Acidentes graves do automobilismo que não foram registrados em vídeo
Na atualidade, acidentes ou qualquer situação mais espetacular que acontece em uma corrida regional ou até de kart em algum lugar do mundo, dificilmente não teremos alguma imagem. Pode até demorar semanas, mas o vídeo, seja de uma transmissão local ou até de celular, acaba, uma hora ou outra, viralizando, mesmo que seja apenas entre os fãs do automobilismo.
Isso nem sempre foi assim. E não precisamos ir muito ao passado, muito menos a categorias menores. Até mesmo na F1, até o começo dos anos 90, as transmissões não eram a maravilha que temos hoje, com câmeras em todos os carros, em todas as curvas, nos mais diferentes ângulos. Tirando que era caro demais manter a estrutura para todas as sessões de um final de semana.
Pior, o equipamento nem sempre foi capaz de armazenar todas as imagens que chegavam de todas as câmeras espalhadas no traçado. Se o diretor de transmissão fizesse um corte infeliz, podia perder algum lance de forma definitiva, sem direito a reprise.
E convenhamos que automobilismo não é exatamente o esporte mais fácil de ser televisionado ou filmado. Ao contrário de modalidades de quadra ou que acontecem em um espaço mais reservado, os carros utilizam traçados de quilômetros. Até hoje, ainda vemos algumas transmissões perderem algo.
Diante disso, mesmo com uma grande evolução da tecnologia e dos formatos de televisionamento, muita coisa foi perdida na história do esporte a motor. E entre elas, estão alguns acidentes importes, vários deles que se tornaram famosos por terem sido fatais ou pela plástica, que só quem estava naquele ponto da pista viu.
Vamos relembrar então alguns desses acidentes em que não se tem imagens, ou elas são quase inconclusivas:
Elio de Angelis
Paul Ricard (França), 1986
Teste de F1
De Angelis participava de testes com sua Brabham no circuito francês de Paul Ricard. Ele partia para a curva Verriere, de alta velocidade, após a reta dos boxes, quando sofreu uma quebra de sua asa traseira, indo direto para o guardrail.
O piloto ficou preso no carro de cabeça para baixo até que o veículo começou a pegar fogo. Os ficais demoraram diversos minutos para chegarem. Por ser um teste, existia uma quantidade bastante reduzida de pessoas trabalhando no circuito. Alan Jones foi um dos primeiros a chegar ao local.
“Não tinha fogo quando eu cheguei no carro. Apenas fumaça preta. O problema era que não conseguíamos virar o carro, pois era muito pesado. Tinha uns dois fiscais de shorts e eles estavam com uns extintores minúsculos que não faziam nada. Quando o caminhão chegou, com um extintor grande, já tinha passado muito tempo, e eles ainda dispararam no cockpit, e não no motor. Horrível, foi horrível”, disse o australiano.
O impacto em si não matou o italiano, mas o tempo em que ele ficou preso dentro do monocoque que praticamente selou seu destino. Ele quebrou uma clavícula e tinha apenas leves queimaduras quando chegou ao hospital, mas morreu 29 horas depois por conta da quantidade de fumaça que inalou no tempo em que ficou preso no carro.
PHILIPPE STREIFF
Jacaregpaguá (Brasil), 1989
Teste de F1
O francês participava de um teste de pneus na pré-temporada no circuito carioca com sua AGS. Ele utilizava um modelo JH23B, uma atualização do carro do ano anterior do time, e estava em sua última sessão, já que o companheiro, Joachim Winkelhock, assumiria o volante a partir do dia seguinte.
A Goodyear estava experimentando um composto diferente para o campeonato que iria começar algumas semanas depois e a equipe aproveitou para também testar um novo modelo de roda. Streiff parou nos boxes, realizou um pit e partiu para mais voltas.
Logo em seguida, quando contornava a curva quatro, a AGS sofreu uma quebra de suspensão e ele seguiu reto em direção ao guardrail. Uma câmera conseguiu algumas imagens quase que imediatamente o pós-impacto, mas não do acidente em si.
“Lembro de deixar os pits e depois tudo ficou preto”, explicou o piloto, anos depois da batida. “Não existe imagem do acidente mesmo, apenas do logo após, eu capotei várias vezes, com o motor, caixa de câmbio e rodas descolando e voando do carro. O santo antônio também voou. O carro ficou completamente destruído e eu fiquei sobre o guardrail.”
Streiff fraturou duas vértebras e ficou paraplégico.
DIDIER PIRONI
Hockenheim (Alemanha), 1982
Treino de F1
Era o final de semana do GP da Alemanha e Pironi já tinha a pole position para a prova. Em uma última sessão de treino livre, a Ferrari e a Goodyear estavam testando uma nova versão de seu pneu de chuva, aproveitando um temporal que caía no circuito alemão.
O francês estava voando na pista. Mesmo com muito spray saindo dos carros e em uma mera sessão livre, ele seguiu com sua pilotagem agressiva. Na reta Sul, Derek Daly, mais lento, saiu com sua Williams do traçado para deixar a Ferrari passar, mas o que Pironi não esperava é que no meio daquela água toda, alguns metros à frente, estava a Renault de Alain Prost. Ele bateu violentamente na traseira do carro do compatriota.
