Com ícone da tecnologia do passado, Vettel aponta para o futuro da F1
No domingo do GP da Grã-Bretanha de 2022, em Silverstone, Sebastian Vettel fará uma apresentação muito especial tanto para ele quanto para o público local antes da corrida. Ele dará algumas voltas de demonstração com um modelo Williams FW14B, com o qual Nigel Mansell conquistou seu único título mundial na F1, em 1992.
O carro, inclusive, é de propriedade do próprio Vettel. Ele comprou essa unidade específica de 1992, o chassi 08, em um leilão durante o Festival de Goodwood de 2019 por £2,7 milhões (o que na cotação de hoje seria o equivalente a cerca de R$ 17 milhões).
O chassi foi pilotado por Mansell nas primeiras oito provas da temporada de 1992. Nestas, o inglês conquistou seis vitórias e sete pole positions. A partir do GP da Grã-Bretanha, o carro passou para o seu companheiro, Riccardo Patrese. Foi com ele que o italiano sofreu um marcante acidente no GP de Portugal em que decolou em plena reta do Estoril após bater na traseira da McLaren de Gerhard Berger.
Vettel nunca escondeu ser um cara que gosta de história da F1. Nos tempos do kart, já competia diversas vezes com o número #5, com o qual Mansell correu tantas vezes na carreira, incluindo naquele campeonato de 1992. A numeração fixa do alemão na F1 hoje é o #5, e ele gosta de usar em vermelho, como o “Leão” utilizava.
“Estou esperando me divertir muito e espero que as pessoas possam se divertir junto, pois acho que é um carro incrível, a história do carro, o barulho que ele faz. Então, estou ansioso”, declarou Vettel na última quinta-feira.
O poderoso simbolismo do FW14B para a F1
O FW14B também é um carro bastante icônico para a F1 por representar um dos momentos mais altos da tecnologia e uso da eletrônica na categoria. O modelo já tinha a ótima base do FW14, que deu a Mansell o vice-campeonato de 1991, mas que tinha muitos problemas de confiabilidade perante a maior consistência do rival McLaren MP4-6, de Ayrton Senna.
Para a atualização de 1992, o modelo seguiu com seu sistema de câmbio semiautomático, agora melhor desenvolvido e confiável, passou por uma evolução aerodinâmica realizada pelo projetista Adrian Newey, e a inclusão de novos dispositivos eletrônicos como controle de tração e suspensão ativa.
Desta forma, o carro da Williams se tornou amplamente dominante, conquistando 10 vitórias (nove só de Mansell) e 15 pole positions (14 de Mansell) em 16 provas. O time venceu o campeonato de construtores com 164 pontos contra 99 da McLaren, vice. Mansell sagrou-se campeão com cinco etapas de antecipação e terminou o ano com 108 pontos contra 56 de Patrese, vice.
A F1 como um todo evoluiu ainda mais na eletrônica e assistências de direção na temporada de 1993, talvez o ano auge deste tipo de dispositivo na categoria, antes das proibições de 1994, mas o FW14B acabou se tornando certamente o grande símbolo desse momento. E não deixa de ser curioso como, após 30 anos, ele pode voltar a apontar o futuro da F1.
Demonstração de Vettel vai além da nostalgia
Nos anos últimos anos, Vettel se tornou uma voz importante no paddock da F1 sobre o problema ambiental e vem focando principalmente na questão energética. Ele já fez críticas à própria categoria sobre a demora para a adoção de combustíveis sintéticos e menos poluentes.
Em maio, o alemão participou do programa de debates políticos “Question Time” da emissora inglesa BBC, e foi questionado se não seria hipócrita por fazer campanha por energias renováveis ao mesmo tempo em que ganha a vida em um esporte que queima combustíveis fósseis.
“Sim, sim e vocês estão certos quando riem porque é uma pergunta que eu me faço todo dia. Não sou um santo, mas estou muito preocupado com o futuro. É algo que meu pergunto quando estou viajando o mundo [com a F1]. Pilotar um carro é minha paixão e eu amo, e toda vez que eu sento no carro, eu amo. Mas quando eu saio do carro eu penso: ‘isso é algo que deveríamos fazer, viajar o mundo desperdiçando recursos?”, refletiu.
A F1 aumentou em 2022 a porcentagem de etanol em seu combustível, mas ainda de forma bastante tímida. Para o novo regulamento de motores de 2026 a categoria promete utilizar novos combustíveis neutros em emissão de carbono, como já explicamos aqui no Projeto Motor em outro artigo. E essa demonstração de Vettel com o FW14B pode ser um símbolo deste novo momento.
Isso por que ele irá utilizar no carro, sem alterações importantes no modelo de 1992, combustível neutro em emissão de carbono. A ideia é mostrar que é possível manter a F1 com motores a combustão por mais algum tempo, mas com índices de poluição muito menores. E nada melhor do que isso do que uma apresentação da nova tecnologia em um carro de 30 anos atrás.
“Eu pensei em fazer isso [a demonstração] de uma forma responsável. Então, estamos usando combustível neutro em carbono no domingo para mostrar que ainda podemos manter nossa história, herança e cultura no automobilismo, mas de uma forma responsável”, explicou Vettel. “Foi um esforço encontrarmos o combustível, mas quando o encontramos foi tudo muito fácil, na verdade. Precisamos apenas de um shakedown para entendermos tudo.”
Por isso tudo, apesar de um evento com um simbolismo aparentemente nostálgico, Vettel pode estar dando o primeiro sabor aos fãs de um futuro não muito distante da F1.
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