(Foto: Simon Galloway/Fórmula E)

Os avanços tecnológicos e das bandeiras da Fórmula E em nove anos

A Fórmula E nasceu em 2014 sobre premissas bastante definidas de criar um bom entretimento, com regras esportivas bastante heterodoxias em relação às categorias tradicionais, e de principalmente liderar a discussão sobre eletrificação e futuro do automobilismo e mobilidade urbana.

A resposta para a primeira questão é bastante subjetiva. É possível encontrar pessoas que adoram as corridas da Fórmula E e também muitas que não gostam. Mas é impossível negar que a categoria não deixa de se atualizar e vem evoluindo em sua competitividade e modelo esportivo, tentando sempre novos formatos para tentar melhorar o show que promove na pista.

Por outro lado, mensurar a contribuição da Fórmula E para o mercado automotivo e a bandeira da eletrificação é mais plausível. É inegável que desde sua fundação, o certame teve seus altos e baixos. Mas a participação de um número sempre constante de montadoras globais e locais, o campeonato claramente se consolidou como plataforma tecnológica.

O chassi e baterias da Fórmula E são padrão para todas as equipes, fabricados pela Spark Racing Technology e Williams Advanced Engineering, respectivamente. Porém, as unidades de potência e os softwares do sistema de administração e utilização da energia são livres. Isso estimula as montadoras a desenvolverem suas próprias soluções.

Atualmente, DS (divisão da Citroen), NIO, Mahindra, Maserati, Jaguar, Porsche e Nissan fabricam e fornecem suas unidades de potência na categoria. Muitas outras, como Mercedes, Audi e BMW, já passaram por ela.

E a combinação de um campo bastante verde para inovações com a competitividade do automobilismo, na visão interna, é o que ajuda a acelerar a criação de novas tecnologias para carros elétricos que, em algum momento, vão chegar às ruas. E segundo a opinião de dirigentes de equipes ligadas a montadoras com quem o Projeto Motor conversou durante o ePrix de São Paulo, essa transferência já é vista.

James Barclay, chefe da equipe Jaguar, explicou que os atuais modelos Pace elétrico (I) e híbrido (E) de rua da montadora britânica já se beneficiaram de diversos aprendizados que vieram da Fórmula E. Ele citou, por exemplo, a utilização de carboneto de silício no inversor dos carros e o desenvolvimento dos softwares de gerenciamento dos controles que administram o consumo da energia e a previsão de autonomia.

Pilotos da DS Penske na reta do sambódromo, no ePrix de São Paulo da Fórmula E
Pilotos da DS Penske na reta do sambódromo, no ePrix de São Paulo da Fórmula E (Foto: Simon Galloway/Fórmula E)

“Nas nossas atividades de automobilismo, nós aprendemos a melhorar o desempenho de nossa bateria e o quanto podemos evoluir o desempenho do carro. E isso nos deu um aumento de 20 quilômetros na autonomia do [modelo de rua] Jaguar I-Pace. Sem [mudança] de hardware, apenas software”, disse.

Claro que as grandes montadoras não precisariam estar na Fórmula E para desenvolverem essas tecnologias. Mas Ian James, chefe da McLaren, time que utiliza unidade de potência da Nissan, aponta que a pressão da competição no esporte e importância dos bons resultados para as marcas ajuda a acelerar a pesquisa e levar os engenheiros a novos limites.

“Tem sido interessante ver como funciona essa teoria da corrida de carros elétricos. Eu estaria mentindo se dissesse que todos temos os mesmos recursos do que em áreas que estão investindo bilhões de dólares em desenvolvimento de usinas elétricas e sistemas que vão no entorno. Acho que a questão do automobilismo é a velocidade que conseguimos acelerar esse desenvolvimento”, disse.

Além da evolução tecnológica, o chefe da Nissan, Tommaso Volpe, lembrou também da importância da plataforma de marketing que a Fórmula E se tornou para montadoras que investem em eletrificação e do próprio fórum de discussão sobre o futuro da mobilidade em si.

