Chico Rosa abriu caminhos para campeões da F1 e cuidou de Interlagos
Morreu no último sábado (07), morreu, aos 80 anos, Francisco Castejon do Couto Rosa, mais conhecido como Chico Rosa, um dos personagens mais importantes da história do automobilismo brasileiro.
Ele esteve ligado intimamente ao sucesso de vários pilotos brasileiros que partiram para a Europa nos anos 60 e 70, em uma era em que essa opção de carreira não era algo tão simples. Depois, se tornou administrador de Interlagos, garantindo a constante evolução do autódromo para a manutenção não só do GP de F1 como também das provas nacionais.
Nascido em Patrocínio Paulista, no interior de São Paulo, Chico Rosa era filho de fazendeiros. No final da década de 50, a família resolveu se mudar para capital do estado e através de um vizinho com que fez amizade, o piloto Ciro Cayres, que Chico Rosa começou a ter contato com o automobilismo.
Ele passou a frequentar as corridas de Interlagos e, aos poucos, crir um círculo de amizades entre pilotos e donos de equipes. O interesse só foi aumentando e ele acabou entrando para trabalhar na equipe Willys, comandada por Luiz Antonio Greco, junto com pilotos do nível de Christian Heins.
Usando seus conhecimentos de estudante de engenharia civil, ele se mostrou hábil também na aprendizagem sobre a organização de uma equipe de corridas. Chico Rosa assumiu funções na cronometragem (em uma era em que era tudo manual), planejamento e execução das estratégias de cada um dos vários pilotos do time.
Chico Rosa também sempre teve facilidade para aprender línguas, e muito de que aprendeu sobre corridas também veio através de revistas inglesas, italianas e francesas, das quais só ele conseguia absorver o conhecimento por aqui. Ele também passou a criar uma base de dados das provas internacionais a traçar comparações entre o que se fazia no Brasil e na Europa e desta forma percebeu que algumas das estrelas do país teriam sim condições de competir contra os melhores do mundo.
Foi assim, então, que se jogou na empreitada de ir com Emerson Fittipaldi para a Europa em 1969. Ele ficou responsável por tudo que cercava a carreira do jovem piloto para que Fittipaldi pudesse se concentrar apenas em pilotar. Eles dividiam um quarto em uma pensão em Wimbledon.
Os dois conseguiram adquirir um carro de F-Ford e o carregavam de caminhão pelas cidades inglesas para competirem no campeonato local. O sucesso foi imediato, com Fittipaldi galgando em pouco mais de um ano os degraus para a F2 e depois para a F1 para correr na Lotus. Chico Rosa estava ao lado do piloto na assinatura de contrato com o time e seu chefe, Colin Chapman.
Emerson então viria a ser o primeiro brasileiro a vencer uma corrida e um campeonato da F1, abrindo o caminho para muito do que aconteceria de bom para o país na categoria nas décadas a seguir. Mas Chico Rosa não parou por aí.
Ainda em 1970, aproveitando os caminhos que aprendeu ao lado de Fittipaldi na Europa, ele começou também a ajudar na chegada de outro talento brasileiro: José Carlos Pace. O Moco, como era conhecido por amigos e torcedores, não teve o mesmo sucesso de seu antecessor, mas se tornou o segundo piloto a vencer um GP de F1, justamente em Interlagos, em uma dobradinha brasileira na etapa de 1975 do Mundial. Morreu antes de ter a oportunidade de ter um carro de ponta em um acidente de avião, em 1977.
Chico Rosa e Interlagos
Em 1975, Chico Rosa voltou ao Brasil e unindo seus conhecimentos de engenharia civil e automobilismo, assumiu a administração do autódromo de Interlagos. Sua missão era de conservar e manter o equipamento paulistano atualizado para seguir no calendário da F1.
Foi neste meio tempo que ele viu Nelson Piquet ser campeão da Super Vê, campeonato nacional de fórmulas. Ele logo notou que o carioca radicado em Brasília tinha talento para se tornar mais um grande nome na Europa.
Em um primeiro momento, utilizou de seus contatos e amizades para abrir espaço para Piquet na F3 Britânica, onde o brasileiro foi campeão. Amigo de Bernie Ecclestone, Chico Rosa também foi o responsável pelos contatos para que Piquet fosse correr na F1 pela Brabham, equipe que o dirigente era proprietário na época.
Depois de um primeiro momento de aprendizado, Piquet e a Brabham logo colheram frutos da parceria, com o brasileiro conquistando os títulos de 1981 e 83 no time inglês.
Na mesma época, Interlagos perdeu o GP do Brasil para o Rio de Janeiro, que construiu o novo autódromo de Jacarepaguá e contava com o apelo turístico para se tornar sede da prova. Só que no final dos anos 80, como já contamos aqui no Projeto Motor neste vídeo abaixo, a prova carioca sofreu sérios desgastes com a categoria por conta da organização do evento.
Chico Rosa, com aval da então prefeita de São Paulo, Luiza Erundina, procurou Ecclestone, agora chefe comercial da F1, para verificar a possibilidade de retomar a prova a partir de 1990. O inglês gostou da ideia, mas exigiu a mudança do traçado original de Interlagos, que tinha 7.960 metros e 15 curvas.
Várias opções diferentes foram estudadas, algumas descartadas pelo próprio Ecclestone, que pretendia, segundo o próprio Chico Rosa, matar o anel externo do autódromo para evitar a possibilidade da Indy correr no local.
Foi quando veio a sugestão de Ayrton Senna da construção de um “S” ao final da reta dos boxes. O piloto e Chico Rosa desenharam a ideia inicial que era um pouco diferente do que acabou sendo realizado, com uma sequência de alta velocidade que levaria a nova Curva do Sol, que passaria a ser contornada no sentido inverso da original.
Mas por conta do tipo de relevo no local, as duas primeiras curvas do novo traçado ficaram de baixa, ao contrário do gosto tanto de Chico Rosa quanto de Senna. Mesmo assim, foi o bastante para Interlagos voltar a receber a F1 e o traçado é até hoje sempre considerado um dos mais interessantes do calendário do Mundial.
Chico Rosa seguiu, com alguns poucos hiatos, como administrador de Interlagos até 2015, supervisionando atualizações e buscando novidades que via em outros lugares do mundo para manter a pista em alto nível. Neste período ele lutou para proteger o autódromo da especulação imobiliária e comprou brigas para manuntenção do espaço.
Ele também nunca deixou de seguir ajudando jovens pilotos do país que ele achava que tinham talento a conseguirem espaço no automobilismo europeu, utilizando de seus vários contatos estabelecidos durante as décadas de trabalho no esporte a motor. Sempre mantendo sua característica discrição e sem querer chamar a atenção.
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