A tecnologia por trás da homenagem de Vettel a Senna
Aposentado da F1 desde 2022, Sebastian Vettel voltou a ganhar destaque no final de semana do GP da Emília-Romanha de 2024 ao liderar as homenagens pelos 30 das mortes de Ayrton Senna e Roland Ratzenberger.
Além de uma corrida a pé na quinta-feira com os pilotos do atual grid até o memorial do brasileiro na curva Tamburello, local do acidente fatal de Senna, no domingo, ele deu algumas voltas com o modelo McLaren MP4-8, com que o tricampeão conquistou suas últimas vitórias em 1993.
Vettel é proprietário do carro. Ele comprou para a sua coleção, assim como também é dono de uma Williams FW14B, com a qual Nigel Mansell conquistou seu único título mundial na F1, em 1992. Em 2022, inclusive, o alemão chegou a fazer uma demonstração de sua Williams em Silverstone antes do GP da Grã-Bretanha.
Nas imagens das voltas completadas por Vettel, que incluíram um momento especial em que ele carrega as bandeiras do Brasil e Áustria, em alusão a Senna e Ratzenberger, é possível ver a reação emotiva do público nas arquibancadas de Imola.
O próprio Vettel também não conseguiu esconder que estava bastante emocionado quando desceu da McLaren e falou ao microfone para todo o autódromo.
Mas é importante destacar que, em um segundo plano, tetracampeão alemão também vem aproveitando essas exibições de seus modelos históricos para a promoção ao mundo de uma tecnologia da qual ele vem defendendo nos últimos tempos para os próximos anos do automobilismo: combustíveis sintéticos.
A tecnologia do passado para apontar o futuro
Tanto a Williams FW14B de 1992 quanto a McLaren MP4-8 de 1993 que são de propriedade de Vettel, além de terem sido guiados por grandes ícones da F1, têm em comum o fato de representarem uma era específica da F1.
Ambos são de uma geração de carros com muita eletrônica embarcada. Alguns dos dispositivos foram proibidos a partir de 1994 e nunca mais foram utilizados na categoria, o que significa que, em algumas áreas, são modelos com mais assistências até que os de hoje.
Além de suspensão ativa e controle de tração, a McLaren de Senna, por exemplo, chegou a usar um sistema eletrônico de transmissão durante 1993 que trocava de marchas sozinho. Já contamos os detalhes deste ponto aqui no Projeto Motor.
Mas esse é um gancho para Vettel mostrar algo que agora pode ser o caminho para a F1 manter os motores a combustão em seus carros por um tempo maior do que muita gente imagina. E assim, abrir um tempo maior de transição de tecnologia e conscientização do público.
Como você pode ver nas imagens, na lateral do cockpit da McLaren pilotada por Vettel está escrito “race without trace”, que em uma tradução livre poderia ser “correr sem deixar vestígios”. Ou melhor ainda, sem deixar uma pegada.
Por conta das homenagens a Senna, a questão ficou em segundo (ou terceiro?) plano, mas ele já tinha dado mais destaque à questão quando andou com a FW14B em 2022 em Silverstone e depois com os ambos os modelos no Festival de Goodwood, em 23. Os dois carros passaram por pequenas adaptações em seus motores e hoje andam com combustíveis sintéticos.
O Projeto Motor já explicou em detalhes o funcionamento deste tipo de combustível, que está nos planos da F1 já para o novo regulamento de 2026 e que pode estender a vida dos motores a combustão não só na categoria como no próprio mercado automotivo pela década de 30.
Os combustíveis sintéticos e biocombustíveis (como etanol) utilizam em algum momento de seu processo de fabricação a captação de dióxido de carbono da atmosfera, lixo e resíduos de biomassa que não podem ser utilizados para alimentação.
O resultado da queima de todas essas substâncias no escapamento ainda será dióxido de carbono, porém, a ideia é que apenas se devolve para a atmosfera o CO2 que já existia nela antes, e não produzindo mais.
O problema é que, atualmente, a diminuição neste tipo de produto de emissão de gases poluentes em relação à queima de combustíveis fósseis chega a 65%, o que ainda é considerado pouco.
Porém, acredita-se que com maior desenvolvimento nos próximos anos, esta equação pode chegar bem perto de ser totalmente equilibrada. Alemãs Siemens e Bosch e a francesa Total são algumas que estão puxando boa parte do desenvolvimento, em parceria com montadoras como Porsche e Audi, ambas do grupo Volkswagen.
A transição defendida por Vettel
O que Vettel tem tentado provar é que mesmo carros construídos há mais de 30 anos, com alguns ajustes em sua configuração, podem utilizar esses novos combustíveis poluindo consideravelmente menos.
Assim, alemão apresenta a ideia de que até que a tecnologia dos elétricos esteja mais refinada, eficiente e, principalmente, acessível tanto em termos financeiros quanto técnicos (por conta dos pontos de recarga), é possível fazer uma transição mais limpa, sem precisar continuar queimando combustíveis fósseis.
Vettel aponta que esta transição é uma questão principalmente para o esporte a motor, já que os elétricos, como os da Fórmula E, ainda não se encaixam ainda em todos os tipos de competição. Além disso, seria uma forma de criar uma mudança cultural no público menos traumática para quando os motores barulhentos realmente não fazerem mais sentido nem nas pistas de corrida.
“Uma coisa é o que acontece nas ruas e outra é o que acontece nas pistas”, afirmou o alemão em entrevista em 2023, quando andou com sua Williams e McLaren adaptadas para combustíveis sintéticos no Festival de Velocidade de Goodwood.
“Na pista, alguns formatos de corrida provaram que existe espaço para os carros elétricos. Se olhar para a F1, as corridas são muito longas no momento, com 300 Km, enquanto outras corridas como as 24 Horas de Le Mans são ainda mais longas. Então, para essas, os carros elétricos não são uma alternativa.”
“Mas, de novo, são coisas separadas. A eficiência dos carros elétricos de rua hoje é imbatível. Ainda assim, temos que nos mantermos abertos para carros a hidrogênio no futuro, ou outra coisa que ainda não foi desenvolvida. Temos que continuar cavando, e por isso é que vejo combustíveis sintéticos mais como uma tecnologia que funciona como uma ponte e não uma resposta para o futuro”, continuou o tetracampeão.
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