Como Zanardi foi de dispensado pela F1 a estrela da Indy
A carreira de Alessandro Zanardi no automobilismo é uma montanha russa, marcada por dificuldades, vitórias, fracassos e um acidente que o obrigou a transformar sua vida. O italiano se tornou uma espécie de símbolo de superação ao se recuperar da perda das pernas para se transformar em um campeão paralímpico, mas essa não foi a primeira vez que ele teve que dar a volta por cima.
Zanardi nasceu em de 23 de outubro de 1966 na cidade de Bolonha, em uma região da Itália em que carros e esporte a motor são algo muito importante na cultura local. Empresas como Ferrari, Maserati, Lamborghini e Ducati ficam todas nas redondezas. Ele começou a competir aos 13 anos e construiu primeiro kart com rodas e materiais do trabalho do pai, que o ajudou na missão.
Sua carreira no kart foi de muito sucesso, com o bicampeonato italiano em 1985 e 86, vice europeu da 100cc em 87, títulos europeus no mesmo ano nas classes Formula K e Super A. Quando pulou para os fórmulas, ele foi vice da F3 Italiana de 89 e conquistou a Copa Europeia de F3 de 90, em prova realizada no circuito de Le Mans, na França, e em que também participaram nomes como Yvan Muller e um tal de Michael Schumacher.
Zanardi subiu para a F3000 em 1991 e ficou com vice-campeonato, perdendo a disputa pelo título por cinco pontos para o brasileiro Christian Fittipaldi. Naquela temporada, o campeonato também teve futuros vencedores de GPs como Damon Hill e Heinz-Harald Frentzen. Sua ascensão nas categorias de base chamou a atenção e ainda naquele ano e ele teve a chance de correr nas três últimas etapas da F1 pela Jordan, na Espanha, Japão e Austrália, terminando em nono em duas e abandonando em Suzuka por problemas no câmbio.
Para 1992, no entanto, ele não conseguiu uma vaga na categoria, participando de apenas três provas, sendo que em apenas uma conseguiu se classificar para o grid, na Alemanha, pela Minardi, substituindo o lesionado Christian Fittipaldi. Paralelamente, no entanto, ele teve a chance de fazer testes pela equipe Benetton, o que o manteve em atividade e com seu nome falado no paddock.
Assim, Zanardi finalmente conseguiu um contrato para uma temporada completa na F1, pela Lotus, a partir de 1993. O ano, no entanto, foi complicado para o italiano. Antes do GP da Alemanha, ele foi atropelado quando andava de bicicleta e sofreu várias fraturas no pé esquerdo. Depois, sofreu um forte acidente nos treinos do GP da Bélgica, em que teve uma concussão e foi obrigado e ficar de fora do resto do campeonato. O único bom momento foi mesmo na segunda etapa, logo no começo da época, em que ele marcou seu primeiro ponto no Mundial, com um sexto lugar em Interlagos.
Ainda se recuperando de seu acidente em Spa, Zanardi perdeu a vaga na Lotus para 94 e ficou como piloto de teste da equipe nas primeiras etapas. Ele voltou a ser titular a partir do GP da Espanha, substituindo Pedro Lamy, que bateu forte durante os treinos em Barcelona. O italiano correria pela Lotus até o final da temporada, porém, o time passava por sérias dificuldades. Com diversas trocas de pilotos e problemas financeiros, os carros da tradicional equipe inglesa se arrastaram até a Austrália, onde ela faria a última corrida de sua história.
Zanardi ficou sem vaga para correr em 95, e ficou quase inativo, participando de algumas provas de uma competição de esportivos da Lotus. Motivado pelo ex-piloto e empresário Rick Gorne, ele então resolveu buscar um lugar na Indy, apostando que seu bom retrospecto nas categorias de base europeias e experiência na F1 poderiam lhe abrir portas.
Negociações de Zanardi com a Ganassi
O italiano foi a New Hampshire em setembro de 1995 naa penúltima etapa da Indy para tentar abrir portas. Lá ele descobriu que ninguém fazia ideia de quem ele era e que a não ser que tivesse um patrocinador com muita grana para comprar um carro, ele não teria chances.
Ele voltou para a Itália sem muitas esperanças, e quando Gorne o chamou para ir de novo aos Estados Unidos para acompanhar a etapa final da Indy, em Laguna Seca, sua primeira resposta foi não. “Eu não tinha dinheiro para comprar a passagem de avião, alugar um carro, hotel e tudo mais. Eu duvidei da utilidade daquela viagem”, explicou Zanardi, em uma entrevista à revista Sports Illustrated, em janeiro de 2019.
