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Alertas do perigo de trator na pista vieram para a F1 antes de Bianchi

De tempos em tempos, a F1 tenta aperfeiçoar os seus procedimentos de prova a fim de aumentar a eficiência e agilidade de suas decisões, e garantir a segurança de todos os envolvidos. E isso inclui não apenas os pilotos, mas também os fiscais de pista.

Na última década, houve incidentes que vitimaram responsáveis pelo resgate, como o ocorrido no Canadá, em 2013, além do acidente fatal de Jules Bianchi no GP do Japão de 2014, quando o francês colidiu com um trator que removia um carro na área de escape sob forte chuva em Suzuka.

Porém, mesmo com essa passado recente, novamente a F1 se viu em situação de potencial risco no circuito japonês durante o GP do Japão do último domingo (09), já que tanto os pilotos quanto chefes e equipe criticaram a entrada de um trator na pista quando os carros ainda passavam ali perto.

A corrida começou com pista molhada e chuva. Mesmo assim, todos os 22 pilotos partiram com pneus intermediários, composto que, em tese, é indicado para condições em que o asfalto já está com pontos mais secos.

Logo na primeira volta, Carlos Sainz escapou na aproximação da Curva 12 e bateu forte na barreira de pneus. A primeira medida da direção de prova foi aplicar bandeiras amarelas duplas – ou seja, os pilotos que passassem pelo local precisariam reduzir de forma significativa a velocidade e estarem prontos para parar o carro imediatamente se for necessário. Mas, instantes depois, o safety car foi acionado.

Pouco atrás, quando passou pelo local do acidente, Pierre Gasly atingiu uma placa de publicidade, que ficou presa na parte da frente de seu carro. Com isso, ele precisou ir ao box ao fim da volta para trocar seu bico, mas o próprio piloto quis aproveitar a ocasião e pediu para trocar os intermediários por pneus de chuva forte, já que a pista estava de fato bastante molhada.

Com a parada prematura, Gasly retornou à corrida na última posição, longe de todos os outros pilotos. E, como o safety car iria agrupar o pelotão, ele ainda precisaria de um tempo para se juntar ao grupo com os outros.

Quando todos os pilotos passaram pelo local na volta seguinte, eles se depararam com um trator de resgate que estava removendo o carro de Sainz, o que deixou muita gente surpresa e furiosa. Por exemplo, Charles Leclerc, que vinha em segundo lugar e tinha quantidade de spray de apenas um carro à sua frente, relatou que “não tinha conseguido ver direito a presença do trator”, porque ainda assim a visibilidade era ruim. Sergio Pérez reforçou que um trator na pista naquelas condições era algo que ele “nunca queria ver”.

Gasly, que ainda estava longe do pelotão, passou sozinho pelo local e se assustou ao ver o trator, classificando o episódio como “inaceitável”. Segundos depois, a direção de prova aplicou a bandeira vermelha, o que interrompia a prova.

Fora do carro, os pilotos detalharam mais sobre o quão chocante foi terem visto o trator naquele local e naquelas condições. Gasly foi enfático ao dizer que, se tivesse perdido o controle da mesma forma que aconteceu com Sainz, ele bateria no trator e teria morrido”, e que o episódio todo foi um “desrespeito à história de Jules Bianchi”. Pérez foi por um caminho parecido, classificando o episódio como inaceitável, e relembrando do caso de Bianchi.

A FIA chegou a argumentar que “uso de veículos de resgate é procedimento padrão em condições de Safety Car”, e aplicou 20s de punição contra Gasly, mais dois pontos em sua carteira, afirmando que o francês passou rápido demais pelo local – por vários momentos acima de 200 km/h, e até em um momento acima dos 250.

FIA de fato usou trator em outras corridas recentes e isso não gerou tanta revolta – como, por exemplo, Monza 2022. Mas havia uma diferença importante: aquelas corridas foram no seco. No molhado, há o problema de falta de visibilidade, além de que a água deixa o nível de aderência da pista inconstante.

Ou seja, um piloto pode perder o controle do carro com uma aquaplanagem mesmo estando em um ritmo mais lento. E é aí que existem os paralelos com a situação de Bianchi. O francês quando escapou pegou uma pista em trecho de bandeira amarela dupla em 2014. Isso se agrava com o fato de que Bianchi também estava com pneus intermediários em uma pista muito molhada.

