(Reprodução/Stock Car)

Entenda como a Stock Car criou um circuito no aeroporto do Galeão

A Stock Car volta ao Rio de Janeiro no próximo domingo (10) após 10 anos de sua última visita à cidade, quando correu no antigo autódromo de Jacarepaguá, demolido em 2012 para a construção do Parque Olímpico dos Jogos de 2016. O evento não será realizado em um novo autódromo ou circuito de rua, mas em um traçado dentro do aeroporto internacional do Galeão.

A ideia surgiu em 2021, quando a nova administração da Stock Car começou a procurar opções para voltar a correr no Rio de Janeiro, segundo maior centro urbano do país e uma das cidades brasileiras mais conhecidas do mundo, com um imenso apelo e potencial turístico.

O CEO da Vicar, promotora da Stock Car, Fernando Julianelli, foi quem começou analisar a ideia junto com o governo do estado do Rio de Janeiro e a administração do Galeão. Em seguida, o dirigente acionou Luis Ernesto Morales, membro da Comissão de Circuitos da FIA e presidente da Comissão Nacional de Circuitos da CBA.

Em conversa com o Projeto Motor, Morales explicou que após os estudos iniciais em 2021, chegou-se à conclusão de que era possível fazer a corrida, porém, existiam alguns desafios importantes. Para começar, o desenho do traçado, pois ele precisaria obedecer à geometria das pistas e trechos de taxiamento das aeronaves sem nenhuma intervenção.

“Não podia furar a pista de concreto, colocar zebra, nada. A operação de montagem e desmontagem também é complexa. Fizemos oito opções de traçado e trouxemos um piloto para avaliar. Veio o Cacá Bueno para avaliar a pista para os limites do carro”, explicou.

A extensão do traçado ficou em 3.225 metros com sete curvas: seis para direita e apenas uma para a esquerda. Até pelo fato de ser em um aeroporto internacional que recebe aeronaves de grande porte, chamam a atenção algumas características que isso proporciona. A primeira é a largura da pista, com 24 metros na maior parte, e 12 na curva dois e entre as curvas 6 e 7.

Circuito do Galeão irá sediar a volta da Stock Car ao Rio de Janeiro
Circuito do Galeão irá sediar a volta da Stock Car ao Rio de Janeiro (Vicar)

O segundo ponto importante são as retas. São três: de 702 metros entre as curvas sete e um, 1.030 metros e um longo trecho de aceleração máxima entre as curvas um e quatro de 1.550 metros. Neste setor, os técnicos da Stock Car esperam que os carros alcancem velocidade final na casa de 260 Km/h com o acionamento do push-to-pass (dispositivo que libera potência extra no motor por alguns segundos).

Outra questão importante, claro, é a da segurança. O aeroporto é bastante amplo e tem muitas áreas de escape. Porém, a equipe de Morales precisou verificar cada ponto por conta dos requisitos para o automobilismo. Por exemplo, a presença de depressões que podem fazer o carro capotar em uma saída em alta velocidade. Muros de concreto e outros elementos também não podiam ser instalados na maior parte do traçado.

Isso acabou influenciando também na escolha do desenho do circuito, já que alguns trechos da pista disponível não poderia ser adequado sem intervenções para o automobilismo. As poucas muretas pré-fabricadas de concreto puderam ser colocadas apenas na saída do pit lane e terão que ser retiradas ao final do evento. .

Por conta da distribuição da pista e logística de entrada e saída do aeroporto, também foi preciso montar a área de pits, que será utilizada durante a corrida, em lugar separado a dos boxes, onde ficam estrutura e equipamentos das equipes, e que os mecânicos trabalham entre as sessões.

Pit lane será utilizada apenas durante a prova para as trocas de pneus. Boxes das equipes ficarão posicionados em outra área do aeroporto (Foto: Marcelo Machado de Melo/Stock Car)

Como a Stock Car não pode fazer nenhuma intervenção na pista ou estrutura do entorno, diversos equipamentos precisaram ser especialmente construídos para a montagem do circuito de uma forma que facilitasse a desmontagem e evitar qualquer necessidade de reparo posterior para devolver a área ao aeroporto.

As zebras, por exemplo, são metálicas e serão presas ao piso por uma cola de altíssima resistência, evitando, assim, parafusar as peças no pavimento. Também foram produzidos 270 módulos de pneus agrupados formando barreiras que ocuparão 420 metros de extensão da pista, utilizando um total de 8.200 pneus.

Todo este cenário indica a grande dificuldade de realizar a etapa com o aeroporto funcionando, diferente de provas do mesmo estilo em outros lugares, quando o campo de pouso tem pouca ou nenhuma utilização. Ou seja, apesar de parte do Galeão estar fechada para a Stock Car, o local estará operando normalmente no resto. Isso dificulta a circulação de pessoal da categoria para montagem e desmontagem do evento, além da chegada e saída de equipamentos, entre outros.

“Toda a dinâmica do aeroporto está funcionando. Aqui, entenda como logística, regras da Polícia Federal, varredura, portões de acesso… Em cima disso, tem um tempo disponível. A pista em si tem que ser o mais simples possível. Na quarta-feira [depois da corrida] não pode ter mais nada lá para que venha a varredura [de segurança] e libere a área [para funcionamento do aeroporto novamente]”, explicou Morales ao Projeto Motor.  