“O carro de Pironi voou a quase uns 30 metros de altura. Eu rezei para conseguir parar, pois fiquei sem freios”, relembrou Prost, em entrevista à revista Motorsport alguns anos depois. “Toda vez que piloto na pista molhada, olho no meu retrovisor e vejo a Ferrari de Didier voando”, completou.
Após a decolagem, a Ferrari continuou capotando por vários metros, deixando uma trilha de detritos pela pista. Pironi sobreviveu, mas sofreu múltiplas fraturas nas suas duas pernas e nunca mais conseguiu competir na F1 novamente.
MICHELE ALBORETO
Lausitzring (Alemanha), 2001
Teste para Le Mans
Alboreto estava realizando testes com a nova versão do Audi R8 para as 24 Horas de Le Mans. A sessão era concentrada principalmente em velocidade nas retas do circuito oval alemão para experimentar o pacote de baixa pressão aerodinâmica, normalmente utilizado na prova de Sarthe.
Neste contexto, em que provavelmente o piloto italiano deveria estar andando em altíssimas velocidades, um pneu estourou jogando seu R8 para fora da pista direto no guardrail. Alboreto morreu imediatamente no impacto.
Sem imagens, em uma sessão de testes privados, com mais ninguém no circuito, poucos detalhes do acidente vieram a público. Uma investigação chegou a ser aberta comprovando que a causa do acidente foi mesmo um furo no pneu.
TONY RENNA
Indianápolis (EUA), 2003
Teste da Indy
Renna estava em Indianápolis em uma manhã de outubro para fazer um trabalho específico de teste de pneus para a equipe Ganassi.
Em sua quarta volta na sessão, ele contornava a curva três quando perdeu o controle de seu G-Force, a cerca de 350 km/h, e rodou. O veículo foi para a grama interna do circuito, descontrolado, e começou a pular um pouco. Antes de retornar à pista, o ar que passou por baixo fez o carro decolar como uma pena.
Ele acabou batendo na cerca de proteção, acima da mureta externa do traçado, com bastante violência. Renna morreu instantaneamente por conta de um grave trauma interno na cabeça.
Apesar das muitas investigações, justamente pela falta de imagens, nunca se chegou à uma conclusão precisa do motivo para que Renna perdesse o controle do carro.
TAKASHI YOKOYAMA
Fuji (Japão), 1997
Corrida da F3 Japonesa
Apesar de não existir um vídeo completo do acidente de Yokoyama, as imagens que mostram o final da batida somadas às impressionantes fotos dão dimensão do ocorrido.
Um forte acidente entre Tom Coronel e Shigekazu Wakisaka aconteceu na reta principal do circuito de Fuji. Os dois saíram ilesos, mas seus carros permaneceram na pista. O safety car entrou na corrida, mas Yokoyama não diminuiu como deveria a velocidade.
Ele bateu nos veículos que permaneceram no traçado e decolou, indo direto em uma placa publicitária que ficava em cima da pista. O carro de Yokoyama se desintegrou e ele morreu imediatamente.
PAUL WARWICK
Oulton Park (Inglaterra), 1991
Corrida da F3000 Inglesa
Irmão mais novo de Derek, Paul Warwick era considerado uma grande esperança britânica no automobilismo. Ele fazia uma temporada perfeita na F3000 inglesa quando sofreu seu acidente fatal em uma prova em Oulton Park.
Paul liderava a corrida a sete voltas do final quando um dos braços da suspensão de seu Reynard se rompeu. Ele perdeu o controle do carro e foi direto para o guardrail, a cerca de 250 km/h.
A força do impacto quebrou a frente do monocoque e ele foi arremessado metros do local da batida, deixando pouca esperança para o jovem inglês.
JIM CLARK
Hockenheim (Alemanha), 1968
Corrida de F2
Mesmo sendo um dos pilotos mais importantes da história da F1, detalhes sobre o acidente fatal de Clark são quase inexistentes. Não existem imagens do acidente e são poucas as testemunhas.
Sabe-se que a pista estava úmida em Hockenheim. Na quinta volta da primeira bateria da etapa da F2, o escocês perdeu o controle do carro em uma curva em que dificilmente alguém cometia erros e saiu da pista. Não existia nenhum tipo de guardrail ou proteção no ponto e ele bateu direto nas árvores no antigo trecho da floresta.
Quase nada do carro sobrou. Clark sofreu fraturas no pescoço e no crânio e morreu antes mesmo de chegar ao hospital. O real motivo para o acidente nunca foi solucionado, porém, acredita-se que um estouro de pneu teria feito o Lotus sair do traçado.
BRUCE McLAREN
Goodwood (Inglarerra), 1970
Teste com esporte-protótipo
McLaren estava desenvolvendo seu protótipo M8D para a Can-Am quando sofreu um forte acidente em Goodwood que custou sua vida, aos 32 anos.
