O polêmico caso do teste ilegal de pneus da Mercedes em 2013

Antes de se tornar força dominante da F1, a Mercedes protagonizou uma polêmica envolvendo um teste ilegal. Em 2013, a equipe realizou uma atividade particular com a Pirelli e sem o conhecimento das rivais, o que gerou protestos e acabou em punição. 

Tudo aconteceu em uma época em que a Mercedes ainda tentava dar estabilidade à sua equipe em seu retorno à F1. Entre 2010 e 2012, as três primeiras temporadas da operação, o time havia conquistado apenas uma vitória, com Nico Rosberg, no GP da China. De resto, a equipe ainda não conseguia ingressar de vez no pelotão da frente, pois havia obtido somente cinco outros pódios.

Para 2013, a ideia era dar um passo além. Michael Schumacher abriu espaço a Lewis Hamilton, e o modelo do time, chamado de W04, apresentava um ritmo forte, conquistando poles na parte inicial do campeonato. 

Mas, durante as corridas de 2013, a Mercedes mostrava uma grande fraqueza. Na época, a Pirelli construía pneus de alto desgaste, justamente para proporcionar uma maior movimentação estratégica. Ocorre é que a Mercedes era uma das equipes que mais sofriam com isso – especialmente na gestão da temperatura dos pneus traseiros, o que resultava em uma enorme queda de ritmo em condições de corrida. 

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Rosberg e Hamilton largaram na primeira fila na Espanha, mas terminaram a corrida longe da ponta (Foto: Pirelli)

A situação ficou bastante crítica no GP da Espanha. Nico Rosberg e Lewis Hamilton garantiram a primeira fila, mas o desempenho dos dois despencou na corrida. O alemão recebeu a bandeirada somente em sexto, um minuto atrás de Fernando Alonso, o vencedor com a Ferrari, enquanto que Hamilton sequer pontuou: foi 12º, com uma volta de atraso.

A polêmica do teste secreto vem à tona

Mas a relação da Mercedes com os pneus ainda ganharia tons de escândalo. Antes do GP de Mônaco, veio à tona que o time realizou um teste particular em Barcelona, com três dias de duração, pouco depois do GP da Espanha. O time utilizou seu carro de 2013 e os pilotos titulares para completar um total de 1000 km, experimentando tipos diferentes de pneus da Pirelli. 

Isso provocou revolta das equipes concorrentes. Primeiro porque o entendimento dos pneus era um fator importantíssimo para estabelecer a relação de forças daquele ano, e a Mercedes, que tinha dificuldades neste aspecto, teria uma chance extra para acumular quilometragem. 

Segundo, o regulamento desportivo da F1 proibia a realização de qualquer teste particular utilizando carros contemporâneos. As únicas atividades permitidas com o campeonato em andamento eram uma sessão coletiva, exclusiva para pilotos novatos, em julho, e quatro dias de testes aerodinâmicos realizados exclusivamente em linha reta. 

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Mercedes sofria bastante para entender os pneus em 2013 (Foto: Pirelli)

No dia 26 de maio, Red Bull e Ferrari entraram com um protesto junto à FIA sobre a possibilidade de quebra do artigo 22, parágrafo H, do regulamento desportivo. As concorrentes consideravam que o problema maior não era nem somente o teste com os pneus, mas sim o uso dos pneus combinados com o carro de 2013. O regulamento proibia atividades com os modelos atuais e do ano anterior. Só para ter uma ideia, a Ferrari havia realizado, em abril, um teste de pneus também em Barcelona – a diferença é que o carro usado na ocasião era o Ferrari 150º Italia, de 2011.  

Argumentos de defesa

Mercedes e Pirelli se alinharam na defesa. Segundo elas, a Mercedes não tirou benefício algum com a atividade, até porque se tratava de um teste cego – ou seja, a equipe e os pilotos não sabiam qual composto estava sendo testado, e com qual finalidade. A fornecedora posteriormente informou que foram experimentados 12 compostos diferentes: um voltado a soluções a serem implementadas ainda em 2013, e os 11 restantes pensando já em 2014. 