Quem fez a cabeça do piloto para mudar de ideia foi sua então namorada, hoje esposa, Danielle, que comprou duas passagens para eles irem à Califórnia e disse a Zanardi que ele deveria estar aberto às oportunidades da vida. Ela não poderia estar mais certa. Em Laguna Seca, Chip Ganassi resolveu demitir Bryan Herta para a temporada seguinte e quando encontrou Gorne no autódromo, perguntou se o empresário, que também cuidava da carreira de Gil de Ferran, não tinha algum bom piloto para seu time. Ele ouviu a resposta: “sim, e ele está aqui”.
Ganassi e Zanardi conversaram no motorhome da equipe ainda em Laguna Seca. O americano não quis bater o martelo na hora e deu a chance ao piloto de realizar um teste. A princípio, o italiano tinha um forte opositor dentro da Ganassi, o famoso engenheiro Morris Nunn, que tinha um preconceito com pilotos italianos por achar que eles eram agressivos demais e sofriam muitos acidentes.
Mesmo assim, Zanardi foi bem no teste com a Ganassi e conseguiu a vaga para 1996 em uma das melhores equipes da Indy, que agora passaria a se chamar ChampCar, por conta do racha entre CART e IRL. De qualquer maneira, na época, o campeonato mantinha os principais pilotos e equipes e era considerado o maior dos Estados Unidos.
De desconfiança a estrela
Mesmo em uma das melhores equipes da CART, o contrato de Zanardi não era dos melhores em termos financeiros, principalmente em comparação com outros pilotos importantes da categoria. Zanardi era visto como uma louca aposta de Ganassi. Do outro lado, o italiano não podia negar uma oportunidade daquele tamanho, sabendo ainda que precisaria se provar em um tipo de competição bem diferente do que ele estava acostumado na Europa.
E tudo se encaixou muito rápido. A temporada de estreia do italiano foi muito boa. Ele não só foi o melhor novato, como terminou o campeonato empatado na segunda posição, com Michael Andretti, atrás do campeão e companheiro de equipe Jimmy Vasser. Para melhorar a situação, ele ainda conquistou três vitórias, sendo que a última, no encerramento do ano em Laguna Seca, entrou para história com uma ultrapassagem extremamente agressiva sobre Bryan Herta, na última volta, na lendária curva do Saca-Rolhas.
A manobra, apesar de linda, causou muita controvérsia por ele ter saído completamente do traçado para conseguir completá-la. Apesar da discussão, os fãs adoraram e apelidaram o lance de “The Pass”, ou “A Ultrapassagem”, em tradução livre.
“Dos melhores momentos da minha carreira, aquele foi provavelmente o mais emocionante”, contou Zanardi em uma entrevista ao jornal US Today, em 2013. “Foi o que realmente mudou minha vida de alguma forma. Eu tive muita sorte naquele dia, mas se eu não tivesse tentado a manobra, quem sabe o que teria sido da minha carreira? Com certeza, mudou muitas coisas. A percepção de todas as pessoas que estavam assistindo foi que depois daquele dia eu definitivamente era outra pessoa. Tenho certeza que ganhei muitos fãs naquele dia e muita polêmica. Isso é o que nos mantém vivos, e eu certamente estava vivo naquele dia”, continuou.
Aquele momento era apenas o começo de uma grande jornada. Zanardi conquistou os títulos de 1997 e 98 da ChampCar pela Ganassi, com campanhas em que ele somou cinco e sete vitórias, respectivamente. É verdade que ele não se dava muito bem nos ovais, e sofreu sua parcela de acidentes nestes, mas ele encontrou uma ótima linha de acerto para seu modelo Reynard-Honda nos mistos e circuitos de rua, que o deixava sempre entre os grandes favoritos nestas provas.
Com tanto destaque, Zanardi acabou chamando a atenção novamente da F1, em especial de Frank Williams. O dirigente da equipe que tinha vencido quatro dos últimos seis campeonatos visitou o piloto e ainda em julho de 1998 e eles chegaram a um acordo de contrato de três anos. Chegava ao fim a primeira passagem de Zanardi na Indy/Champ Car, e o italiano acreditava na chance de um retorno triunfantes à F1. Esse novo capítulo, fica para contarmos outro dia.
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