O neozelandês rasgava a rega Lavant e na aproximação da curva Woodcote, a carenagem da parte traseira do carro se soltou e fez o carro perder estabilidade. Ao perder o controle do veículo, McLaren rodou e bateu violentamente em uma cabine, normalmente utilizada para fiscais de pista.
O piloto morreu na hora, abalando o mundo do automobilismo, que ainda esperava diversos feitos deste audacioso piloto, que também era chefe de sua própria equipe.
FRANÇOIS CEVERT
Watkins Glen (EUA), 1973
Treino de F1
O acidente de François Cevert é um exemplo de situação que nos dias de hoje, provavelmente, não só se teria imagens como teria sido transmitido ao vivo para o mundo. O francês estava em uma das principais equipes da F1 e estava brigando pela pole position quando sofreu o impacto que casou sua morte.
Cevert estava em um ponto de “esses” de alta velocidade no circuito americano quando saiu da pista e bateu violentamente no guardrail na sessão classificatória do sábado. Por depoimentos e reconstituição pelas marcas de pneus, chegou-se à conclusão que ao tocar a zebra interna da primeira curva da sequência, à esquerda, a Tyrrell começou a quicar e não conseguiu fazer a segunda perna da combinação de tomadas, à direta.
O impacto foi tão forte que ele atravessou o guardrail e ficou com seu carro de cabeça para baixo e destruído do outro lado da proteção. Cevert morreu instantaneamente.
HELMUTH KOINIGG
Watkins Glen, (EUA), 1974
Corrida de F1
Um ano depois do acidente de Cevert, Watkins Glen mais uma vez foi palco de uma morte na F1. A corrida decidiu um acirrado título da temporada de 74, porém, ficaria marcada por mais uma tragédia de tantas que aconteciam todos os anos na categoria naquela época.
Na décima volta da corrida, Helmuth Koinigg perdeu o controle de sua Surtees e bateu na barreira de pneus. O impacto não foi tão violento como o de Cevert, porém, o guardrail se dobrou. O carro passou pela parte debaixo da proteção de metal enquanto a faixa de cima ficou, por um segundo, intacta. Este ponto acabou decapitando o piloto.
Este novo acidente fatal fez a F1 reforçar ainda mais sua preocupação com a segurança. Ficou claro que o guardrail mal instalado foi o fator principal da morte de Koinigg, que pela velocidade em que bateu, muito provavelmente teria sobrevivido ao acidente.
MARTIN DONNELLY
Jerez (Espanha), 1990
Treino de F1
Apesar não ter sido fatal, o acidente de Donnelly, mesmo sem imagens da batida em si, marcou uma geração. Principalmente pela forte imagem de seu corpo, ainda preso ao banco, jogado no meio do asfalto da pista de Jerez.
Durante os treinos livres para o GP da Espanha, no trecho final do traçado de Jerez, Donnelly perdeu o carro e bateu no guardrail atrás dos boxes, na saída da curva 12, a 225 km/h. O Lotus se partiu ao meio e o corpo do inglês foi arremessado metros à frente.
A equipe médica conseguiu fazer um rápido atendimento. Donnelly fraturou as duas pernas e chegou a sofrer lesões no cérebro e nos pulmões, mas sobreviveu ao forte acidente e está vivo até hoje.
ALBERTO ASCARI
Monza (Itália), 1955
Teste de protótipo
Ascari foi a Monza para ver o amigo Eugenio Castellotti testar um novo esporte-protótipo da Ferrari, a 750 Monza. Não estava previsto que ele participasse da sessão, mas ele resolveu experimentar o carro. Para se ter ideia, ele foi para a pista vestido com uma jaqueta, gravata, calça comum e o capacete emprestado do compatriota.
Em sua terceira volta, na veloz Curva del Vialone, ele perdeu o controle da Ferrari e saiu da pista. O italiano foi arremessado do carro e morreu minutos depois. Ele sofreu esmagamento do crânio, fratura de mandíbula, do ombro esquerdo, entre outros ossos.
A curva em que o bicampeão mundial sofreu o acidente deixou de existir, passando a contar com uma chicane de média velocidade, e que passou a se chamar Variante Ascari.
CRISTIANO DA MATTA
Road America (EUA), 2006
Teste de Indy
Da Matta estava na pista de Road America em uma sessão de testes quando atropelou um veado na curva seis. Após bater na frente do carro, o animal ainda acertou a cabeça do piloto, que ficou inconsciente imediatamente. Segundo relatos, quando a equipe de segurança chegou ao local do acidente para tirá-lo do carro, ele ainda estava acelerando.
O mineiro foi levado de helicóptero para o hospital e sofreu um hematoma subdural. Ele ficou por alguns dias em coma induzido e recebeu alta quase dois meses depois.
O ex-F1 se recuperou bem, conseguindo, alguns anos depois, até mesmo realizar alguns testes em carros de corrida, e participou, ao lado de Jimmy Vasser, de uma prova de esporte-protótipos em Laguna Seca em 2008. Ele ainda competiu na F-Truck brasileira, em 2010, e na Le Mans Seris Americana em 2011.
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