Além disso, elas garantiram que não houve tentativa de manter a atividade em segredo, pois todos os funcionários estavam uniformizados como de costume. A única questão é que Hamilton e Rosberg usaram capacetes pretos para evitar a identificação. Sobre isso, a Mercedes afirmou que era para não chamar tanto a atenção de fãs, já que havia menos funcionários da segurança no circuito do que durante o GP. 

Chefia da Mercedes foi colocada contra a parede (Foto: Steve Etherington/Mercedes)

E, por fim, as partes argumentaram que a FIA foi sim consultada sobre a atividade e que não houve objeção alguma. Mas, segundo a entidade, a história não foi bem assim. 

Entendendo a infração do teste e a punição

No contrato de fornecimento da Pirelli com a F1, era prevista a possibilidade de a fabricante convocar equipes para testes de desenvolvimento de pneus com até 1000 km de duração. Mas isso teria de acontecer: 

1. Sujeito à concordância da FIA,

2. Sujeito ao cumprimento do regulamento desportivo, 

3. Contanto que todas as equipes fossem tratadas com igualdade e recebessem o mesmo convite. 

Então, os acontecimentos se desdobraram da seguinte forma. A Pirelli queria fazer testes com carros atuais para entender melhor os pneus, já que ela tinha usado durante o desenvolvimento somente modelos mais defasados (como o Toyota TF109, de 2009, e o Renault R30, de 2010). A fabricante convidou a Mercedes para testar, até porque a equipe vinha sofrendo com os compostos no início da temporada. 

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Pirelli só usava carros de anos anteriores para desenvolver pneus – como o Renault R30, de 2010 (Foto: Pirelli)

No dia 2 de maio, a Mercedes questionou Charlie Whiting, diretor de provas da F1, sobre a realização do teste com um carro de 2013. Whiting disse que a atividade até poderia cumprir com o regulamento desportivo, desde que ficasse claro que a finalidade era para testar os pneus, e que a Pirelli fosse a responsável por conduzir as ações. Porém, ainda assim seria preciso tratar as outras equipes com igualdade, conforme pede o contrato da Pirelli com a F1. 

No entanto, nenhum outro time foi convocado a testar, ou sequer ficou sabendo da realização da atividade. Para agravar a situação, no último dia de testes, um relatório enviado pela Pirelli à Mercedes continha dados descritos como de “sensibilidade confidencial”. Isso mostrou à FIA que havia a intenção de trocar informações, sendo que nada disso foi passado às outras equipes. 

O veredito do caso

O caso foi julgado pelo Tribunal Internacional da FIA, no dia 21 de junho de 2013. A conclusão foi de que Mercedes e Pirelli agiram em boa fé, mas isso não muda o fato de que o regulamento desportivo foi quebrado. Além disso, concluiu-se que a Mercedes ganhou uma “vantagem injusta”, mesmo que essa possa não ter sido sua intenção original. 

A Pirelli também tinha sua parcela de responsabilidade por compartilhar informações com a Mercedes e não repassá-las às outras equipes. Então, a Mercedes recebeu uma reprimenda, e, como punição, foi proibida de participar dos testes coletivos de novatos que aconteceriam em julho. Já a Pirelli, por ser apenas uma fornecedora e não ter vínculo direto com a FIA, não podia receber uma punição de fato, então ela ficou só com a reprimenda. 

Mas a história não acabava totalmente ali. No GP da Grã-Bretanha, em junho, a F1 viveu uma crise dos pneus, com vários estouros repentinos durante a corrida, inclusive com Hamilton, que liderava. 

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(Foto: Reprodução)

A toque de caixa, a Pirelli implementaria mudanças nos compostos a partir do GP da Hungria. Os testes de Silverstone, dos quais a Mercedes estava banida, passariam a ter uma importância maior, já que seria a primeira oportunidade para que as equipes experimentassem os compostos modificados – tanto que a atividade deixaria de ser exclusiva a novatos e passaria a permitir a participação dos titulares. 

A Mercedes se sentiu lesada até tentou uma autorização especial para participar do teste. Mas a proibição foi mantida, e a equipe alemã apenas receberia os relatórios técnicos das atividades. Aparentemente isso foi suficiente: na primeira corrida dos pneus modificados, Hamilton marcou a pole e conquistou sua primeira vitória pela Mercedes.

Confira mais detalhes do teste ilegal da Mercedes em nosso vídeo:

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