em sexto. Ele disse que aprendeu com a experiência para jogar melhor com a tática em 2024.

“Vimos no ano passado que liderar a corrida no começo não é uma coisa boa porque é algo muito sensível para o consumo de energia. É melhor ficar um pouco mais atrás. Eu aprendi do jeito mais difícil ano passado, ficando na liderança por um longo tempo. Estamos mais bem preparados para não cometermos o mesmo erro”, explicou o belga da equipe DS Penske ao Projeto Motor.

Pilotos admitem que estilo da Fórmula E não é natural

Essa estratégia de evitar liderar ou estar à frente dos rivais causa em momentos das corridas da Fórmula E situações em que os pilotos brigam para deixar o adversário passar. Isso cria cenas inusitadas e que nem público, nem pilotos estão muito acostumados, pois existe uma briga para ficar atrás.

Vandoorne aponta que em muitos momentos, a prova fica até um pouco confusa com as trocas de posições. “É difícil, pois é uma dinâmica completamente diferente de corrida. Você precisa manter uma mente mais aberta sobre o que faz. É um pouco confuso, não é muito natural. Mas é a maneira de correr”, explicou.

Bicampeão da categoria em 2018 e 19, Jean-Éric Vergne também chamou a atenção para a grande possibilidade de economia de energia que a pista de São Paulo proporciona, mas admitiu ao Projeto Motor que este não é exatamente um estilo de corrida que o dá prazer. “É difícil. Não é normal. Eu não gosto. Mas é o jogo que temos que jogar. Mas não é normal”, disse o francês.

Destacando um outro lado da questão, António Felix da Costa lembra que se a primeira parte da prova pode ser esquisita por conta da busca por vácuo, o final pode ficar bastante maluco a partir do momento em que todos os pilotos passam a acelerar ao mesmo momento.

“Tem o momento certo para passar para frente, mas todo mundo está ficando experiente nisso. Então todo mundo vai tentando tarde, no mesmo lugar, na mesma volta”, disse ao Projeto Motor o português da equipe Porsche, campeão da Fórmula E em 2020.

A etapa da Fórmula E em São Paulo acontece neste sábado (16) no Parque Anhembi. A classificação será realizada às 9h40 e a corrida, 14h. Os ingressos ainda estão à venda no site da Eleven Tickets.

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