“Claro que tem a plataforma do automobilismo. Vimos como a primeira geração da Fórmula E ajudou a gerar atenção para como a eletrificação pode ser utilizada para desempenho. A segunda geração foi quando o esporte ganhou credibilidade. E acho que a terceira geração vai ser a era em que as pessoas vão entender como a nossa eletrificação pode ser excitante no topo do automobilismo. E isso do ponto de vista de marketing ajuda muito no mercado automotivo.

Os principais pontos que a Fórmula E evoluiu nos elétricos

A Fórmula E está em sua terceira geração de carro. Na primeira, as baterias não tinham capacidade de chegarem ao final da prova, o que obrigava às equipes a terem dois monopostos para cada piloto, que faziam a troca durante a prova.

Com a segunda geração, essa questão foi resolvida. Esse momento foi importante para começar a se diminuir o estereótipo da falta de autonomia que tanto atrapalhava – e ainda atrapalha – a imagem dos carros elétricos no mercado.

Agora, na terceira geração [que leva o nome de Gen3], a maior eficiência do consumo e recuperação de energia durante as provas nas freadas fez com que os modelos pudessem ganhar mais potência. A velocidade máxima projetada é de 322 km/h. Além disso, os novos carros foram desenvolvidos para uma recarga rápida, que deve passar a ser realizada na temporada 10, o que deve aumentar o fator estratégico da categoria, além divulgar a tecnologia de recarregamento mais veloz das baterias.

Chefe da Porsche, Florian Modlinger acredita que tudo isso é uma demonstração do quanto que a competição da Fórmula E contribui para a velocidade do desenvolvimento tecnológico da mobilidade elétrica.

“[O Gen3] é um carro mais leve, mais potente e, para mim, um dos números mais impressionantes é o de recuperação de mais de 600 Kw. A energia que nós recuperamos durante a corrida é equivalente a 40% da energia que usamos durante a prova. Se você pensar apenas nesses valores, são passos muito impressionantes que demos nesses oito anos e meio”, disse.

Nick Cassidy, da equipe Envision Racing no ePrix de São Paulo de Fórmula E
Nick Cassidy, da equipe Envision Racing no ePrix de São Paulo de Fórmula E (Foto: Sam Bloxham/Fórmula E)

Sylvain Filippi, líder da Envision, time independente que utiliza as unidades de potência da Jaguar, fez a comparação do que a Fórmula E já conseguiu fazer com a sua unidade de potência em relação ao hídrido da F1. “Se você colocar em perspectiva, o nosso carro é mais leve e menor do que um carro de F1. Não é fácil deixar o carro tão compacto e tão adequado para correr”, apontou.

O dirigente ainda destacou que toda essa evolução da tecnologia da Fórmula E chega aos carros de rua de forma mais aparente, ao contrário do que acontece no desenvolvimento de outras categorias.

“Mais de 90% da energia da bateria vai para as rodas. É três vezes mais do que o melhor motor a combustão. Eu adoraria ter um carro de rua que usasse uma bateria da Fórmula E. Seria muito legal. E esse é o ponto, pois vai acontecer. Toda a questão é fazer essas unidades de potência e baterias tão avançadas”, continuou.

Diante de todas essas questões, o CEO da Fórmula E, Alberto Longo acredita que a categoria tem cumprido seu dever de se tornar uma grande plataforma de desenvolvimento tecnológico, marketing e de geração de consciência sobre a importância da eletrificação e diminuição da emissão de carbono no planeta.

“Se você olhar a transferência da tecnologia que tem sido desenvolvida na Fórmula E em casos como Jaguar Pace a até a Mercedes… Quando foram campeões, eles desenvolveram um software que permitia um carro de rua ir da Alemanha até Silverstone [na Inglaterra] com apenas um carregamento de bateria. Essa tecnologia foi desenvolvida na Fórmula E”, lembrou.

“E esses carros na rua que as pessoas estão dirigindo hoje, eles são muito mais eficientes hoje por causa do desenvolvimento da tecnologia na Fórmula E. Definitivamente tem muito mais por vir, mas já tivemos um grande impacto nas montadoras que estão entrando na Fórmula E”, comentou o dirigente espanhol.

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