Este é um cenário que também se repetiu em 2022, já que Verstappen reportou um aumento da precipitação, e Gasly colocou pneus de chuva intensa depois de sua parada forçada. Tem sido uma prática comum de ver os pilotos forçando com pneus intermediários mesmo quando há muita chuva.

Depois de receber muitas reclamações de pilotos, de forma pública nas entrevistas e também através de cobrança oficial atrás da GPDA (Associação de Pilotos de GPs), a FIA admitiu rever seus procedimentos e investigar o caso a fundo.  

Outras ocasiões com tratores na pista da F1

É possível encontrar vários casos de problemas com veículos de resgaste durante corridas da F1. Mas, além do de Bianchi em 2014, outros dois já na década de 2000 remontam ao perigo de tratores e carros de serviço no geral entrarem na pista no momento errado, principalmente quando a pista está escorregadia e os pilotos não estão com total controle de seus carros.

O GP do Brasil de 2003 ficou marcado por ser uma confusão. Uma das questões mais lembradas é a bagunça da cronometragem, que deu a vitória no momento para Kimi Raikkonen, mas, depois de uma revisão das imagens durante a semana seguinte ao evento, a F1 teve que alterar o resultado, admitindo que Giancarlo Fisichella era na verdade o ganhador do GP.

O caos entorno dessa etapa, no entanto, começou bem antes da questão sobre o resultado. A corrida teve chuva durante boa parte de sua duração, o que resultou em uma sequência de batidas na Curva do Sol. Seis carros saíram no ponto durante a primeira metade de prova, incluindo nomes como Ralf Schumacher, Jenson Button, Juan Pablo Montoya e até mesmo Michael Schumacher.

Schumacher roda e vai na direção da barreira de pneus passando próximo de um trator durante o GP do Brasil de de F1 em 2003
Schumacher roda e vai na direção da barreira de pneus passando próximo de um trator durante o GP do Brasil de de F1 em 2003 (Reprodução)

E foi justamente a rodada do alemão da Ferrari que causou o maior pavor, pois um imenso trator estava na área de escape retirando a Jaguar de Antônio Pizzonia, mesmo com a corrida em prosseguimento normal e em um ponto de pouco espaço entre a pista e a barreira de pneus.

Schumacher passou perto de vários fiscais, que correram para se proteger atrás da barreira de pneus, e bateu a poucos metros do veículo de serviço. O safety car foi chamado em seguida, mas a F1 passou perto de ver uma tragédia na pista.

Apenas quatro anos depois, em 2007, uma forte chuva caiu em Nurburgring entre o final do giro de apresentação e a primeira volta. Apenas um piloto percebeu a situação e se antecipou, Markus Winkelhock, que trocou os pneus ao final da volta de aquecimento. Já contamos essa história sobre a atuação do alemão, que fazia sua estreia na F1 nesta etapa, no vídeo abaixo.

Ao final da primeira volta, todo mundo entrou no pit para fazer a parada e colocar pneus intermediários (sim, já na época os pilotos davam preferência para eles sobre os de chuva intensa). Só que a chuva continuou apertando, e na abertura da terceira volta, diversos carros, incluindo o então líder do campeonato, Lewis Hamilton, passaram reto na curva um e foram parar na barreira de pneus. E aí começou o problema.

Antes mesmo do safety car ser acionado, os fiscais de pista começaram a entrar na área de escape para ajudar os pilotos a deixarem seus carros. Só que outros competidores continuaram saindo ali, o que deixou a situação bastante perigosa. Seis carros bateram no local em um período de poucos segundos.

Liuzzi roda e bate de leve em trator que estava na área de escape em 2007. F1 passou perto de uma tragédia
Liuzzi roda e bate de leve em trator que estava na área de escape em 2007. F1 passou perto de uma tragédia (Reprodução)

E de repente, dois tratores que atuavam para começar a tirar os carros no ponto entraram na área de escape, enquanto outros pilotos ainda escorregavam perigosamente. Então, o safety car foi acionado, mas o piloto da Toro Rosso (atual AlphaTauri), Vitantonio Liuzzi, perdeu o controle de seu monoposto, e não só quase acertou o próprio safety car como esbarrou no trator.

A situação acabou não sendo mais grave pelo toque leve, mas poderia certamente ter acabado em tragédia. E mesmo com o passar dos anos, a F1 e a FIA ainda parecem não terem absorvido totalmente as lições de casos como esses.

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