Stock Car pôde instalar apenas 200 blocos de concreto com barreiras de pneus da pista do Galeão em pontos específicos como na saída do pit
Stock Car pôde instalar apenas 200 blocos de concreto com barreiras de pneus da pista do Galeão em pontos específicos como na saída do pit (Foto: Trecho da pista do Galeão que será utilizado pela Stock Car )

Desafio técnico para os pneus e pilotos

Dentro da pista, pilotos, equipes e a fornecedora de pneus da Stock Car, a Pirelli, também enfrentarão alguns desafios técnicos interessantes no circuito do Galeão em relação a outras pistas comuns.

“O grande diferencial é a falta de elementos de referência para estabelecer sua linha de corrida, ponto de frenagem e etc. O aeroporto é uma planície aberta”, apontou Morales sobre as dificuldades que os pilotos devem encontrar durante o final de semana.

O pavimento em concreto também será uma novidade. Apesar de alguns circuitos brasileiros possuírem trechos específicos com o material, nenhum outro tem esse tipo de superfície em toda sua extensão. E mais. A questão não é só o concreto, mas a forma como ele é instalado por conta do pouso e decolagem de aeronaves. “Ele é bem rugoso. Gera aderência, mas um fator que tem que ser avaliado é o desgaste dos pneus”, indicou o engenheiro.

Trecho da pista do Galeão que será utilizado pela Stock Car
Trecho da pista do Galeão que será utilizado pela Stock Car (Foto: Marcelo Machado de Melo/Stock Car)

Em seu comunicado pré-corrida, a Pirelli também destacou a questão como um ponto de atenção. Por conta de todas essas características e o fato do circuito ser no sentido horário, a empresa espera um desgaste acentuado no pneu traseiro esquerdo.

“A perspectiva, se compararmos a uma pista tradicional de asfalto, é que haja menos aquecimento dos pneus, porém nada que interfira de maneira acentuada na aderência”, disse Fabio Magliano, gerente de produtos Car e Motorsport da Pirelli para a América Latina.

“Outro ponto de atenção será a abrasividade do pavimento, que será acompanhado muito de perto pela Pirelli durante todo o final de semana. Por ser um circuito de sentido horário, existe uma grande tendência de que o lado esquerdo dos carros seja o mais afetado pela degradação, com destaque ao pneu traseiro esquerdo”, continuou.

O esforço da Stock Car para voltar ao Rio de Janeiro

Desde a demolição de Jacarepaguá, o Rio de Janeiro tem tentado encontrar uma opção para voltar a receber eventos de automobilismo. Provas em circuitos de rua da Fórmula E no Aterro do Flamengo e da Indy na região do sambódromo chegaram até a serem anunciadas, mas nunca saíram do papel.

A cidade também chegou a conduzir um fracassado processo para a construção de um novo autódromo na região de Deodoro, que seria erguido por uma empresa privada chamada Rio Motorsports. O projeto não foi para frente por falta de licenças ambientais, além de sérios questionamentos em relação a capacidade financeira da companhia de conseguir conduzir a obra e promover o evento. Assim, a F1 acabou renovando seu contrato com São Paulo.

Público vai poder acompanhar o GP do Galeão, no Rio de Janeiro, em arquibancadas móveis montadas dentro do aeroporto
Público vai poder acompanhar o GP do Galeão, no Rio de Janeiro, em arquibancadas móveis montadas dentro do aeroporto (Foto: Trecho da pista do Galeão que será utilizado pela Stock Car )

Com ampla tradição de automobilismo, que remete às primeiras provas nacionais e internacionais do Brasil, como do circuito da Gávea, o Rio de Janeiro seguiu como uma grande ausência no calendário do esporte a motor.

“A importância do estado todo no automobilismo se mostra até na precocidade das corridas disputadas lá. A primeira foi em 1908, do Rio até Petrópolis, sendo uma das provas pioneiras do nosso automobilismo e já lançando entre os cariocas e fluminenses a semente da velocidade”, lembrou Julianelli, promotor da Stock Car, em comunicado da categoria.

“A estreia e a primeira vitória de Emerson Fittipaldi, nosso primeiro campeão mundial, foi em uma prova de rua do Rio, no Circuito do Fundão, ambas em 1965. No âmbito da Stock Car, nosso maior campeão em atividade, Cacá Bueno, é um carioca da gema. Não consigo descrever a ansiedade de todos nós, da Stock, por esse retorno ao Rio. O próximo domingo será histórico. E, eu garanto, extremamente emocionante”, seguiu.

Citado por Julianelli, Cacá Bueno é o grande homenageado dessa nova prova no Rio de Janeiro, já que a pista foi batizada de “Circuito Cacá Bueno”. Natural da cidade, o piloto, que compete na Stock Car desde 2002 e já conquistou cinco títulos, celebrou o retorno do automobilismo à capital fluminense.

“Vai ser um final de semana especial não só para mim, por correr em casa depois de dez anos, mas para o automobilismo brasileiro como um todo. Tem sido uma semana bem agitada, com bastante promoção da corrida nos eventos fora da pista e isso é incrível. O Rio de Janeiro precisava voltar a receber corridas grandes e importantes do esporte a motor e tenho certeza de que o GP Galeão dará este pontapé para que, em breve, as corridas voltem a ser comuns por aqui e, quem sabe, a gente possa voltar a ter um autódromo.”

Corrida da Stock Car no Galeão acontece no próximo domingo (10) a partir das 13h20, com transmissão da Band e do Sportv 3.

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